A publicação da Portaria nº42/2019, de 30 de janeiro sobre os edifícios de necessidades quase nulas de energia, conhecidos por NZEB, veio definir quais os requisitos de concepção para os edifícios de comércio e serviços, novos e sujeitos a grande intervenção.

A referida portaria alterou apenas cinco pontos do Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Comércio e Serviços (RECS), sendo duas das alterações – sistemas solares fotovoltaicos (ponto 12.1 a) do RECS) e sistemas de cogeração a biomassa (ponto 13.1 do RECS) – pouco relevantes.

As alterações significativas colocam-se nas definições de valores máximos para os Indicadores de Eficiência Energética (IEES) e do rácio de classe energética (RIEE), nas datas da sua aplicação e no aumento da exigência dos requisitos mínimos dos Sistemas de Gestão Técnica Centralizada.

No que diz respeito aos valores do IEES e do RIEE, a Portaria nº42/2019 obriga a que os edifícios de necessidades quase nulas de energia tenham uma classe energética A ou A+, sendo esta classificação obrigatória para os edifícios na propriedade de uma entidade pública e a ser ocupados por uma entidade pública a partir de 31 de janeiro de 2019 (dia seguinte  à publicação da referida Portaria em Diário da República), e para os restantes edifícios abrangidos pelo RECS a partir de 1 de janeiro de 2021. É claramente um sinal do legislador com vista a melhorar a eficiência energética dos edifícios, dando o próprio Estado o primeiro sinal nesse sentido, e permitindo que o sector privado tenha quase dois anos para se adaptar a este novo patamar de exigência.

A alteração dos requisitos mínimos dos Sistemas de Gestão Técnica Centralizada (GTC), passando da anterior Classe C para a Classe B, segundo a tabela 5 da norma EN15232, não está associada à definição de edifícios de necessidades quase nulas de energia, aplicando-se assim a todos os edifícios de comércio e serviços, novos e sujeitos a grande intervenção, com potência térmica nominal igual ou superior a 250kW, conforme ponto 10.1 do RECS.

Tendo em conta que a revisão da EPBD deverá ser transposta para a legislação portuguesa até março de 2020, com a recente adopção da Classe B como requisito mínimo para os sistemas de GTC, Portugal está a dar um passo sustentado no sentido de adoptar, dentro de pouco tempo, um novo patamar de exigência no que diz respeito aos sistemas técnicos dos edifícios.

A obrigatoriedade de cumprir (pelo menos) com a Classe B, segundo a EN15232, tem consequências significativas na concepção e instalação dos Sistemas de Gestão Técnica Centralizada em Portugal. Dos requisitos que a Classe B impõe aos sistemas técnicos, por comparação com a Classe C, saliento os que me parecem ser mais relevantes face ao que usualmente se adopta no nosso mercado, nos edifícios com GTC:

1. Controlo do aquecimento e/ou arrefecimento individual por espaço, com comunicação
Este requisito elimina definitivamente dos edifícios, com potência térmica nominal igual ou superior a 250kW, os termostatos autónomos, sendo obrigatório que o controlo de cada espaço individual climatizado seja integrado no Sistema de Gestão Técnica do edifício;

2. Controlo da temperatura da rede de distribuição de água aquecida e/ou arrefecida com base nas reais necessidades da instalação
A definição dos setpoints da temperatura de distribuição da água para climatização, seja na ida para o edifício, seja no retorno, terá de ser realizada de forma dinâmica e automática com base nas reais necessidades do edifício;

3. Controlo de caudal de ar novo escalonado (ou variável), de acordo com a ocupação dos espaços
Passa a ser obrigatório diminuir (ou mesmo anular) o caudal de ar novo de cada um dos espaços com base na sua ocupação ou, em alternativa, com base na qualidade do ar desse mesmo espaço, por exemplo, monitorizando a concentração de CO2;

4. Controlo automático combinado dos sombreamentos, iluminação e AVAC
Tendo em conta que o controlo de temperatura e iluminação terá de ser individualizado para cada espaço, o controlo do sombreamento – estores, palas de sombreamento, cortinas – terá de ser também individualizado para os vãos associados a cada um desses espaços. Este controlo combinado obriga à introdução de algoritmos de controlo que determinam dinamicamente em cada momento qual a solução de iluminação, sombreamento e aquecimento/arrefecimento que é mais eficiente do ponto de vista energético, mantendo as condições de conformo mínimas definidas para cada espaço;

5. Coordenação local das fontes de energia renovável e centrais de cogeração no que diz respeito ao perfil local da procura de energia, incluindo a gestão do armazenamento de energia e optimização do autoconsumo
Os Sistemas de Gestão Técnica Centralizada terão a responsabilidade de gerir a produção e utilização das fontes de energia renovável, implementando algoritmos de controlo que terão em conta o perfil de carga do edifício (térmica e eléctrica), bem como a possibilidade de utilização de soluções de armazenamento de energia térmica (por exemplo, bancos de gelo) ou eléctrica (baterias);

6. Os sistemas de energia do edifício são geridos e operados dependendo das condições da rede e na gestão dos consumos é usada a transferência de cargas
A GTC será responsável por determinar quais as condições da rede (por exemplo, as tarifas de energia eléctrica ou gás) e gerir os consumos, adoptando estratégias de transferência de carga que optimizem os custos da factura energética.

Como facilmente se percebe, o grau de exigência que a Portaria nº42/2019 vem impor aos Sistemas de Gestão Técnica Centralizada vai obrigar a alterações significativas, quer nos projectos, quer na instalação, não apenas dos próprios sistemas de GTC, mas também nos restantes sistemas técnicos dos edifícios, com forte incidência nos sistemas de climatização, produção local de energia e sistemas de acumulação, diálogo com as redes eléctricas e de gás e sistemas de sombreamento.

A revisão da directiva comunitária relativa ao desempenho energético dos edifícios (EPBD) de maio de 2018 vem reforçar as medidas já propostas aos vários Estados-Membros em 2010, com um enorme foco nos edifícios com necessidades quase nulas de energia (NZEB), sejam eles novas construções, sejam transformações profundas nos edifícios existentes. Esta mesma directiva realça o papel determinante da automatização dos edifícios para se atingir essa classificação NZEB, criando um indicador de aptidão para tecnologias inteligentes (SRI – Smart Readiness Indicator), a ser adoptado para medir a capacidade dos edifícios para utilizar tecnologias de informação e comunicação e sistemas electrónicos com vista a adaptar o funcionamento do edifício às necessidades dos ocupantes e à rede, bem como para melhorar a sua eficiência energética e o seu desempenho global.

Tendo em conta que a revisão da EPBD deverá ser transposta para a legislação portuguesa até março de 2020, com a recente adopção da Classe B como requisito mínimo para os sistemas de GTC, Portugal está a dar um passo sustentado no sentido de adoptar, dentro de pouco tempo, um novo patamar de exigência no que diz respeito aos sistemas técnicos dos edifícios, reforçando a importância dos sistemas de controlo. Sem qualquer dúvida, um passo na direcção certa. 

As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Edifícios e Energia.