Sem dúvida de que estamos na era da reabilitação do património construído, pelas boas e, ao mesmo tempo, más razões. A pressão da procura e a necessidade de criar novos espaços edificados também está novamente a alavancar a construção de novos edifícios, em especial, na área dos serviços e nas suas mais diversas tipologias.

Quanto à reabilitação, foram décadas de abandono do parque construído, mas o país percebeu finalmente que não pode deixar de pensar na reabilitação dos seus edifícios e as entidades responsáveis e os especialistas já consensualizaram ser este um desígnio nacional.

Os edifícios são o legado vivo de séculos de evolução e inovação. O património possui a capacidade de estimular a memória das pessoas historicamente vinculadas a ele e, por isso, deverá ser alvo de estratégias que visem a sua promoção e preservação. O património não é constituído apenas por edifícios históricos, que deverão inevitavelmente merecer especial atenção, mas deverá englobar todos os edifícios existentes, selecionados e avaliados de forma criteriosa, que moldaram a forma de vida e hábitos dos habitantes, comunidades e populações ao longo dos séculos.

“Um povo sem memória é um povo sem história. E um povo sem história está fadado a cometer, no presente e no futuro, os mesmos erros do passado” (citando Emília Viotti da Costa, historiadora e professora brasileira)  A preocupação em proteger o património começou no início do século XX e tem levado a que haja hoje uma plêiade importante de casos bem-sucedidos.

Reabilitação energética

O sector dos edifícios é um dos principais consumidores de energia na Europa, onde, tipicamente, a utilização de energia em edifícios tem mostrado uma tendência de crescimento, ao longo dos últimos 20 anos.

A Comissão Europeia tem levado a cabo diversas ações no sentido de reduzir este consumo energético, através da publicação da Diretiva para o Desempenho Energético dos Edifícios (em inglês, Energy Performance Building Directive – EPBD) 2002/91/CE (Parlamento Europeu, 2002) e da sua reformulação 2010/31/UE (Parlamento Europeu, 2010) e, mais recentemente, a Diretiva (2018/844/UE) (Parlamento Europeu e Conselho, 2018), que altera a Diretiva 2010/31/UE relativa ao desempenho energético dos edifícios e a Diretiva 2012/27/UE sobre a eficiência energética (Texto relevante para efeitos do EEE). Enquanto a primeira diretiva se focava principalmente em metodologias e edifícios novos (isto é, novas construções), as reformulações seguintes dedicam maior atenção aos edifícios existentes, não só quando estes são objeto de grandes intervenções de reabilitação, mas também quando elementos do edifício e/ou dos seus sistemas técnicos são modernizados ou substituídos.

É evidente que, para reduzir o consumo de combustíveis fósseis e a produção de CO2 no sector imobiliário, o desafio é reduzir as necessidades energéticas dos edifícios existentes. Uma parcela substancial do parque imobiliário na Europa tem mais de 50 anos, e com muitos edifícios centenários em funcionamento. Mais do que 40 % dos nossos edifícios residenciais foram construídos antes da década de 1960, quando os regulamentos de edifícios referentes à energia eram muito incipientes ou inexistentes, como é o caso de muitos edifícios históricos.

Dados sobre os consumos típicos em aquecimento do parque imobiliário existente, distribuídos por ano de construção, mostram que o potencial mais significativo de poupança energética está associado aos edifícios mais antigos. Em alguns casos, edifícios construídos na década de 1960 são de qualidade inferior aos edifícios de décadas anteriores. O isolamento insuficiente da envolvente dos edifícios dos anos 1960 também se reflete nos registos de dados dos valores de U (coeficiente de transmissão térmica da envolvente), ao longo dos anos, o que não constitui surpresa, uma vez que, nesses anos, as normas referentes ao isolamento eram limitadas (BPPIE, 2011). Ao contrário, os edifícios mais antigos, normalmente designados de “edifícios históricos”, apesar da ausência de isolamentos, apresentam valores de U mais baixos, devido à maior espessura das suas paredes. 

Desde que a EPBD e as suas posteriores reformulações entraram em vigor, os Estados-Membros mostraram um interesse crescente em intervenções nos edifícios existentes capazes de resultarem em poupanças energéticas. Isto resultou na introdução de um artigo específico sobre remodelação de edifícios na Diretiva de Eficiência Energética 2012/27/EU (Parlamento Europeu, 2012).

Todas estas considerações apontam para a conclusão que a renovação energética de edifícios existentes é um desafio crítico na redução do consumo energético, mas tal oportunidade tem de ser gerida cuidadosamente, especialmente quando se está a lidar com edifícios históricos.

Reabilitação energética? Sim, obrigado

A reabilitação de edifícios é uma intervenção que exige conhecimentos técnicos seguros e práticas adequadas, não só para os projetos de dimensão relevante, como os grandes edifícios de serviços, mas também para os pequenos edifícios e habitação.

Ao reabilitar um edifício, os vários intervenientes no processo de construção, não poderão deixar de avaliar e melhorar o desempenho energético de edifícios, sejam eles edifícios correntes, sejam eles edifícios históricos, e em todos há que respeitar totalmente o seu valor, bem como o seu legado cultural e as suas qualidades estéticas.

Estamos na era da eficiência energética que rima com a era da eficiência económica. A chave da eficiência energética e, paralelamente, da eficiência económica reside no diálogo e na interação de todos os intervenientes no processo de construção.

Devido às diretivas comunitárias e à sua transposição para a legislação nacional, em que são impostas elevadas exigências técnicas, os projetos de construção atingem uma elevada complexidade, levando a que a coordenação técnica entre os diversos intervenientes tenha obrigatoriamente de ser assegurada.

A Especialização em Engenharia de Climatização ciente da importância desta problemática e das exigências que advirão da adoção da recente Diretiva (UE) 2018/844 do Parlamento Europeu e do Conselho de 30 de Maio não poderão deixar de prestar total atenção (1).

A convergência para a sustentabilidade

Todos os intervenientes, arquitetos, engenheiros, e decisores, administrações privadas ou públicas, não poderão ter uma visão estritamente focada na resolução de problemas técnicos e económicos stricto sensu. Deverão ter uma consciência e atitudes mais abrangentes, promovendo a cultura da sustentabilidade nas suas múltiplas vertentes: técnica, económica, social e ambiental.

Os especialistas têm ao seu dispor, cada vez mais, uma vasta gama de tecnologias, no entanto, a complexidade das suas interações obrigam quase sempre ao desempenho de tarefas muito complexas, obrigando-os a efetuar várias abordagens, ponderar múltiplas soluções e operacionalizar várias estratégias, de modo a poderem atingir os desígnios anteriormente propostos, satisfazendo em cada etapa os respetivos requisitos e navegando numa cadeia lógica de valores que nos façam convergir para a sustentabilidade, proporcionando desenvolvimento que assegure as necessidades presentes sem comprometer as gerações futuras.

(1) Consultar o European Guidebook publicado pela REHVA e editado pela Especialização em Engenharia de Climatização da Ordem dos Engenheiros na Coleção Engenharia sob o título Eficiência Energética em Edifícios Históricos, distribuído durante as 18as Jornadas de Climatização realizadas em 25 de Outubro de 2018 sob tema Reabilitação Energética de Edifícios em Cenários de Alterações Climáticas. (European Guidebook disponível no Portal da Ordem dos Engenheiros).

 

As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Edifícios e Energia.