Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 156 da Edifícios e Energia (Novembro/Dezembro 2024).
*Artigo cedido pelo REHVA Journal de Abril
Autores do artigo:
Gökçe Tomrukçu, Faculdade de Arquitectura e Design, Departamento de Arquitectura, Universidade Ozyegin, Istambul, Turquia
Touraj Ashrafian, Faculdade de Engenharia e Meio Ambiente, Departamento de Arquitectura e Ambiente Construído, Universidade de Northumbria, Newcastle upon Tyne, Reino Unido
O clima mudou naturalmente ao longo da história. No entanto, particularmente desde a Revolução Industrial, as actividades humanas têm influenciado cada vez mais essa mudança lado a lado com os processos naturais [1]. Durante este período, quantidades significativas de gases com efeito de estufa foram libertados para a atmosfera, principalmente devido à utilização de combustíveis fósseis para aquecimento, arrefecimento de edifícios e produção de outras fontes de energia. Os principais gases antropogénicos com efeito de estufa incluem o dióxido de carbono (CO2), o metano (CH2), o protóxido de azoto (N2O), o ozono (O3) e os gases fluorados. A acumulação destes gases intensificou o efeito de estufa natural, contribuindo para um aumento da temperatura da superfície da Terra, exacerbada pela urbanização.
No Quinto Relatório de Avaliação, o IPCC (Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas) classificou os cenários futuros pela sua gravidade. O RCP 2.6 representa um cenário de mitigação caracterizado por esforços significativos de redução de emissões, enquanto o RCP 8.5 retrata um cenário extremo, com altas emissões e esforços mínimos de mitigação, resultando no rápido aquecimento e em impactes severos das alterações climáticas. O recém-lançado Sexto Relatório de Avaliação refinou estes cenários, integrando factores socioeconómicos, agora referidos como SSP 1-1,9 (emissões mais baixas) e SSP 5-8,5 (emissões mais altas) [2].
De acordo com estes cenários climáticos, prevê-se que, em média, haverá um aumento crítico da temperatura nos próximos 20 anos se não forem tomadas as precauções adequadas [1]. A Agência Internacional de Energia (AIE) relata que o sector da construção é um dos principais contribuintes para o consumo global de energia, 40 % do total e 30 % das emissões dos gases com efeito de estufa [3]. Consequentemente, as alterações climáticas previstas irão ter certamente impacto nos sistemas de ar condicionado dos edifícios.
2. MÉTODOS
Este estudo investiga e analisa o impacte negativo das alterações climáticas nos sistemas de AVAC, com o objectivo de sensibilizar para esta questão crítica. As alterações climáticas, um problema global desta era, irão afectar negativamente todos os sistemas em graus variados se não forem tomadas precauções. Inicialmente, o estudo descreve os efeitos negativos das alterações climáticas nos sistemas de AVAC, examinando como as mudanças futuras de temperatura e eventos climáticos extremos impactam significativamente os sistemas dos edifícios. Isto leva a um aumento da confiança no ar condicionado para manter o conforto térmico. Nesta fase, o estudo identifica problemas críticos que podem surgir, incluindo sobrecargas dos sistemas, aumento do consumo de energia e custos operacionais mais altos.
Posteriormente, o estudo avalia potenciais soluções e apresenta alternativas para dar resposta aos desafios, fornecendo exemplos comparativos para ilustrar a eficácia das diferentes estratégias. Estas alternativas incluem a optimização do projecto dos sistemas de AVAC, o aumento da eficiência energética, incorporando fontes de energia renováveis, e a implementação de tecnologias inteligentes para monitoração em tempo real e controlo adaptativo. Ao destacar os desafios e as estratégias potenciais, este estudo visa fornecer uma compreensão abrangente das questões. Enfatiza a necessidade de medidas proactivas para mitigar os efeitos adversos das alterações climáticas nos sistemas de AVAC, incentivando as partes interessadas a adoptar essas estratégias para garantir o funcionamento sustentável e eficiente dos edifícios.
