Foi recentemente publicado o Despacho do Gabinete do senhor secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, que determina a abertura do procedimento concorrencial para atribuição de reserva de capacidade de injeção que deixará de estar afeta à central termoelétrica a carvão do Pego, em virtude da cessação, a 30 de novembro deste ano, do respetivo Contrato de Aquisição de Energia titulado pela Tejo Energia, S.A.

Conforme decorre das peças do procedimento o critério de adjudicação do referido ponto de injeção (na ordem dos 325MVA, no caso de projetos cuja tecnologia seja exclusivamente solar, ou de 485MW, no caso de projetos com recurso a tecnologias de outras fontes de energia renovável) centra-se no “impacto do MVA adjudicado” medido particularmente pela redução de emissões de gases que o novo projeto representa e pela avaliação de majorações de índole variada, designadamente laboral e financeira.  

A um leitor certamente menos incauto não terá escapado, no entanto, duas majorações particulares ao critério de adjudicação: por um lado, a necessidade de partilha pelo promotor com o município de Abrantes de uma percentagem mínima de 1 % da eletricidade renovável produzida pelo centro electroprodutor “para utilização em edifícios ou equipamentos da Administração Pública local”; por outro, a necessidade de “disponibilização de soluções de mobilidade sustentável, nomeadamente através da disponibilização de veículos comerciais e pesados de transporte de pessoas, mercadorias (…) para utilização em serviços municipais movidos a gases renováveis e/ou elétricos”.

No denominador comum destas majorações está uma clara intenção de promoção da eficiência energética dos equipamentos e edifícios da Administração Pública (no caso, o município de Abrantes) através do financiamento por parte de promotores privados. Trata-se de uma solução de compromisso (e medianamente justa) entre os benefícios decorrentes do investimento privado em projetos de energia renovável e a salvaguarda do interesse local/municipal e da sustentabilidade ambiental, incluindo da Administração Pública.

No entanto, é uma solução/intenção que não surge sem risco. Por um lado, representa um encargo substancial que terá impactos nos modelos financeiros dos promotores (o que pode afastar potenciais investidores e não consagrar uma verdadeira concorrência). Por outro lado, uma solução que passe pelo financiamento da eficiência energética da Administração Pública por privados sem que corresponda a uma concreta meta e/ou objetivo (designadamente locais) pode tornar-se contraproducente e ser particularmente frustrante para todas as partes (a título de exemplo, questiona-se se, efetivamente, a mobilidade elétrica é a necessidade premente atual do município de Abrantes em termos de sustentabilidade e se a escolha dessa medida tem algum substrato em estudo/programa ou plano local).  

Estando em vias de ser revisto o quadro legal regulatório da produção de eletricidade, os riscos acima referidos devem ser mesurados pelo legislador (a curva de Gaus pode ser um bom indicador) de modo a evitar soluções que introduzam injustificados desequilíbrios no mercado e que, sustentados em princípios aparentemente legítimos, afastem irremediavelmente o país (e os investidores) da rota da neutralidade carbónica.

As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.