Marcelo Rebelo de Sousa vetou o Decreto n.º 81/XV invocando a falta de credibilidade na execução das medidas contempladas no programa Mais Habitação para resolver a crise habitacional. A decisão foi dada a conhecer ontem e algumas associações ligadas ao sector já deram o seu parecer.

“Não é fácil ver de onde virá a prometida oferta de casa para habitação com eficácia e rapidez”, sublinha o presidente da República. As palavras de Marcelo Rebelo de Sousa constam da sua mensagem à Assembleia da República a propósito do Decreto n.º 81/XV, onde é dado a conhecer o parecer negativo a este diploma.

A decisão de veto, descreve o presidente nessa comunicação, está relacionada quer com a falta de credibilidade quanto à execução a curto prazo, quer quanto à falta de força para mobilizar os agentes para a resposta à crise habitacional, desde agentes públicos e privados, até aos sociais e aos portugueses.

Recorde-se que o programa Mais Habitação foi anunciado pelo Governo há seis meses com o objectivo de, como o nome indica, aumentar a oferta de imóveis para habitação, visando ajudar a resolver a crise habitacional que está a afectar, sobretudo, jovens e famílias mais vulneráveis. Para fazê-lo, o programa avançou com várias medidas que desde então têm suscitado o debate, em particular as que dizem respeito ao arrendamento forçado de casas devolutas de privados e à limitação do alojamento local.

Segundo Marcelo Rebelo de Sousa, estas duas medidas, embora tenham sofrido correcções, resultam, neste diploma, em dúvidas. “O arrendamento forçado fica tão limitado e moroso que aparece como emblema meramente simbólico, com custo político superior ao benefício social palpável” e “a igual complexidade do regime de alojamento local torna duvidoso que permita alcançar com rapidez os efeitos pretendidos”, refere o presidente da República.

O chefe de Estado critica ainda a forma como o Decreto n.º 81/XV “dificilmente permite recuperar alguma confiança perdida por parte do investimento privado”, que se pretendia ter como aliado, através de estímulos, para aumentar a oferta de habitação. Uma questão agravada por aquilo que caracteriza como um investimento público e social “contido e lento”, sendo que “salvo de forma limitada, e com fundos europeus, o Estado não vai assumir responsabilidade directa na construção de habitação”. Recorde-se que a disponibilização de mais rendimento acessível também iria acontecer por via do Estado e da colaboração deste com cooperativas, com recurso a estímulos.

Há ainda, na perspectiva de Marcelo Rebelo de Sousa, problemas criticáveis a nível dos meios e da máquina administrativa disponíveis, dos prazos de actuação, da ausência de medidas que respondam imediatamente à crise de famílias sufocadas pela subida dos juros e das rendas e à inexistência de acordo de regime sobre a habitação.

Além das medidas deste decreto, o programa Mais Habitação inclui também propostas para a simplificação administrativa de licenciamentos que estão contempladas noutro diploma da Assembleia da República, que Marcelo Rebelo de Sousa promulgou.

Reacções da associações ligadas à habitação

Em resposta à decisão de Marcelo Rebelo de Sousa, a APPII – Associação Portuguesa de Promotores e Investidores Imobiliários veio dizer, ontem também, que o veto ao Mais Habitação é a “derradeira oportunidade para criar um pacote de medidas que vá ao encontro das verdadeiras necessidades dos portugueses para introduzir mais casas no mercado”. Embora reconheça aspectos positivos nas alterações feitas à proposta inicial, a associação mantém a sua posição crítica quanto a medidas que considera “prejudiciais à habitação, como as limitações ao alojamento local, o fim dos Vistos Gold ou as limitações aos novos contratos de arrendamento”.

“No fundo, o que é preciso é criar rapidamente mais oferta em todos os escalões e dar também confiança aos 350 mil proprietários, que não confiando no mercado do arrendamento preferem ter milhares de casas abandonadas e vazias a dar-lhes algum rendimento”, refere, em comunicado, o presidente da APPII, Hugo Santos Ferreira. Além disso, será necessário, na visão do responsável, resolver de forma estrutural “o problema da excessiva carga fiscal à habitação, um dos maiores entraves para a colocação de mais casas no mercado”.

Também a associação ALEP – Alojamento Local Em Portugal recebeu a decisão do presidente da República com “um misto de esperança e satisfação”, tal como a recém-constituída ALPN – Associação do Alojamento Local Porto e Norte, que, em comunicado, diz desejar que o veto seja um “leitmotiv” para a Assembleia da República e Governo realizarem “uma verdadeira política de habitação para o país, sem prejuízo do alojamento local e das actividades conexas”. 

“O alojamento local representa apenas 2 % de imóveis habitacionais em todo o país – número que jamais dará resposta ao problema”, destaca a ALPN, que acrescenta ainda que o programa Mais habitação “é altamente penalizador para esta actividade económica e para as actividades conexas”, “colocando 60 mil famílias com o seus sustento em risco”.