3. TENDÊNCIA DAS NECESSIDADES DE AQUECIMENTO
Uma das consequências mais marcantes das alterações climáticas é o aumento constante das temperaturas globais. Com o aumento das temperaturas, espera-se que as necessidades de aquecimento diminuam significativamente. Esta mudança terá um impacto directo nas capacidades térmicas e nas taxas de utilização dos sistemas de AVAC dos edifícios, levando a requisitos de aquecimento reduzidos e alterando os padrões de funcionamento para esses sistemas. Numerosos estudos foram realizados para entender e quantificar esses efeitos.
Para investigar os efeitos das alterações climáticas na procura de energia de aquecimento e arrefecimento de edifícios no Canadá, foram criados futuros arquivos meteorológicos usando métodos estatísticos e dinâmicos de downscaling. Os resultados revelam que se prevê que os Heating Degree Days (HDD) (Graus-dia de Aquecimento) diminuam 30 % em Toronto até 2070. Esta redução significativa dos HDD indica invernos mais amenos, conduzindo a uma diminuição correspondente da intensidade de utilização de energia de aquecimento. Consequentemente, prevê-se que esta intensidade diminua entre 18 % e 33 %, dependendo da tipologia de edifício e da baseline dos dados climáticos utilizados. Esta redução da procura de aquecimento sublinha a necessidade de adaptar os projectos dos edifícios e sistemas de AVAC às alterações climáticas, garantindo a eficiência energética e a resiliência dos edifícios futuros [4].
Outro estudo utilizou o cenário A2 (IPCC) para investigar o impacto na procura de energia de aquecimento e arrefecimento em edifícios residenciais no Brasil. Os resultados mostraram um aumento constante no consumo de energia por mais de 60 anos. Em contrapartida, o consumo de energia para aquecimento para superar as horas de frio será significativamente reduzido nas cidades de Curitiba e Florianópolis. Também foi comprovado que, em cidades frias, a procura de energia para o aquecimento anual diminuirá 94 % até 2080 devido ao aumento das temperaturas médias e aumento da radiação solar global [5].
Num estudo realizado na China, investigaram o impacto de cenários climáticos futuros no consumo de energia em edifícios de escritórios. Os resultados indicaram uma redução no consumo de aquecimento em 22,3 % em Harbin, 26,6 % em Pequim, 55,7 % em Xangai, 13,8 % em Kunming e 23,6 % em Hong Kong. Observou-se que o aquecimento ambiente é predominantemente obtido a partir de caldeiras a gasóleo ou gás, enquanto o arrefecimento do ambiente depende principalmente de electricidade. Isto destaca uma mudança em direcção ao aumento da procura da energia eléctrica. O estudo também enfatizou que o maior consumo de energia em edifícios conduzirá a um aumento das emissões, agravando assim as alterações climáticas e o aquecimento global [6].
Num outro estudo, a Grécia foi avaliada após serem estimados os dados do modelo climático, tendo em conta as previsões das alterações climáticas para o período 2010-2100. Os resultados evidenciaram que a procura de energia para aquecimento do sector da construção na Grécia poderia ser reduzida em cerca de 50 % com este efeito, sendo mais pronunciado na parte sul do país [7]. Outro estudo avaliou as necessidades de energia de uma casa isolada típica na Finlândia. De acordo com os resultados obtidos, verificou-se que a procura anual de energia para aquecimento do ambiente e fornecimento de ar diminuirá entre 20 a 40 % até 2100 [8].
Outro estudo focou-se na investigação dos impactes das alterações climáticas nos edifícios residenciais em Istambul e Izmir, Turquia. Os resultados revelam uma redução nos graus-dia de aquecimento juntamente com um aumento nos graus-dia de arrefecimento. Especificamente, simulações no âmbito do cenário RCP 8.5 projectam um aumento de temperatura de 4,3 °C em Istambul e 5 °C em Izmir. Consequentemente, o estudo sublinha uma diminuição notável no consumo de aquecimento, particularmente pronunciado em Izmir em comparação com Istambul [9].
