O Complexo Interdisciplinar de Ciência e Engenharia (ISEC) da Northeastern University, em Boston, nos Estados Unidos, foi um dos vencedores COTE Top Ten Awards de 2019. O prémio, atribuído pela comissão do meio ambiente do Instituto Americano de Arquitectos (AIA), reconhece este projecto pela sua excelência em design e desempenho ambiental.

Todos os anos, desde 1997, o AIA atribui prémios a dez projectos, num programa já considerado como o mais conhecido do sector no que toca à excelência em design sustentável. Em 2019, um dos projectos distinguidos foi o ISEC, que faz parte do objectivo de longo prazo da Northeastern University de ligar o seu campus de Huntington Avenue a um novo bairro académico ao longo da Columbus Avenue.

Na última década, a Universidade de Northeastern tem fortalecido o campo da investigação, mas, para conseguir atrair investigadores internacionais, sentiu necessidade de investir em novas instalações. Assim, foi projectado este complexo, um espaço de última geração, com uma área bruta de cerca de 22 000 m2 e que alberga quatro disciplinas de investigação: engenharia, ciências da saúde, ciências puras e informática.

Fluxo e movimento definem a linguagem da forma deste Complexo que expande o campus da Northeastern University de Boston até ao Sul de um grande corredor ferroviário e reintegra dois bairros ecléticos que se situam próximos do campus: Fenway e Roxbury. Os sistemas de movimento dinâmico difundem-se pelo projecto e o formato do edifício está intrinsecamente associado a uma arquitectura de alto desempenho através da modelagem paramétrica e eficiência energética de modo a obter um design integrado.

O princípio orientador do edifício de seis andares é proporcionar ligações e colaborações que quebram divisões disciplinares. Está organizado como uma comunidade de professores vizinhos em redor do átrio, repleta de recantos e salas para conversas e estudos informais. Uma mistura de laboratórios húmidos, laboratórios secos e espaço computacional em cada andar oferece suporte a equipas de investigação interdisciplinares. Assim, os laboratórios de investigação e ensino, juntamente com instalações de apoio, salas de aula e espaços informais de aprendizagem, estão todos organizados em torno do grande átrio ligando física e visualmente as ciências. A organização em camadas do laboratório de investigação não cria apenas uma cultura interior vibrante dentro do edifício, mas também minimiza a utilização de energia, além de delimitar as áreas por zonas, para uma adaptabilidade futura. Um átrio cheio de luz do dia forma um novo espaço público à escala do campus, rodeado por espaços intimistas de colaboração. Além disso, actua simultaneamente como uma câmara de mistura para um sistema de ar em cascata para reciclar o ar em todo o edifício.

©WarrenJagger

A equipa do Payette, o atelier de planeamento e arquitectura de Boston responsável pelo projecto, refere que utilizou ferramentas de modelagem de energia para analisar o ganho de calor solar e moldar o edifício de forma a obter o melhor desempenho. As simulações interactivas, empregando modelagem paramétrica e software de composição personalizado, desenvolveram o sistema de sombreamento externo como parte integrante da forma geral do edifício. A precisão desse processo permitiu que o equipamento mecânico fosse dimensionado de forma a lidar com as cargas de aquecimento e arrefecimento bastante reduzidas. As metas agressivas e uma abordagem integrada de sustentabilidade foram incorporadas desde o planeamento, e ao longo de todo o processo, impactando tudo, desde a organização programática do edifício até à sua concepção.

De aparência fluida, o edifício é rigorosamente ajustado e os elementos de sombra que lhe conferem um carácter marcante são essenciais para o seu desempenho. O edifício potencia elementos passivos para reduzir a necessidade de energia e utiliza sistemas de recuperação de energia de alta tecnologia para reduzir ainda mais a sua utilização.

Sendo um edifício de investigação, o ISEC representa uma das mais altas tipologias de utilização energética, proporcionando uma oportunidade para realizar algumas das maiores economias de energia num único projecto. Ao planear o edifício, houve um esforço consciente para separar os programas de baixa utilização de energia dos espaços de investigação de alta utilização de energia.

