Por todo o mundo, e também em Portugal, as cidades estão a sobreaquecer no verão e os nossos edifícios necessitam de se preparar para enfrentar essa situação. As alterações climáticas estão aí; são percecionadas e sentidas por todos, principalmente no verão, que são mais quentes e mais secos.
O aumento da temperatura nas cidades no verão tem como consequência principal o desconforto térmico generalizado no nosso parque residencial e provoca, adicionalmente, um grande problema de saúde pública que afeta a população mais idosa, verificando-se, inclusive, uma correlação direta entre o aumento de óbitos e o aumento de temperatura no verão. Outra consequência deste fenómeno é o aumento dos consumos energéticos devido à utilização do ar condicionado nos edifícios e uma sobrecarga do sistema energético no período da tarde, quando a temperatura e a radiação solar se fazem sentir com mais intensidade.
Pode perguntar-se “o que fazer? Porque chegámos a esta situação?”. Há várias razões que explicam porque aqui chegámos, mas também há várias medidas que podem melhorar a situação e isso é o mais importante. Comecemos com o “como aqui chegámos”: falemos do caso concreto das cidades, onde a densidade urbana aumentou nas últimas décadas e, consequentemente, as zonas “abertas” das cidades, as zonas verdes, arejadas, que permitiam uma circulação de massas de ar, foram diminuindo, o que fez aumentar a concentração de calor. Essa “conquista” urbanista conduziu a mais “alcatrão”, ou seja, a volumetrias com elevada capacidade de armazenamento térmico e elevado coeficiente de absorção da radiação solar – isto é, absorve o calor durante o dia e mantém-se quente durante a noite.
Em muitas destas zonas urbanas já se verificava a chamada “ilha de calor urbano”, ou seja, zonas específicas da cidade cuja temperatura é superior à temperatura média verificada na cidade. Este fenómeno já é conhecido há dezenas de anos e estudado de forma continuada (Alcoforado et al.), e tem aumentado precisamente pela via da densificação urbana e dos fenómenos que lhe são associados.
Para agravar este filme de terror, composto por “ilhas de calor urbano” e “densificação urbanística” (maior densidade construtiva, menor área verde e, logo, menos ventilação e arrefecimento noturno, mais alcatrão), verifica-se um aumento das denominadas “ondas de calor”, que ocorrem quando, num período de seis dias consecutivos, a temperatura máxima é 5 ºC maior do que o valor da temperatura média, sendo, neste momento, de 11 dias por ano na Área Metropolitana de Lisboa, com projeções de subida para os 38 dias/ano em 2050 e temperaturas de 40 ºC (António Lopes e Eziquiel Correia et al.).
Perante este cenário, o que se verifica é que os edifícios não estão preparados para este verdadeiro “inferno” que se aproxima no período de verão, e, consequentemente, as famílias passam mal ou utilizam o “ar condicionado” (aqueles que o podem pagar). Em consequência, a temperatura do ar exterior ainda aumenta – um filme “Dantesco” que urge mitigar.

O que fazer, então? Os edifícios deverão ser construídos ou reabilitados de forma a evitar os “ganhos solares no verão”, as zonas envidraçadas devem ser sombreadas pelo exterior, especialmente as orientadas a poente (pois recebem a radiação solar da parte da tarde ao mesmo tempo que a temperatura exterior está a aumentar). As coberturas devem ser isoladas termicamente pelo exterior e/ou ter sombreamento ou uma cobertura verde, já que são as coberturas ou os telhados que, efetivamente, recebem grande parte da radiação solar, principalmente no verão, quando o sol se encontra mais na vertical. O isolamento térmico nas paredes exteriores deverá ser colocado pelo exterior – que não haja dúvidas disso –, onde tal for possível – essa é a melhor situação, pois, em termos de transferência de calor, “protege” a massa inercial do contacto direto à radiação solar. Outro fator muito importante é a cor das superfícies exteriores, que deve ser clara ou branca, ajudando, assim, a emitir a radiação solar.
Outro aspeto muito importante que os arquitetos devem ter em atenção ao projetar os novos edifícios corresponde às áreas dos vãos envidraçados: ter em atenção que, do ponto de vista de transferência de calor, grandes vãos correspondem a grandes ganhos solares e a grandes perdas térmicas, pelo que os profissionais deverão sempre ter em consideração a necessidade de proteção solar adequada e/ou de isolamento térmico. Pelos fatores mencionados, é importantíssimo que os edifícios sejam cada vez mais pensados em termos de verão no nosso país, de norte a sul, não importa a latitude, sendo que, obviamente, é no sul que as temperaturas do ar exterior têm maiores projeções de aumentar, mas é nas cidades e, em especial, nas grandes cidades que a confluência dos fatores descritos requer particular atenção.
Mas não basta pensar nos edifícios; as cidades, de uma forma geral, estão a “sobreaquecer”. Este é um fenómeno global e, neste momento, cerca de 400 cidades em todo o mundo têm problemas graves de sobreaquecimento, com aumentos de temperatura média no verão de 4 a 5 ºC e picos de 10 ºC superiores (Santamouris et al.), com gravíssimos problemas de saúde pública e de abastecimento de energia nos períodos de pico devido ao uso dos equipamentos de ar condicionado. No geral, o problema é sempre o mesmo: “densificação urbana”, associada ao aumento de temperatura, consequência das alterações climáticas e dos fenómenos associados de ilha de calor urbano e ondas de calor. É, pois, urgente, tornar a cidade mais verde, mais clara, mais baixa e menos densa e é urgente diminuir o chamado calor antropogénico, ou seja, retirar os “carros da cidade”. São estes os desafios do futuro presente; é necessário atuar rapidamente.
As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.