Os resultados de todos estes estudos sublinham a influência substancial das alterações climáticas nos padrões de consumo de aquecimento em diversas regiões do mundo, afectando directamente os sistemas de AVAC e construindo estratégias de gestão de energia. Com o aumento global da temperatura, há uma diminuição acentuada nas necessidades de aquecimento observada em várias áreas geográficas, resultando em reduções dos graus-dia e consequentes mudanças na dinâmica operacional dos sistemas de AVAC. Tais transformações exigem adaptações estratégicas nas tecnologias dos sistemas de AVAC e práticas de arquitectura no sentido de optimizar a eficiência energética e aumentar a resiliência geral dos edifícios face à evolução das condições climáticas.
Além disso, as consequências negativas das alterações climáticas não se limitam ao aumento das temperaturas. O Quinto Relatório de Avaliação do IPCC destaca um aumento antecipado na frequência e gravidade de eventos climáticos extremos. Estas mudanças afectam directamente os sistemas de AVAC, levando a interrupções operacionais e danos às unidades de ar condicionado. Por exemplo, as projecções sugerem que serão necessários sistemas de AVAC mais robustos para controlar a elevada humidade e o aumento da transferência de calor do ar exterior durante os verões mais quentes, exacerbados pelas elevadas temperaturas de bulbo húmido e bulbo seco do ar exterior [10]. Estas descobertas salientam o imperativo de implementar medidas adicionais para mitigar a vulnerabilidade dos sistemas de AVAC aos eventos climáticos extremos.
3.1 ILHA DE CALOR URBANA
Espera-se que os aumentos de temperatura devido às alterações climáticas sejam particularmente pronunciados nas áreas urbanas, em grande parte devido ao efeito de ilha de calor. Este efeito ocorre quando a temperatura média do ar numa cidade é maior do que nas áreas rurais vizinhas. Para as pessoas que vivem em climas quentes, isto pode resultar em temperaturas que excedam o limite para se viver confortavelmente em determinadas épocas do ano. Prevê-se que 75 % da população mundial estará em risco de exposição ao calor potencialmente letal na forma de ondas de calor, particularmente em áreas urbanas [11]. Consequentemente, as necessidades de arrefecimento das cidades devem aumentar significativamente para manter o conforto térmico. As actuais projecções da procura de energia indicam um aumento substancial a curto prazo da utilização de ar condicionado (AC).
É crucial adoptar práticas sustentáveis dos sistemas de AVAC, melhorar a eficiência energética e implementar tecnologias inovadoras de arrefecimento. Isto inclui a integração de estratégias de arrefecimento passivo, o desenvolvimento de tecnologias de redes inteligentes e a utilização de fontes de energias renováveis para fins de arrefecimento.
Um estudo realizado no centro de Paris descobriu que, em condições climáticas futuras, as temperaturas urbanas podem ser significativamente maiores do que nas áreas rurais devido ao efeito de ilha de calor. Outro estudo prevê que o consumo de energia do AC em França duplicará. [12]. Além disso, os aparelhos de AC exacerbam directamente o efeito de ilha de calor urbana. Liu et al. descobriram que, num conjunto típico de edifícios de escritórios, os sistemas de AC podem aumentar a intensidade da ilha de calor até 0,7 °C ao meio-dia, com um aumento médio diário de 0,53 °C [13]. No Verão, a diferença de temperatura entre o centro das áreas urbanas e áreas rurais circundantes pode atingir 2,5 °C, resultando em 5-10 % de consumo adicional de electricidade e desafios operacionais para os sistemas de AVAC [14].
