Autor: Marco Dorothal © Solar Market Parity Portugal

 

O potencial da energia solar em Portugal está, presentemente, num máximo histórico. Graças a dois concursos de energia solar bem-sucedidos, o mercado fotovoltaico (PV) português está a viver um aumento de projetos de grande escala. Ambos os concursos de energia solar foram bem-sucedidos atraindo um grande número de propostas que resultaram em níveis mínimos históricos, 0,013 €/kWh em julho de 2019, e 0,011 €/kWh em julho de 2020, de acordo com o jornal português Expresso.

No entanto, preços tão baixos têm dado lugar a preocupações sobre a viabilidade financeira destes projetos. Também deve salientar-se que a maioria dos projetos atribuídos ainda está a ser desenvolvida e ainda aguarda pela luz do dia. Relativamente a estas preocupações, a Solarplaza contactou quatro peritos de mercado com vista a obter uma opinião do significado dos concursos para o mercado português e saber que outras oportunidades se apresentam para incentivar adicionalmente a implantação de capacidade de energia solar.

Qual a razão dos concursos?

Até ao momento, o governo português organizou dois concursos de energia solar muito competitivos. Os concursos destinam-se a reduzir a distância entre a atual capacidade de energia solar PV instalada – 885 MW – e o objetivo de 9 GW até 2030.

“Dada a atual procura elevada de licenças de produção/implantação e a baixa disponibilidade de capacidade de rede, os modelos de leilões adequados representam a forma mais eficaz em termos de custos de incentivar o investimento na capacidade de geração de eletricidade renovável, dando prioridade a projetos com custos mais baixos e com garantias de execução viáveis,” afirma Pedro Jorge, CEO da APREN – Associação Portuguesa de Energias Renováveis.

De acordo com o fornecedor de soluções energéticas Efacec, os concursos constituem uma estratégia rápida para alcançar os planos ambiciosos estipulados no Plano Nacional Energia e Clima (PNEC 2030). Os projetos impulsionados por leilões devem acelerar a taxa de instalações PV em Portugal. O quadro atual, com a pandemia COVID-19, mudou substancialmente o planeamento existente na economia nacional global. Infelizmente, a indústria solar não irá conseguir escapar a este cenário. É importante compreender como se irá desenvolver a recuperação económica no país e qual será o investimento do governo para estimular a produção de energia renovável a longo prazo.

Atualizações de concursos

Apesar do sucesso dos leilões de energia solar em Portugal, o regime de concursos tem muito espaço para melhorias. O governo reconheceu este facto e tentou implementar algumas retificações para o leilão de julho de 2020. Uma das principais alterações efetuadas à estrutura de leilões foi a inclusão de uma terceira categoria de remuneração para instalações PV, incluindo armazenamento.

“Esta é uma abordagem importante não só para compreender o valor de mercado do armazenamento, mas também para preparar a adaptação do sistema nacional a novas tendências que estão a perturbar o setor elétrico”, afirma Jorge.

Outras melhorias incluem a extensão do processo de licenças atual, uma estrutura mais clara relativamente aos impostos e taxas aplicados e a publicação atempada de detalhes do contrato de compra. No entanto, mesmo com estas melhorias, o regime de concursos atual apresenta alguns obstáculos cruciais que têm consequências no desenvolvimento adicional do mercado.

Obstáculos no regime atual

Um dos principais obstáculos no regime de concursos atual é que foi concebido para considerar o preço como o único critério de avaliação para conquistar as rondas de propostas e assegurar um ponto de ligação. Jorge afirma, “Esta escolha, apesar de resultar em preços de geração de eletricidade mais baixos, não considera outros parâmetros e critério importantes que poderiam diferenciar projetos mais sustentáveis, com mais benefícios para o ambiente e economia nacional, tais como projetos que promovem um modelo sustentável de crescimento económico e criação de emprego local.”

Os modelos de concurso têm tradicionalmente utilizado o critério “preço mínimo”, em grande parte devido à sua simplicidade e eficácia no fornecimento de preços baixos. No entanto, mais recentemente, alguns países adotaram abordagens mais holísticas ao incluir uma matriz de múltiplos critérios no processo de seleção. Esta apresenta fatores de correção com critérios de transparência para comparar diferentes ofertas ou pré-qualificar candidatos.

Esses critérios permitem a imparcialidade clara do processo e salvaguardam a qualidade dos projetos e a respetiva execução. Também possibilitam o desenvolvimento de projetos em linha com uma estratégia para desenvolver negócios de alta qualidade e know-how promovendo a criação de empregos de valor acrescentado para o país, que deveria ser uma melhor prática em todos os concursos. Preços baixos podem indicar uma queda positiva nos custos de instalação, mas também dificultam a concorrência por parte de intervenientes de dimensão mais pequena. Para além do regime de concursos, o governo tem outras questões cruciais que irá necessitar de tratar antes de abordar a capacidade leiloada.

Reduzir a distância

Sem dúvida que os concursos estão a contribuir para o desenvolvimento do mercado solar e estão a atrair novos investidores. No entanto, João Garrido, fundador da Caparica Solaris, é mais a favor de uma política de mercado concorrencial.

