Incluir a eficiência hídrica em políticas públicas e legislação sobre edifícios e o nexus água-energia nas agendas políticas no âmbito da transição energética e da acção climática são os “dois desafios centrais” identificados pela ADENE, que, em nome da Rede Europeia de Energia (EnR), aderiu à Agenda de Acção para a Água, das Nações Unidas (ONU). A ADENE, que apresentou, na semana passada, o índice AQUA+ e assinou a declaração Women 4 OUR WATER na sede da ONU, vai formalizar, hoje, a criação de um grupo de trabalho dedicado ao nexus água-energia.

Water-Energy Nexus Working Group é o novo grupo de trabalho da rede EnR e marca a adesão à Agenda de Acção para a Água, promovida pela ONU. Marca também o fim da presidência portuguesa na EnR, que vai ceder a liderança à dena, agência alemã de energia, durante a Assembleia Geral da EnR, hoje, em Berlim, onde será formalizado o grupo de trabalho.

Segundo um comunicado da ADENE, este grupo de trabalho “tem especial importância por ser o único a reunir na Conferência Mundial da Água e na Década de Acção para a Água (…) a rede das 24 agências de energia europeias e por reforçar o papel da água no nexus água-energia nas práticas e políticas públicas europeias de transição energética e acção climática”.

Este reforço é, aliás, o objectivo deste novo grupo e representa também a procura de enfrentar um dos “dois desafios centrais” que ainda é preciso ultrapassar no âmbito do nexus água-energia, diz a ADENE, em entrevista à Edifícios e Energia. Apontando para a integração destes temas nas agendas políticas dos diversos Estados como um dos desafios, a ADENE sublinha que, em Portugal, “isto já começa a ser uma realidade”.

“Desde logo, temos a Estratégia de Longo prazo de Renovação dos Edifícios que integra a reabilitação hídrica de edifícios, a par da energética. Depois, o Plano de Poupança de Energia 2022-2023, elaborado pela ADENE, a pedido do Governo, também inclui a poupança da água nas suas medidas. Finalmente, o Fundo Ambiental e outros também já financiam medidas de eficiência hídrica e o nexus água-energia nos edifícios”, exemplifica. “O próximo passo é reforçar esta nova dimensão do tema água em Portugal e alargar esta lógica ao resto da Europa.”

O outro, e “primeiro”, desafio é “garantir que esta mudança de paradigma na eficiência hídrica chega às políticas públicas e à legislação sobre os edifícios”, afirma a ADENE em entrevista, que aponta para o AQUA+ como um exemplo dessa mudança. Este índice AQUA+, enquanto “primeiro sistema na Europa de diagnóstico, classificação e melhoria da eficiência hídrica”, é “inovador na busca de soluções para a eficiência hídrica e para o nexus água-energia”, descreve a entidade, já em comunicado.

Potencial de poupança hídrica nos edifícios “pode estar subestimado”

Além do grupo de trabalho, a ADENE  apresentou na semana passada, durante a Conferência da Água da ONU, o sistema AQUA+, um índice de classificação da eficiência hídrica nos edifícios lançado no final de 2019. Segundo a entidade, este instrumento foi desenvolvido pela ADENE e por diversos parceiros científicos e tecnológicos por haver a “noção de que existia um potencial elevado de redução do consumo de água por via da eficiência hídrica”.

Se, na altura, se acreditava que seria possível atingir uma poupança de 30 % nos edifícios mais recentes e de 50 % nos edifícios mais antigos, agora, depois de mais de 370 auditorias realizadas no sector residencial e com “600 auditorias em pipeline ou em curso”, a ADENE realça que “o potencial existe e pode até estar subestimado”.

A partir de 100 certificações realizadas entre 2019 e 2022, confirmou-se “33 % de potencial de poupança de água por imóvel (cerca de 55 mil litros de água por ano por imóvel)”, um valor médio que inclui aqui apenas a poupança por via da eficiência e não conta com o potencial de reutilização. Ademais, a ADENE nota que muitas destas certificações foram realizadas “em novos edifícios, alguns deles em projecto, o que mostra que existe ainda uma grande necessidade de melhoria na configuração dos edifícios”.

Esta “mais valia” da aplicação do AQUA+ nos edifícios não se limita aos residenciais. “No AQUA+ Hotéis, o potencial de poupança por empreendimento turístico é em média 20 vezes maior. Nas primeiras classificações já emitidas, chegamos a assistir a capitações de água superior a 3 000 litros de água consumida por hóspede e noite (normalmente associada a perdas de água nas redes internas dos hotéis) e a potenciais de poupança que podem ultrapassar os 50 mil euros por ano na redução da factura da água destes empreendimentos”, acrescenta a ADENE, em entrevista.

Além da poupança do recurso água, o AQUA+ tem ainda outros contributos positivos: há uma “poupança muito importante de energia, directa e indirecta, e de redução de emissões de dióxido de carbono”, bem como a “criação de novas competências e de novos empregos verdes”. Quanto a este último aspecto, a ADENE diz que já foram formados perto de 300 profissionais que “estão capacitados para identificar e introduzir medidas de eficiência hídrica em projectos, reabilitações e melhorias em imóveis residenciais e hoteleiros” e que já há “50 Auditores qualificados que podem emitir certificações pelo AQUA+”.

A ADENE está também a desenvolver um estudo sobre o impacto da eficiência hídrica apresentada pelo AQUA+ e as poupanças de energia e de dióxido de carbono. “Deverá ser conhecido em junho”, avança.

Papel das mulheres no nexus água-energia reforçado

Outro dos últimos trabalhos da ADENE na EnR foi também a assinatura, pelas duas entidades, da Declaração Women 4 OUR WATER, promovida pela ONG Business as Nature, que pretende trazer para a ordem do dia o nexus água-energia e relevar o contributo das mulheres, “em especial de língua portuguesa, cientistas, empresárias, dirigentes, profissionais e educadoras no sector da Água e Saneamento” como agentes de mudança neste âmbito, sublinha Susana Viseu, da Business as Nature. A declaração foi assinada, na semana passada, na sede das ONU, em Nova Iorque.