Artigo publicado originalmente na edição de Novembro/Dezembro de 2024 da Edifícios e Energia.

Serafin Graña, na qualidade de REHVA Fellow [1], título que lhe foi atribuído no ano 2019, e também por se manter desde há vários anos a acompanhar o Technical Research Committee (TRC)(2), enquanto membro da Ordem dos Engenheiros de Portugal (OEP), ora na qualidade de representante, de membro efetivo ou mais recentemente na de membro correspondente, disponibiliza adiante o texto completo do MANIFESTO REHVA, bem como outras reflexões complementares e subsequentes.

É imperioso olharmos para o que pensam e dizem os nossos parceiros. Todos aprendemos sempre muito com outros que possam estar mais avançados nos seus estudos e reflexões e que, ao mesmo tempo, se manifestem como defensores de mudança. O MANIFESTO REHVA é, do nosso ponto de vista, muito assertivo e será indispensável levar em linha de conta para a compreensão do futuro do setor de AVAC a nível europeu.

No dia 28 de maio, a Diretiva sobre o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD) entrou finalmente em vigor. No mesmo dia em que a REHVA (Federação Europeia das Associações de Aquecimento, Ventilação e Ar Condicionado) concluiu a redação do seu novo manifesto — MANIFESTO da REHVA para edifícios sustentáveis, saudáveis e acessíveis, o Pacto “Edifícios preparados para 2050”. O documento em questão sublinhava, desde logo, o papel crucial dos edifícios na prossecução dos objetivos de neutralidade carbónica da UE para 2050.

A MISSÃO DA REHVA … E COMO A UNIÃO FAZ A FORÇA!

A REHVA é uma organização que representa, a uma só voz, mais de 120.000 engenheiros de projeto de AVAC, engenheiros e técnicos de serviços de construção em 24 países europeus. A missão da REHVA é contribuir de forma consistente para o desenvolvimento de um ambiente construído económico, sustentável, seguro e saudável.

A REHVA apoia o desenvolvimento da qualidade ambiental interior (QAmbInt) e do desempenho energético dos edifícios (EPB) na UE. Relacionadas com as políticas da UE (EPBD, RED, EED, ESPR, etc.) e a sua implementação a nível nacional em cada país, as associações membros da REHVA desejam encorajar as forças políticas europeias a subscreverem os princípios técnicos propostos pelos peritos da REHVA para atingir os objetivos da UE para 2050 no setor da construção. Este é o objetivo do pacto Edifícios preparados para 2050.

O manifesto salienta a necessidade de uma abordagem holística, considerando os edifícios como produtores ativos de energia equipados com tecnologias inteligentes e sistemas de armazenamento de energia, contribuindo para a descarbonização do setor energético. Apela a uma “linguagem comum” europeia unificada, baseada em indicadores partilhados de desempenho energético e do ambiente interior.

De seguida, são resumidos vários tópicos cruciais que permitem ao setor da construção desempenhar o seu papel na prossecução dos objetivos da UE para 2050.

No mesmo dia, 28 de maio de 2024, a REHVA concluiu a redação do seu MANIFESTO REHVA para edifícios sustentáveis, saudáveis e acessíveis — o pacto Edifícios preparados para 2050. O documento em questão sublinhava o papel crucial dos edifícios na prossecução dos objetivos de neutralidade carbónica da UE para 2050.

O documento contém princípios-chave que se enaltecem e enumeram pela sua importância e abrangência:

1. Eficiência energética e energias renováveis: Dar prioridade à eficiência energética e à utilização de fontes de energia renováveis.

2. Sistemas descarbonizados: Implementar sistemas de aquecimento e arrefecimento descarbonizados e utilizar materiais de construção com baixo teor de carbono.

3. Qualidade do ambiente interior: Assegurar uma elevada qualidade ambiental e do ar interior.

4. Edifícios inteligentes: Promover a digitalização dos edifícios para melhorar a eficiência energética e o conforto dos ocupantes.