O estudo sustenta que a subida das temperaturas nas cidades, causadas pelas alterações climáticas e pelo efeito de ilha de calor, aumenta significativamente as necessidades de ar condicionado, levando a um maior consumo de energia e agravamento das alterações climáticas. Este fenómeno salienta a necessidade de sistemas de ar condicionado diferentes e mais eficientes para garantir o conforto térmico. O aumento do uso de ar condicionado não só aumentará o consumo de energia, mas também contribuirá para uma maior poluição ambiental. Se não forem tomadas precauções, os efeitos negativos das alterações climáticas irão piorar. Para mitigar esses impactes, é crucial adoptar práticas sustentáveis dos sistemas de AVAC, melhorar a eficiência energética e implementar tecnologias inovadoras de arrefecimento. Isto inclui a integração de estratégias de arrefecimento passivo, o desenvolvimento de tecnologias de redes inteligentes e a utilização de fontes de energias renováveis para fins de arrefecimento.
4. TENDÊNCIA DA PROCURA DE ARREFECIMENTO
Como uma consequência inevitável das alterações climáticas, o aumento da temperatura do ar irá resultar na diminuição da procura por aquecimento e no aumento da procura por arrefecimento. A este respeito, o relatório da AIE demonstrou que, de 2016 a 2050, os graus-dia de arrefecimento irão aumentar, em média, 25,4 % em todo o mundo [11]. De acordo com a pesquisa realizada pela Central do Clima para observar o impacte das alterações climáticas, foram analisadas 242 cidades nos EUA e os graus-dia de aquecimento mostraram um aumento crítico em 96 % das cidades examinadas, desde a década de 1970 até ao presente [15]. Noutro estudo realizado em edifícios comerciais da Austrália, observou-se que a energia para arrefecimento vai aumentar entre 28 % e 59 % até 2070 [16]. Num outro estudo sobre este assunto, foram tomados como base edifícios residenciais e comerciais na Suíça. De acordo com os resultados obtidos, afirma-se que a energia de arrefecimento aumentará a uma taxa crítica de 223 % para 1050 % até 2100 [17].
No estudo realizado na Grécia, observou-se que a necessidade de arrefecimento em edifícios residenciais aumentará significativamente em 248 % até 2100 [7]. Os resultados obtidos na pesquisa conduzida na China indicam que haverá um aumento nas necessidades de arrefecimento. Estes aumentos foram calculados em aproximadamente 20,4 % em Pequim, 11,4 % em Xangai, 14,1 % em Hong Kong e 24,2 % em Kunming [6]. O estudo realizado no Canadá sustentou que a procura de energia para arrefecimento aumentará de 15 – 126 %, usando o cenário de dados climáticos futuros [4]. Um estudo realizado na Bélgica centrou-se na potencial mudança na procura de energia. De acordo com os resultados, prevê-se que a procura de energia para arrefecimento no parque edificado aumente de 39 % a 65 % na década de 2050 e 61 % a 123 % na década de 2090, em comparação com a década de 2010 [18]. De acordo com a pesquisa realizada em edifícios residenciais e cidades com diferentes características climáticas na Nova Zelândia, até 2090 as cargas de arrefecimento irão sofrer um aumento de 40 – 79 %. Entre as cidades estudadas (Auckland, Hamilton, Wellington, Rotorua, Christchurch e Queenstown), é esperado que Wellington experiencie o aumento mais significativo, com um aumento de 79 % na carga de arrefecimento [19].
Um outro estudo revelou um aumento substancial na procura por energia para arrefecimento, atingindo 255,1 %, e um aumento notável na probabilidade de sobreaquecimento, até 155 %, em edifícios residenciais típicos de Milão, a cidade mais populosa da zona climática italiana [20]. Em pesquisas realizadas em edifícios residenciais em quatro cidades diferentes do Japão, espera-se que a carga de arrefecimento anual aumente aproximadamente 12 % em Tóquio, 9 % em Toyohashi, 8 % em Osaka e 7 % em Nagoya [21]. Num estudo realizado numa moradia unifamiliar típica de Istambul, foi sustentado que, de acordo com o cenário climático A2, o consumo de energia para arrefecimento praticamente duplicou entre 2020 e 2080, atingindo 106,95 kWh/m² comparativamente aos 53,14 kWh/m² medidos em 2020 [22].
