Terminou ontem a consulta pública da Central Solar Fotovoltaica (CSF) de Sophia, um megaprojecto com uma capacidade prevista de 869 MWpico que prevê ocupar uma área de cerca de 400 hectares com módulos fotovoltaicos nos concelhos do Fundão, Penamacor e Idanha-a-Nova. A ZERO entende que a iniciativa é um “sintoma de uma estratégia de descarbonização desequilibrada”. 

Para a Associação ZERO, a forte contestação de que este projecto está a ser alvo “pode ser apenas o início de uma ‘bola de neve’ de contestação social e de litigância judicial contra os necessários investimentos em energias renováveis”. A CSF de Sophia é vista como um “sintoma de uma estratégia de descarbonização desequilibrada”. Considera a ZERO que, em vez de apostar prioritariamente na eficiência energética, em soluções de energia solar descentralizada, autoconsumo e comunidades de energia, o país continua a avançar com mega-centrais planeadas caso a caso, frequentemente instaladas em áreas sensíveis e sem envolvimento adequado das comunidades locais. 

“A meta do Plano Nacional de Energia e Clima, relativamente à potência a instalar através do solar descentralizado é de apenas 5,7%, quando esta deveria ser, pelo menos, de 10% do total da potência instalada em 2030, faltando incentivos que viabilizem um forte crescimento da produção descentralizada”, salienta a entidade em comunicado.  

Além disso, a associação denuncia que os cidadãos e empresas continuam bloqueados por processos burocráticos lentos, que dificultam a criação de comunidades de energia e atrasam o autoconsumo colectivo. Para a ZERO, esta falta de prioridade política perpetua um modelo ainda muito dependente de centrais gigantescas e com elevado impacto no território.  

Os principais motivos da polémica do projecto 

A ZERO critica o Estudo de Impacte Ambiental (EIA)do projecto, apontando “deficiências e omissões graves e conclusões enviesadas”. No documento está prevista a desmatação e decapagem de solo em 1060 hectares, incluindo cerca de 34 hectares de Reserva Ecológica Nacional e áreas com elevado risco de erosão. Além disso, situa-se parcialmente dentro do Geoparque Naturtejo, estando previsto “o abate de 21 hectares de carvalho-negral (habitat com valor global de conservação ‘muito alto’)”. Segundo dados da Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade, o projecto implicará o abate de mais de 1500 árvores protegidas. 

De acordo com a ZERO, “o impacte significativo na paisagem, identificado no estudo, é alegadamente mitigado com cortinas arbóreas”, que defende que são medidas de mitigação cuja eficácia é sobrevalorizada, como a conversão de 135 hectares de eucalipto em azinheiras e sobreiros.  

A pressão sobre a fauna da região é outro dos pontos críticos. O Estudo de Impacte Ambiental identificou 231 espécies de vertebrados na área afectada, incluindo a cegonha-preta e a águia-imperial.  

Para as populações e autarquias da Beira Interior, o projecto ameaça a paisagem e as actividades económicas da região, como o turismo ambiental. Na Aldeia de Santa Margarida, situada a escassas dezenas de metros da área prevista, teme-se a crescente industrialização do território. Só entre 2011 e 2021, a freguesia perdeu 31,2% da população e receia-se que a instalação da mega-central agrave a tendência. 

A ZERO considera que o caso Sophia revela um problema mais profundo: a insistência em projectos concebidos “caso a caso”, sem alinhamento com um plano de ordenamento do território e sem uma estratégia coerente para as renováveis. 

Actualmente em curso, a Avaliação Ambiental Estratégica para definir Áreas de Aceleração para Renováveis é vista pela ZERO como um passo importante para “compatibilizar os valores naturais e sociais com a produção de energia renovável”, mas ainda insuficiente: “é fundamental irmos mais além nestes esforços, para que este plano sectorial se transforme num instrumento de ordenamento de território que defina áreas com aptidão para a produção de energia renovável suficientes e necessárias para atingirmos a neutralidade climática em 2040 e, desta forma, impossibilitar o desenvolvimento de projectos em áreas com elevada susceptibilidade à existência de conflitualidade social e impactes ambientais muito significativos”. 

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