As paredes envidraçadas permitem vistas desobstruídas, através dos espaços de investigação, ao mesmo tempo que diminuem o volume de espaço de investigação ventilado, reduzindo assim, drasticamente, a utilização de energia do complexo. O edifício é também climatizado por vigas arrefecidas activas, dissociando a ventilação do aquecimento e do arrefecimento, algo considerado fundamental para reduzir a utilização de energia nos espaços de investigação. Alavancando essa abordagem de alta/baixa utilização de energia, um sistema de ar em cascata reduz significativamente o ar novo necessário para os espaços de investigação. O ar é fornecido aos gabinetes que se encontram no perímetro, e estende-se passivamente para o átrio, que actua como uma câmara de mistura antes de passar para os laboratórios. Uma parede solar ao longo do lado Sul da cobertura pré-aquece o ar no inverno, enquanto um sistema de recuperação de calor de alta eficiência captura o calor saturado dos espaços de investigação. Os chillers heat recovery e as caldeiras de condensação abastecem os painéis radiantes, resultando numa redução de mais de 70 % na utilização de energia.

Fig.01: Sistema de cascata de ar.

A água seu aproveitamento e utilização também estiveram presentes na concepção deste projecto, tendo o edifício alcançado uma redução de 57 % na utilização de água, em relação ao padrão para este tipo de edifícios, com a utilização de canalizações de baixo fluxo e instalações e torres de arrefecimento de alta eficiência. Quanto às instalações de descarga, são abastecidas principalmente por um grande tanque que recolhe 99% da água da chuva que cai no telhado, representando aproximadamente 62 % das necessidades de descarga do edifício.

De modo a garantir o conforto dos ocupantes do edifício, o processo de design utilizou minuciosas ferramentas de projecto e simulação. A modelagem de CFD (Computational Fluid Dynamics) garantiu que os envidraçados triplos proporcionassem um ambiente interior confortável nos dias mais frios, sem necessidade de aquecimento suplementar. Garantiu também que as vigas arrefecidas não criariam áreas de desconforto nos espaços de investigação.

A análise da luz do dia verificou o desempenho das clarabóias do átrio, ajustando a sua orientação, de modo a minimizar o encadeamento, ao mesmo tempo que maximizou o seu potencial, de modo a alcançar mais de 80 % de autonomia da luz do dia no átrio. Este processo de design, orientado para o desempenho, juntamente com sistemas automatizados, como controlos da luz do dia e persianas, garantiu a este espaço o conforto e o controlo por parte dos seus utilizadores e ocupantes, num edifício adaptado ao seu meio ambiente.

Os espaços de trabalho informais do edifício são definidos pelas suas ligações com as pontes exteriores e parecidas com átrios, que orientam os estudantes e os investigadores dentro do edifício e do campus. Há também uma escada central de modo a que seja incentivada a sua utilização entre os andares. O átrio separa o típico edifício insular de investigação, revelando um ambiente interior vibrante, onde cada espaço tem vista tanto para o exterior como para a investigação. A transparência foi, aliás, um valor central do projeto, não apenas a nível arquitectónico mas também cultural, ao expor e celebrar desta forma a investigação.

A envolvente desenhada sob medida foi projectada para ir ao encontro dos requisitos de desempenho do projecto, garantindo que os elementos de alumínio reciclado fossem dimensionados de modo a usar a menor quantidade possível. A sua pré-fabricação além de ter garantido o controlo de qualidade, assegurou que qualquer resíduo fosse reciclado adequadamente.

A construção unitária prefabricada permitiu um trabalho eficiente no local e o mínimo desperdício numa envolvente que pudesse ser totalmente desconstruída e reciclada. Com base em simulações de fluxo de calor, o betão moldado no local, na base do edifício, foi projectado com isolamento integral e moldes de fibra de vidro, usando ferramentas de modelagem térmica para criar uma envolvente de alto desempenho com o mínimo de materiais utilitários.

Os tectos claros e abertos em madeira com certificação FSC (Forest Stewardship Council), em espaços públicos, criam um acabamento quente, ao mesmo tempo que mostram os sistemas acima do tecto. As nuvens acústicas, nos espaços de investigação, proporcionam uma superfície para reflectir a luz e controlar o som somente quando seja necessário.