As pesquisas demonstram consistentemente que as alterações climáticas levarão a um aumento substancial na procura global de arrefecimento, embora com impactos variados entre as regiões. A vulnerabilidade dos sistemas de AVAC a estas mudanças continua a ser uma preocupação persistente.
Num estudo realizado num edifício residencial de vários andares na Suécia, foi sustentado que a procura anual para arrefecimento aumentou de 31 % para 63 % no cenário RCP4.5 e de 45 % para 73 % no cenário RCP8.5. Sublinha-se que, no final do século, serão observadas mudanças significativamente mais pronunciadas na procura anual para aquecimento e arrefecimento dos edifícios de acordo com o cenário RCP8.5 [23]. Num estudo realizado em edifícios residenciais de Taiwan, a utilização anual de energia para arrefecimento foi simulada para as décadas de 2020, 2050 e 2080. Os resultados indicaram aumentos de 31 %, 59 % e 82 % na energia para arrefecimento nesses três períodos de tempo, respectivamente. No entanto, foi sublinhado que essas taxas poderiam ser reduzidas, combinando várias estratégias passivas [24]. Num estudo realizado em Al-Ain, Emirados Árabes Unidos, que tem um clima quente, concluiu-se que num cenário de aquecimento da cidade de 5,9 °C, provavelmente aumentaria a energia para arrefecimento dos edifícios em aproximadamente 23,5 % [25].
As pesquisas demonstram consistentemente que as alterações climáticas levarão a um aumento substancial na procura global de arrefecimento, embora com impactos variados entre as regiões. A vulnerabilidade dos sistemas de AVAC a estas mudanças continua a ser uma preocupação persistente. À medida que as temperaturas globais aumentam e os eventos de calor extremo se tornam mais frequentes, os sistemas de AVAC ficam sujeitos a desafios, como o aumento da carga de trabalho, a diminuição da eficiência e o aumento dos custos operacionais. A crescente procura por arrefecimento não apenas sobrecarrega as reservas de energia, mas também amplifica as repercussões ambientais, incluindo o aumento das emissões de carbono e efeitos exacerbados das ilhas de calor urbanas. A abordagem a estes desafios exige estratégias de adaptação proactivas, abrangendo a adopção de tecnologias energeticamente eficientes, aprimoramento do projecto e do isolamento dos edifícios, e implementação de iniciativas de planeamento urbano destinadas a mitigar os efeitos da ilha de calor.
4.1 INFLUÊNCIAS DAS ALTERAÇÕES CLIMÁTICAS NOS REQUISITOS DE ENERGIA E UTILIZAÇÃO DO AC E EMISSÕES DE GASES COM EFEITO DE ESTUFA
A crescente procura por arrefecimento devido às alterações climáticas exige uma exploração mais profunda das suas repercussões ambientais. O ar condicionado, fundamental para manter o conforto no interior dos edifícios, opera numa escala que afecta significativamente o aquecimento global. Os fluidos frigorigéneos utilizados nos sistemas, como os hidrofluorocarbonetos (HFCs), possuem uma capacidade de reter calor na atmosfera em comparação com o CO2, amplificando o efeito de estufa. Além disso, a electricidade necessária para alimentar os aparelhos de ar condicionado é predominantemente gerada a partir de combustíveis fósseis, o que não só aumenta as emissões de carbono, mas também contribui para a poluição do ar e outras preocupações ambientais. Este duplo impacto sublinha a necessidade urgente de tecnologias de refrigeração sustentáveis, incluindo a adopção de sistemas energeticamente eficientes e avanços na gestão de fluidos frigorigéneos para mitigar as emissões de gases com efeito estufa e ainda a promoção de fontes de energia renováveis. Enfrentar estes desafios é essencial, não apenas para reduzir a pegada ambiental dos sistemas de refrigeração, mas também para mitigar a sua contribuição para a mudança climática global.
