Sistemas solares térmicos no SCE

Sistemas solares térmicos no SCE

Artigo publicado originalmente na edição de Setembro/Outubro de 2024 da Edifícios e Energia.

No início de julho, fez 17 anos que entrou em funcionamento o SCE – Sistema Nacional de Certificação Energética e da Qualidade do Ar Interior nos Edifícios, no seguimento da transposição parcial para a ordem jurídica nacional da Diretiva n.º 2002/91/ CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, relativa ao desempenho energético dos edifícios.

Desde então, os regulamentos foram introduzindo alterações nas metodologias e tecnologias, bem como nos modelos da construção com intervenção técnica, num enquadramento transversal a todo o processo de edificação, por vezes, de forma mandatária no que diz respeito às soluções a aplicar na envolvente e em instalações técnicas.

Os mais antigos lembram-se do Decreto-Lei n.º 80/2006, de 4 de abril, designado RCCTE – Regulamento das Características de Comportamento Térmico dos Edifícios, no qual um edifício residencial pobre energeticamente, à luz dos modelos atuais, poderia obter classe A+ desde que fosse equipado com painéis solares térmicos para aquecimento de água sanitária.

O recurso a coletores solares térmicos nos edifícios (residenciais) era então obrigatório sempre que existisse uma exposição solar adequada, na base de 1 m2 de coletor por ocupante convencional previsto, conforme definido na metodologia de cálculo das necessidades nominais de energia para aquecimento de água sanitária. Nesta metodologia, o consumo de energia renovável, introduzido pelo sistema solar térmico, tinha um peso dez vezes superior ao das soluções passivas de consumo de energia e conforto térmico.

O Decreto-Lei n.º 118/2013 veio alterar completamente o negócio dos sistemas solares térmicos (SST), permitindo a substituição por bombas de calor termodinâmicas. Começou então o declínio do mercado dos SST e o exponencial aumento da utilização das bombas de calor.

Naquele tempo, os SST, apesar de serem fundamentais para uma boa classificação energética, eram mal amados, quer pelos arquitetos, em geral, que os viam como extremamente intrusivos nas obras de arquitetura, quer pelos organismos públicos que supervisionavam os processos de licenciamento urbanístico, principalmente nas zonas históricas com vista preponderante sobre os locais turísticos da cidade. Além disso, havia o obstáculo da necessidade de mão de obra especializada, que escasseava, e a questão de o antigo CAP, de avaliação de competências profissionais, ter sido colocado fora do sistema.

Entretanto, a metodologia de cálculo foi alterada. Os SST foram desvalorizados, assim como cerca de 70 % do edificado existente – incluindo o edificado licenciado ou construído entre 2006 e 2013.

Quem ainda se lembra do artigo do professor Maldonado publicado na revista Edifícios e Energia n.º 153, de maio/junho, pode fazer as contas e avaliar que, apesar de todos os simplex urbanísticos, a regulamentação tem ajudado muito pouco no que diz respeito ao bolso dos portugueses e ao direito constitucional à habitação.

Como tal, passaram a utilizar-se bombas de calor de dupla função, para aquecimento da água sanitária e climatização, que permitiam ultrapassar os limites regulamentares relativamente à etiqueta energética, bem como aos parâmetros de conforto.

Estamos, agora, no âmbito do Decreto-Lei último, de 7 de dezembro de 2020, que mudou outra vez tudo no SCE. Resumidamente, nos edifícios de habitação novos a classe mínima é A, o que significa que estes têm de consumir menos de metade da energia teórica regulamentar permitida anteriormente. Já no caso de edifícios de comércio e serviços a classe mínima é B, ou seja, estes edifícios têm de ter o correspondente a 75 % das necessidades energéticas, de acordo com a metodologia e os indicadores de referência.

Criaram-se, assim, novas oportunidades de negócio para os SST, assistindo-se a uma recuperação dos painéis solares térmicos, bem como das bombas de calor, em termos de posição no mercado – um mercado que, contudo, ainda tem de se adaptar, pois existe uma grande descoordenação entre a informação fornecida pelos fabricantes e a informação requerida pelos organismos oficiais que tutelam o cumprimento da legislação.