“Atualmente não necessitamos de qualquer tipo de apoio económico governamental, a indústria solar atingiu a paridade com a rede pública de energia há alguns anos atrás. Assim, não se trata de economia, trata-se de remover barreiras jurídicas e administrativas ,” afirma Garrido.

A política de promover CAE com uma tarifa garantida por entidades governamentais estabeleceu uma distorção do mercado, uma vez que o estado está a interferir nas regras do mercado livre do poder de compra e venda.

“Esta situação”, afirma Garrido, “é contrária às diretrizes da UE que pretendem promover o mercado de CAE e acaba, de certa forma, por favorecer monopólios existentes que tanto prejudicaram o desenvolvimento da indústria de energia solar. Na minha opinião, temos de incentivar a liberalização total do mercado de CAE, promovendo a diversidade dos intervenientes.”

De acordo com Pedro Jorge, existem três grandes melhorias necessárias para Portugal começar a aumentar as suas instalações PV com vista a ter uma hipótese de atingir o objetivo de 9 GW até 2030. Em primeiro lugar, existe uma forte necessidade de simplificar os processos de licenças e autorizações existentes. Jorge e Garrido concordam que o sistema atual é demasiado complexo e requer a aprovação de inúmeras entidades administrativas relacionadas com o estado, todas as quais têm diferentes procedimentos e períodos de respostas demorados.

Assim, é essencial acelerar a interação entre as entidades e aplicar um ponto de contacto único entre as mesmas e o empreendedor, o que ainda não foi implementado em Portugal.

Em segundo lugar, a rede elétrica nacional atual irá necessitar de ser alargada e modernizada. A rede atual não tem a capacidade e flexibilidade adequadas que são necessárias para fazer face ao influxo da capacidade de energia renovável. A rede também tem de ser adequadamente otimizada em termos de gestão e controlo para conseguir gerir a quota crescente da produção de eletricidade descentralizada e negociação bidirecional com prosumidores.

Por último, o processo global de instalações de pequena escala também tem de ser simplificado. É necessário implementar obrigações adequadas e proporcionais de um ponto de vista regulamentar e fiscal. Estas alterações são necessárias para assegurar que pequenos produtores dispõem de meios para competir com outros produtores com mais capacidades financeiras. Reduzir a distância não irá ser fácil, mas irá requerer que os intervenientes procurem oportunidades, para além do regime de apoio governamental, para desenvolver projetos solares.

Oportunidades para além dos concursos

Implementar as alterações anteriormente mencionadas pode abrir a possibilidade de procurar oportunidades para desenvolver a energia solar para além de projetos impulsionados por concursos. Os sistemas de autoconsumo, por exemplo, têm vindo a ganhar popularidade, uma vez que ainda é um mercado novo e por descobrir com um elevado potencial de crescimento. Integrar projetos de autoconsumo com comunidades da energia pode possibilitar um retorno atrativo para investidores. Estes tipos de projetos já estão a revolucionar o design do sistema de eletricidade, bem como a reconsiderar o papel do consumidor enquanto um participante ativo na transição energética.

Outra oportunidade que também tem vindo a conquistar muita atenção é a utilização de hidrogénio verde. João Peças Lopes, professor da FEUP e Diretor Associado da INESC TEC, é um grande defensor do hidrogénio verde e afirma que:

“A geração de energia solar PV será em breve utilizada para gerar eletricidade que irá alimentar a eletrólise para produzir hidrogénio. O hidrogénio está a tornar-se um vetor complementar da eletricidade e irá desempenhar um papel essencial no futuro em Portugal e na Europa na transição energética.”

O fornecedor de soluções energéticas Efacec também reconhece o potencial do hidrogénio verde em Portugal e acrescenta ainda que o país tem uma oportunidade excelente para ser um dos países líderes na Europa no desenvolvimento de um “Núcleo de Hidrogénio Verde” (focado na exportação). Tirando partido das características únicas do mercado que resultaram num preço extremamente competitivo no último leilão, Portugal pode ganhar uma vantagem competitiva significativa comparativamente a outros países, uma vez que pode utilizar a sua energia solar barata para produzir hidrogénio verde para exportação. Outras oportunidades mencionadas incluem os promissores segmentos de instalação em telhados, comercial e industrial (C&I) e painéis flutuantes.

Resumindo, o mercado português possui imenso potencial para ser um dos mercados de energia solar líderes da Europa. O mercado ainda está em desenvolvimento, mas existem esperanças elevadas para o futuro. O mercado irá tentar ultrapassar a marca de 1 GW este ano e terá de aumentar a quantidade de instalações anuais para cerca de 1 GW depois disso. Por agora, cabe às autoridades governamentais criar um ambiente no qual os projetos solares não necessitem de apoio governamental para serem realizados. Felizmente, Portugal tem mais do que oportunidades suficientes para o crescimento da energia solar para além dos concursos. Será apenas uma questão de tempo antes de o mercado estar suficientemente avançado, permitindo o aparecimento de novos segmentos de mercados com vista a diversificar ainda mais o seu crescimento.

 

Quer saber mais sobre a energia solar em Portugal?

Junte-se a nós virtualmente em SOLAR MARKET PARITY PORTUGAL de 10 a 15 de setembro!

 

 

 

 

As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.