Actualmente, os aparelhos de ar condicionado e os ventiladores eléctricos consomem cerca de 20 % da energia total utilizada em edifícios a nível mundial. O consumo de energia para arrefecimento ambiente tem aumentado constantemente ao longo dos anos e a AIE prevê que a necessidade de energia para arrefecimento de espaços interiores quadruplicará até 2050 [11]. Em meados do século, o arrefecimento de espaços interiores irá representar 30 % a 50 % da carga eléctrica de pico em muitos países, potencialmente levando a falhas significativas na rede [11]. Globalmente, o consumo anual de energia para ar condicionado é de aproximadamente 1 milhão de milhões de quilowatts-hora (1012 kWh), o que excede o dobro do uso total de energia de todo o continente africano [26]. Estima-se também que, num futuro próximo, a energia necessária para o arrefecimento superará a do aquecimento em mais de dez vezes [26].
Estas tendências destacam a necessidade crítica de soluções de arrefecimento sustentáveis. A crescente dependência do ar condicionado não só coloca imensa pressão sobre os recursos energéticos, mas também exacerba impactes ambientais, incluindo maiores emissões de carbono e intensificação do efeito de ilha de calor. Para abordar estes desafios são necessárias estratégias de adaptação proactivas, as quais devem incluir a adopção de tecnologias eficientes do ponto de vista energético, melhorias no isolamento e concepção dos edifícios, e medidas de planeamento urbano que mitiguem o efeito das ilhas de calor. Tais medidas são cruciais não só para manter o conforto e a produtividade nos edifícios, mas também para reduzir a pegada ambiental global associada ao aumento da procura por arrefecimento num clima cada vez mais quente.
5. ABORDAGEM PREVENTIVA E POSSÍVEIS SOLUÇÕES
Uma vez que a procura de energia em edifícios é directamente influenciada por flutuações nas condições climáticas externas, estão a ser desenvolvidos esforços abrangentes de mitigação e adaptação para lidar com os profundos e significativos impactes das alterações climáticas. O grau em que esses efeitos são sentidos varia de acordo com os tipos de construção e zonas climáticas. Uma das principais áreas em foco é a implementação de estratégias passivas. Invidiata e Ghisi descobriram que as necessidades de arrefecimento em edifícios residenciais no Brasil podem ser reduzidas em 50 % com o uso de estratégias passivas, como isolamento térmico e sombreamento [5]. Da mesma forma, estudos sobre edifícios residenciais nos Emirados Árabes Unidos sugerem que as estratégias de isolamento térmico e massa térmica podem reduzir significativamente as necessidades de arrefecimento. Em Hong Kong, estratégias passivas eficazes levaram a uma redução na carga de arrefecimento em 56,7 – 64,5 % [27]. Estas estratégias são essenciais para diminuir o consumo de energia e melhorar a eficiência energética dos edifícios. As medidas passivas, como melhor isolamento, sombreamento optimizado, ventilação natural e materiais de cobertura reflexivos, desempenham um papel crucial na redução da dependência de sistemas de refrigeração mecânicos.
Além das estratégias passivas, a potencialização da eficiência das tecnologias existentes e o desenvolvimento de dispositivos amigos do ambiente também são vitais. De acordo com a AIE, as necessidades de arrefecimento podem ser reduzidas para metade se as unidades de ar condicionado forem substituídas por modelos de alto desempenho [11]. As tecnologias de arrefecimento a partir de fontes renováveis, particularmente aquelas que utilizam energia solar térmica e energia solar fotovoltaica, são soluções promissoras para regiões com arrefecimento em rápido crescimento. Os sistemas de arrefecimento urbano podem fornecer uma económica flexibilidade à rede eléctrica em áreas densamente povoadas e quentes [11]. A integração de sistemas para armazenar e utilizar energia solar nos edifícios pode reduzir significativamente o consumo global de energia.