5. Soluções rentáveis: Defender soluções técnicas otimizadas em termos ambientais e rentáveis.

O manifesto salienta a necessidade de uma abordagem holística, considerando os edifícios como produtores ativos de energia equipados com tecnologias inteligentes e sistemas de armazenamento de energia, contribuindo para a descarbonização do setor energético. Apela a uma “linguagem comum” europeia unificada, baseada em indicadores partilhados de desempenho energético e do ambiente interior.

SAÚDE E QUALIDADE DO AR INTERIOR

Em consonância com o apelo do manifesto a uma abordagem holística da sustentabilidade dos edifícios, dando prioridade aos edifícios como contribuintes ativos para a eficiência energética, torna-se fundamental melhorar a qualidade do ar interior (QAI). Através da aplicação de medidas regulamentares ambiciosas e da atualização dos requisitos de conceção ecológica, a UE pode garantir ambientes interiores mais saudáveis.

HABITAÇÃO A PREÇOS ACESSÍVEIS E INCENTIVOS

À medida que os edifícios se transformam em produtores ativos de energia, a criação de um futuro sustentável exige uma renovação a preços acessíveis e um incentivo a práticas energeticamente eficientes. Ao fornecer aos proprietários apoio técnico e incentivos financeiros, a transição para edifícios mais ecológicos pode ser adotada por todos, garantindo um ambiente de vida mais saudável e sustentável.

O PAPEL DOS PROFISSIONAIS DE AVAC

Com os edifícios na vanguarda da transição energética, os profissionais de AVAC desempenham um papel crucial. Através do desenvolvimento profissional contínuo e da adesão a normas comuns da UE, podem liderar o processo de eficiência energética e sustentabilidade, garantindo que os edifícios cumprem os critérios de desempenho energético e de ambiente interior.

O Manifesto foi então enviado aos principais candidatos dos principais partidos que concorreram às eleições para o Parlamento Europeu, a fim de obter a sua aprovação e avaliar quais os partidos que estão dispostos a apoiar os esforços da REHVA em prol de uma UE mais saudável e mais eficiente.

O TEOR DO MANIFESTO [3]

Seguidamente, estão resumidos vários tópicos cruciais que permitem ao setor da construção desempenhar o seu papel na prossecução dos objetivos da UE para 2050.

Princípios do Pacto – Para edifícios sustentáveis, saudáveis e acessíveis

Os edifícios devem proporcionar proteção, por um lado. Devem garantir um ambiente interior saudável, confortável e seguro. Por outro, o setor dos edifícios deve desempenhar um papel fundamental para alcançar a neutralidade carbónica da UE até 2050. É por isso que a REHVA defende o pacto Edifícios preparados para 2050, assente nos seguintes princípios fundamentais, tanto para as novas construções como para as renovações em curso:

• Eficiência energética em primeiro lugar;

• Utilização prioritária de fontes de energia renováveis;

• Sistemas de aquecimento e arrefecimento descarbonizados (incluindo a incorporação de materiais de construção com baixo teor de carbono);

• Obtenção de uma elevada qualidade ambiental interior (QAmbInt) e qualidade do ar interior (QAI);

• Digitalização dos edifícios (edifícios inteligentes);

• Soluções técnicas rentáveis e otimizadas do ponto de vista ambiental.

Estes princípios devem ser aplicados de forma holística aos edifícios, contribuindo para o bem-estar dos ocupantes e salvaguardando o seu conforto, enquanto reduzem significativamente o impacte ambiental durante todo o ciclo de vida do edifício. Os edifícios já não são apenas consumidores de energia, mas também produtores ativos de energia. Equipados com tecnologias inteligentes e sistemas de armazenamento de energia para calor e eletricidade, estes edifícios proporcionarão flexibilidade às redes de distribuição de energia, contribuindo para a transição e descarbonização do setor da energia.