©WarrenJagger

Concebido como estrutura flexível, o ISEC foi projectado para mudar e adaptar-se. A estratégia de planeamento da organização por zonas de intensidade energética proporciona uma base para futura adaptabilidade, garantindo que o edifício funciona com as estratégias integradas de economia de energia, conforme planeado. Os programas de alta utilização de energia podem ser colocados livremente na zona principal de investigação. Essa zona pode acomodar várias modalidades de investigação, desde pesquisas intensivas em produtos químicos a laboratórios pesados de instrumentação. As bancadas dos laboratórios móveis flexíveis são projectadas com ligações rápidas, montadas no tecto, de modo a que o espaço de investigação possa adaptar-se rapidamente às mudanças, tanto do tipo de investigação como de equipamento.

Após o edifício entrar em funcionamento, foi realizada uma avaliação pós-ocupação, em várias etapas: observações no local, entrevistas pessoais com os utilizadores do edifício e inquéritos personalizados tanto a professores como a funcionários. O foco desta avaliação foi adaptado às metas e atributos específicos do projecto, incluindo uma concepção que apoiasse os objectivos da instituição para o projecto, ocupantes que utilizassem o espaço, um design que apoiasse a experiência de aprendizagem e de investigação, ocupantes que maximizassem os benefícios dos sistemas do edifício e que contribuíssem para o envolvimento social no campus.

Como resultados, foi aferido que mais de 70 % dos entrevistados estão satisfeitos com o edifício. A maioria dos comentários refere que o prédio, especialmente o átrio cheio de luz, é impressionante e costuma ser usado para mostrar investigações aos visitantes. Os professores entrevistados gostaram muito de ter laboratórios e gabinetes próximos um do outro. A grande maioria dos comentários da avaliação elogiou a luz natural e a abertura em todo o edifício. Todos estão satisfeitos com os espaços de laboratório projectados para seus respectivos grupos.

O que diferencia este edifício?

Ernesto Peixeiro Ramos engenheiro mecânico e consultor               

No geral, o ISEC utiliza menos de 75 % da energia relativamente a um edifício de laboratórios de investigação típico graças a uma combinação de sistemas altamente eficientes:
O sistema de cascata de ar recupera o ar dos gabinetes e do átrio, transferindo-o para os laboratórios reduzindo a utilização de energia e também os custos, contrastando com os sistemas de AVAC dedicados vulgarmente utilizados.

Foram feitas análises de desempenho e ciclo de vida para optimizar a concepção da fachada, assegurando o conforto dos ocupantes e a eficiência energética. A parte Norte do complexo alberga os laboratórios de utilização intensiva de energia, sendo, por isso, o foco das melhorias térmicas; no lado Sul, onde os espaços de baixa utilização de energia se situam, vãos envidraçados triplos e um sistema de sombreamento combinam-se para maximizar a luz do dia enquanto minimizam a utilização de energia. O custo dos envidraçados triplos compensou em relação ao aquecimento perimetral. O sistema de sombreamento é constituído por alhetas de bronze curvas que se movem ao longo do bloco de gabinetes, ondulando-se no plano e divididas em elevação para criar uma forma livre.

A utilização de tecnologia das vigas arrefecidas activas para a insuflação do ar novo reduzem significativamente a utilização de energia comparativamente aos sistemas convencionais.
A recuperação de energia do ar de exaustão dos laboratórios é utilizada para o ar novo dos gabinetes ou laboratórios conforme as necessidades, optimizando o rendimento do sistema.

As baterias foram seleccionadas para minimizar a potência do motor e extrair tanta energia quanto seja utilizável antes que o ar de exaustão seja descarregado.

Para optimizar a eficiência do chiller e do sistema de aquecimento, foi instalado um chiller com recuperação de calor, que simultaneamente fornece água aquecida e água arrefecida. Isso reduz o tempo de funcionamento das caldeiras para o reaquecimento laboratorial nas estações de verão, primavera e outono, e para o pré-aquecimento dos sistemas de prodição de água quente sanitária para os laboratórios.

As necessidades de aquecimento do ar novo para o átrio são reduzidas pela utilização da parede solar que pré-aquece o ar utilizando a energia radiante do sol.