Artigo publicado originalmente na edição de Janeiro/Fevereiro de 2024 da Edifícios e Energia.
Alfacinha de nascimento, Maria ficou muito contente com a classe energética A do agora seu apartamento. Mas quando as facturas da luz começaram a chegar reparou que os valores eram mais altos do que aqueles que ela estava habituada a pagar no anterior apartamento alugado. Assim, com a ajuda de um consultor verificou que o depósito de acumulação da energia solar tem uma resistência eléctrica no seu terço inferior, na mesma zona da serpentina de permuta da energia solar. Pensava que tinha água quente com mais de 50 % de contribuição da energia solar e afinal a contribuição do solar é nula pois como toma banho à noite quando o sol nasce já a água está aquecida pela resistência eléctrica.
Maria resolveu verificar o que constava no certificado energético, mas este só diz que, “para a preparação de água quente, tem instalado um sistema solar térmico apoiado por uma resistência eléctrica, (…) sistema solar térmico por circulação forçada composto por dois painéis marca ‘X’ modelo ‘X’ e um depósito instalado no interior da fracção”.
O consultor explicou que a utilização do sistema de apoio no depósito de armazenamento de energia solar promove a concorrência entre estes sistemas, nomeadamente porque a resistência eléctrica e a serpentina do sistema solar actuam na mesma área do depósito. Esta situação pode dificultar, ou mesmo impedir, uma gestão eficaz do aproveitamento da energia solar. Por conseguinte, o sistema solar térmico deve ser responsável pelo aquecimento, em exclusivo, da parte mais fria do depósito (zona inferior), cabendo ao sistema de apoio (resistência eléctrica) o aquecimento da respectiva parte mais quente (normalmente o terço superior).
Esta obrigação já faz parte da Portaria 138-I/2021, que substituiu a portaria 349B-2013, que permitia a situação encontrada no seu apartamento (construído em 2020). No entanto, a instalação não respeita a Portaria n.º 349 B-2013 REH, em vigor na altura da construção:
- a) Não inclui a “instalação de um relógio programável e acessível, para actuação da resistência de forma que, durante o dia, o depósito possa receber energia proveniente do colector solar”
- b) A resistência térmica do isolamento do depósito é inferior ao valor legislado. O isolamento em poliuretano injectado apresenta valores de condutibilidade térmica superiores a 0,024 W/(m.K), pelo que a resistência térmica nestas condições é de 1,66 m2.K/W, valor inferior ao regulamentado – 2,00 m2.K/W.
- c) A tubagem respeitante à água quente sanitária e ao sistema solar (circuito da serpentina) não está termicamente isolada.
Outra situação para a qual o consultor a alertou foi a inexistência de uma tina de recolha de água que impeça a inundação por rotura do depósito, quer do seu apartamento, quer dos apartamentos por baixo do seu.
Maria está decepcionada com o Sistema de Certificação Energética, pois a informação prestada com a classificação A afinal não corresponde ao apartamento que comprou. E pergunta:
- Como é que se pode afirmar que os certificados energéticos reflectem com precisão o desempenho energético dos edifícios?
- Como é que o SCE pode apregoar a fiabilidade dos certificados energéticos se não fiscaliza as instalações?
As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.