A REHVA defende e trabalha especificamente para definir uma “linguagem comum” europeia, baseada em indicadores comuns, para o desempenho energético e sanitário do ambiente interior dos edifícios. Devido à crescente complexidade do setor da construção, é necessário encontrar uma compreensão mútua e proporcionar uma educação intensiva a todos os grupos-alvo e partes interessadas.

Neutralidade de carbono para o setor da construção em 2050

O setor da construção é responsável por 37 % das emissões de carbono da UE. Atingir a neutralidade carbónica em 2050 é um objetivo ambicioso para o setor da construção. A descarbonização dos sistemas de aquecimento e arrefecimento é fundamental.

A neutralidade carbónica inclui todas as fases do ciclo de vida de um edifício (produção de elementos de construção, o seu transporte, construção do edifício, utilização, substituição, desconstrução, gestão de resíduos, reutilização, reciclagem e eliminação final) e todas as emissões de gases com efeito de estufa no local de construção, no estaleiro, nas proximidades e à distância.

As diretivas e regulamentos europeus, bem como a sua transposição a nível nacional e regional, devem ser “baseadas no desempenho”. Devem ser tecnologicamente neutras, permitindo a otimização das soluções técnicas pelos profissionais da construção e criar condições equitativas para o equipamento técnico e para os fornecedores de energia.

Edifícios saudáveis – melhor ambiente interior e qualidade do ar interior (QAmbInt) / (QAI)

A necessidade de uma qualidade do ar adequada não se limita à nossa porta, mas inclui também o ar que respiramos dentro de casa – onde passamos até 90 % da nossa vida quotidiana. O ar no interior dos edifícios está ainda mais seriamente poluído do que o ar exterior[4]. De acordo com a OMS[5], 150 000 mortes prematuras na Europa são causadas anualmente pela má qualidade do ar interior, gerando custos adicionais de mais de 260 mil milhões de euros por ano.

Esta questão deve ser abordada com urgência, assumindo o desafio que representa para a saúde e permitindo assim grandes poupanças e a otimização da despesa pública.

As políticas da UE devem salvaguardar a melhoria da saúde nos edifícios, associada a uma melhor QAmbInt/QAI, através de evoluções regulamentares que assegurem uma transposição tão ambiciosa quanto possível da EPBD, em especial no que respeita à ventilação. Melhorar a monitorização, a visualização e a regulação da QAI nos edifícios residenciais e o alargamento da inspeção dos sistemas de ventilação a todos os edifícios, devem fazer parte destas políticas.

A informação sobre os benefícios da renovação, em termos de bem-estar e de retorno económico, deve ser a chave para motivar os proprietários e/ou investidores privados. Os profissionais da construção devem propor e explicar a melhor solução aos proprietários e ocupantes dos edifícios.

Os requisitos para que os edifícios garantam a qualidade do ar interior devem ser integrados na taxonomia e na legislação relativa aos contratos públicos ecológicos.

Os requisitos de conceção ecológica devem ser atualizados para garantir a colocação no mercado de produtos de ventilação energeticamente eficientes.

Para obter uma melhor informação e feedback, o observatório do parque imobiliário deve também integrar dados sobre a qualidade do ar interior e de ventilação.

Habitações a preços acessíveis e incentivos

A renovação, exploração e manutenção de edifícios a preços acessíveis, a compreensão e o acordo sobre as soluções propostas desempenham um papel crucial na aceitação social da transição energética. Não existe uma solução única para todos os edifícios novos e existentes. A informação sobre os benefícios da renovação, em termos de bem-estar e de retorno económico, deve ser a chave para motivar os proprietários e/ou investidores privados. Os profissionais da construção devem propor e explicar a melhor solução aos proprietários e ocupantes dos edifícios.

A pobreza energética deve ser abordada através de incentivos/medidas financeiras específicas que permitam às famílias com baixos rendimentos melhorarem as suas casas. Isto não só reduz o consumo de energia e os custos, mas também melhora as condições gerais de vida, a saúde e o bem-estar dos residentes e promove a aceitação social e o apoio a práticas de vida sustentáveis.