Para obtermos, atualmente, as classes regulamentares nos edifícios residenciais, temos geralmente as seguintes três soluções:

1 – Duplicar as espessuras dos isolamentos térmicos da envolvente;

2 – Implementar painéis solares térmicos ou fotovoltaicos associados a bomba de calor de alta eficiência de dupla função;

3 – Instalar duas bombas de calor de alta eficiência independentes para as duas referidas funções caso a exposição solar da cobertura não tenha viabilidade técnica.

Quem ainda se lembra do artigo do professor Maldonado publicado na revista Edifícios e Energia n.º 153, de maio/junho, pode fazer as contas e avaliar que, apesar de todos os simplex urbanísticos, a regulamentação tem ajudado muito pouco no que diz respeito ao bolso dos portugueses e ao direito constitucional à habitação.

Desde logo, os sistemas mistos de dupla função para produção simultânea de aquecimento de água sanitária e climatização têm de evoluir na informação de eficiência, de acordo com a norma europeia EN 16147, para a função de aquecimento de água sanitária e para a função de aquecimento e arrefecimento. O atraso nesta informação tem implicações no mercado, pois sempre que os painéis solares térmicos não têm viabilidade técnica (só são possíveis em orientação para o quadrante SE/SW, sudeste/sudoeste) surge a obrigação de instalar bombas de calor em duplicado. Esta situação é muito difícil de gerir na construção dos edifícios multifamiliares, uma vez que, além de provocar elevados custos acrescidos à construção, cria um problema logístico de espaço técnico, bem como limitações tecnológicas. Distâncias grandes entre as unidades interiores e as exteriores das bombas de calor obrigam a tecnologias mais evoluídas e mais caras.

Um dos atuais obstáculos à substituição generalizada de painéis solares fotovoltaicos está relacionado com a complexidade da metodologia de cálculo da energia renovável, e com custos acrescidos nos recursos técnicos.

Vemos, assim, que, apesar da evolução da tecnologia fomentada pelos fabricantes, que tem sido muito meritória em relação aos grandes desígnios do planeta e aos bolsos dos cidadãos, há a possibilidade de estes mesmos fabricantes poderem ser altamente prejudicados nos seus investimentos e nas suas evoluções tecnológicas devido a políticas públicas mal planeadas e mal desenvolvidas – políticas, muitas vezes, influenciadas por países estrangeiros com climas muito diferentes.

Infelizmente, em Portugal, os agentes do sector parecem estar pouco atentos à intrusão e ao condicionamento da tecnologia pela regulamentação.

Atualmente, pensamos que os SST estão novamente em declínio em face dos sistemas elétricos de captação solar fotovoltaicos, dado que estes últimos podem ser associados a sistemas de bombas de calor, bem como a outros usos, e são muito mais baratos, quer em custos de investimento inicial, quer em custos de exploração e manutenção. Mantêm-se, no entanto, os mesmos problemas em caso de orientação solar não adequada.

Um dos atuais obstáculos à substituição generalizada de painéis solares fotovoltaicos está relacionado com a complexidade da metodologia de cálculo da energia renovável, e com custos acrescidos nos recursos técnicos. Para o cálculo do contributo de energia renovável fotovoltaica, é necessário criar o perfil de carga da instalação, estabelecer necessidades de energia elétrica do edifício através da definição de perfil de consumo sazonal para as várias funções de climatização e aquecimento de água sanitária e distribuir a energia captada pelas diversas funções.

Adicionalmente, novos desafios e novas situações virão com as mudanças na esfera dos gases refrigerantes, com tendência para a utilização de gases naturais dada a proibição de hidrofluorcarbonetos que ultrapassem um potencial de aquecimento global de 150 em todos os produtos de refrigeração, ar condicionado e bombas de calor a partir de 2030. Virão também com a implementação da nova Diretiva n.º 2024/1275, de 24 de abril, cujos resultados se esperam mais eficientes em termos do consumo de energia e do bolso dos cidadãos.

As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.

Fotografia de destaque: © Shutterstock

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Carlos Oliveira

Presidente da ANPQ – Associação Nacional dos Peritos Qualificados.

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