Em Itália, a combinação de unidades de tratamento de ar com caldeiras de condensação a gás tem mostrado benefícios energéticos substanciais, particularmente em climas temperados. A integração de um gerador de calor de biomassa com uma eficiente caldeira de condensação a gás levou a uma economia de energia de até 30 %. No entanto, usar um sistema de bomba de calor ar-água em vez de biomassa resultou num aumento do consumo de energia, destacando a importância de se seleccionar a tecnologia adequada para condições climáticas específicas [28]. No Reino Unido, os estudos têm identificado os sistemas de bomba de calor solo-água como os mais adequados como solução primária de ar condicionado. Estes sistemas oferecem alta eficiência e podem reduzir significativamente o consumo de energia e as emissões em comparação com os sistemas tradicionais [29]. Além disso, integrando fontes de energia renováveis nos projectos dos edifícios, como energia solar e geotérmica, podem fornecer soluções sustentáveis de arrefecimento.
A combinação destas estratégias – medidas passivas, tecnologias eficientes e integração de energias renováveis – pode criar sistemas de edifícios resilientes e sustentáveis. Para responder à procura crescente de arrefecimento é necessária uma abordagem holística que considere os avanços tecnológicos e os princípios de concepção ambientalmente conscientes. Estas medidas são cruciais não só para manter o conforto e a produtividade nos edifícios, mas também para reduzir a pegada ambiental global associada ao aumento da procura de arrefecimento num clima cada vez mais quente. No entanto, as alterações climáticas afectam cada região em diferentes graus, de modo que uma profunda análise da vulnerabilidade climática por região é necessária antes de desenvolver estratégias de adaptação climática [30].
6. RESULTADO
Este estudo destaca o profundo impacte das alterações climáticas nos sistemas de AVAC e no desempenho energético dos edifícios. Com as temperaturas globais crescentes e os eventos climáticos extremos mais frequentes, a procura por arrefecimento de espaços interiores deve aumentar significativamente em várias regiões climáticas. Esta tendência não apenas sobrecarrega os recursos energéticos, mas também agrava os desafios ambientais, incluindo o aumento das emissões de carbono e o efeito de ilha de calor urbana. Para mitigar os impactos de forma eficaz, as medidas proactivas são essenciais. Estratégias passivas, como isolamento térmico, sombreamento, ventilação natural e materiais de cobertura reflexivos mostraram potencial substancial na redução das necessidades de arrefecimento. Além disso, o melhoramento da eficiência tecnológica dos sistemas de AVAC e a integração de fontes de energia renováveis emergem como soluções críticas. A substituição de unidades de ar condicionado por unidades de alto desempenho, utilizando sistemas solares térmicos e fotovoltaicos para arrefecimento, e a implementação de redes de arrefecimento urbano, oferecem caminhos promissores para reduzir o consumo de energia e aumentar a resiliência dos edifícios.
A integração destas estratégias – medidas passivas, tecnologias eficientes e energias renováveis – apresenta uma abordagem holística para construir resiliência contra os impactes das alterações climáticas. Ao adoptar estas medidas, as partes interessadas podem mitigar a procura de energia, promover a gestão ambiental e aumentar o conforto e bem-estar dos ocupantes diante de um clima em mudança. Em conclusão, os desafios colocados pelas alterações climáticas exigem colaboração entre formuladores de políticas, projectistas, engenheiros e operadores de edifícios. Priorizar a resiliência climática dos sistemas de AVAC e adoptar estratégias adaptativas irá contribuir para um ambiente construído capaz de navegar pelas complexidades de um mundo em efectivo aquecimento.
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