As seguintes ações devem ser implementadas:

• os proprietários de imóveis devem receber assistência técnica financiada, também através de balcões únicos (tais como auditorias energéticas ou passaportes de renovação) para facilitar a tomada de decisões informadas;

• o acesso ao capital deve ser facilitado, através de medidas como as hipotecas ecológicas, tal como solicitado no Artigo 17 da EPBD;

• os incentivos financeiros devem basear-se no desempenho, não favorecendo ou excluindo nenhuma solução técnica se os requisitos de desempenho forem cumpridos.

A combinação de iniciativas de habitação a preços acessíveis com incentivos é uma estratégia crucial para promover simultaneamente a igualdade social e a responsabilidade ambiental, preservando os fundos públicos que, dada a sua escassez, devem ser otimizados e cuidadosamente geridos para combater eficazmente a pobreza energética e apoiar a transição energética.

O papel dos profissionais do setor do AVAC na transição energética – competências adquiridas e dimensão europeia no âmbito da UE

O papel dos profissionais do setor do AVAC na transição energética é fundamental. Os novos desafios exigem o desenvolvimento de novas competências técnicas e uma compreensão das políticas energéticas abrangentes da UE.

O desenvolvimento profissional contínuo é essencial, uma vez que mantém os profissionais atualizados com os últimos avanços tecnológicos e alterações regulamentares. Entre as numerosas referências à formação e melhoria de competências e à requalificação, o artigo 17.º da EPBD exige que os Estados-Membros promovam a educação e a formação para garantir uma mão de obra suficiente e competente, especialmente dirigida às PME e às microempresas. O papel dos profissionais do setor do AVAC na transição energética é fundamental. Os novos desafios exigem o desenvolvimento de novas competências técnicas e uma compreensão das políticas energéticas globais da UE.

As colaborações de investigação entre o meio académico e a indústria do AVAC devem ser incentivadas através de centros de inovação, centros de investigação e projetos de colaboração para definir novos programas educativos que abordem os principais desafios, impulsionem a inovação e atraiam novos estudantes.

As normas para os sistemas AVAC desempenham um papel fundamental para facilitar a mobilidade e o reconhecimento das qualificações nos Estados-Membros. As normas garantem que os profissionais de AVAC em toda a UE têm conhecimentos e um conjunto de competências coerentes. Ao aderir a normas comuns da UE, os profissionais do setor do AVAC podem contribuir eficazmente para a transição energética, otimizando os sistemas em termos de desempenho e sustentabilidade.

A partilha de metodologias para avaliar o edifício, baseadas em normas comuns da UE, promove a transparência, a tomada de decisões informadas e a coerência na aplicação da transição energética. A partilha de conhecimentos e o desenvolvimento de metodologias e ferramentas partilhadas podem conciliar as diferenças entre os Estados-Membros devido a fatores económicos, tecnológicos e sociais, respeitando simultaneamente a diversidade cultural e a equidade social.

Embora sejam utilizados métodos comuns, os níveis de exigência nacionais devem refletir as necessidades climáticas e regulamentares específicas de cada país. Esta abordagem harmonizada apoia um esforço unificado em toda a Europa, impulsionando a transição energética e promovendo simultaneamente uma mão de obra qualificada e motivada dedicada à gestão ambiental.

Bibliografia:

[1] https://www.rehva.eu/about-us/fellows

(2) https://www.rehva.eu/about-us/committees/technology-and-research-committee-trc

[3] https://www.rehva.eu/news/article/rehva-manifesto-for-sustainable-healthy-and-affordable-buildings

[4] https://sustainenvironres.biomedcentral.com/articles/10.1186/s42834-020-0047-y

[5] https://unece.org/DAM/Photos_Info_Unit/Economic-cost-health-impact-air–pollution-en_1_.pdf

Fotografia de destaque: © Pexels

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