A Comissão Europeia (CE) prevê, por enquanto, a continuação da venda e instalação de esquentadores e caldeiras movidos a combustíveis fósseis durante, pelo menos, a próxima década, mas os regulamentos para o tema vão estar brevemente em discussão. Numa carta aberta enviada ontem a Bruxelas, um conjunto de entidades, entre as quais a associação ZERO, apela à eliminação gradual da venda destes equipamentos, alertando para o risco de incumprimento das metas ambientais comunitárias, e pede a sua proibição na nova construção.

O documento surge a menos de uma semana da discussão dos especialistas técnicos dos Estados-Membros sobre o projecto de revisão da CE da regulamentação para a concepção ecológica, que deverá acontecer nos dias 27 e 28 de Setembro. A carta é dirigida a Frans Timmermans, vice-presidente executivo da CE e para o Pacto Ecológico Europeu, e assinada por 30 entidades europeias, incluindo empresas, representantes políticos locais e outras organizações não-governamentais, entre as quais as portuguesas ZERO e Quercus.

Os signatários criticam o facto de a proposta de revisão da CE prever a continuação da venda e instalação de esquentadores e caldeiras movidos a combustíveis fósseis na União Europeia (UE) e pedem também que a futura revisão da Directiva para o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD) “não permita a combustão directa de combustíveis fósseis nos novos edifícios”.

Para a ZERO, o regulamento proposto e que será debatido em breve é “decepcionante”, já que permitir a venda destes aparelhos a combustíveis fósseis após 2025 põe em risco não só a concretização da meta da neutralidade carbónica até 2050, mas também “os esforços de vários Estados-Membros no sentido de evitar vendas de aparelhos novos com tecnologia de aquecimento antiga e poluente”. Ao fazê-lo, antevê a associação, a maioria dos aparelhos movidos a combustíveis fósseis permanecerá em operação para lá de 2050. Isto quer dizer que poderá haver milhões de caldeiras de combustíveis fósseis nas casas europeias até 2050, altura em que se deverá ter atingido a neutralidade carbónica.

Segundo a mesma fonte, actualmente, mais de 80 % dos equipamentos de aquecimento de espaços instalados na Europa são alimentados por combustíveis fósseis. Impedir a venda destes aparelhos após 2025 “seria equivalente à poupança de 110 milhões de toneladas (Mt) de emissões de CO2 por ano até 2050”. De notar que, actualmente, existem cerca de 129 milhões de caldeiras instaladas na UE, sendo que mais de 50 % são “muito ineficientes”. Segundo a associação ZERO, “é expectável que as políticas de concepção ecológica e de etiquetagem energética contribuam com cerca de um terço da redução de emissões necessárias para atingir o objectivo europeu de redução para 2030, no âmbito do pacote de medidas Fit for 55”. Contudo, e nas palavras da organização ambientalista, o projecto proposto pela CE em Julho de 2021 é “insuficiente para alcançar as metas de redução de emissões da UE para 2030 e 2050”.

Em comunicado, a associação relembra que existem alternativas a estes equipamentos alimentados a combustíveis fósseis, nomeadamente as bombas de calor. A Agência Internacional de Energia, que, em Maio passado, tinha já recomendado a introdução global de proibições de novas caldeiras a combustíveis fósseis a partir de 2025, prevê que as bombas de calor possam fornecer mais de 90 % das necessidades globais de aquecimento ambiente e produção de águas quentes sanitárias até 2050.

Depois da discussão dos especialistas técnicos dos Estados-Membros sobre a proposta da CE, haverá, nos próximos meses, uma votação sobre o tema. Nesta discussão, serão debatidas “algumas das primeiras propostas concretas feitas em antecipação da COP26”, que “afectam uma grande parte das emissões de gases com efeito de estufa da UE”, lê-se em comunicado.

Recorde-se de que 28 % do total da energia consumida na UE deriva do aquecimento de espaços e de água. Já a nível residencial, 75 % desta energia provém de combustíveis fósseis. Por essa razão, já sete Estados-Membros anunciaram a eliminação progressiva dos aparelhos alimentados a combustíveis fósseis.