Este editorial foi originalmente publicado na edição nº 156 da Edifícios e Energia (Novembro/Dezembro 2024).

Na edição da revista Edifícios e Energia deste mês de Novembro abordamos o tema da nova Directiva sobre o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD) numa perspectiva diferente. O sector da construção e dos materiais entra definitivamente na área da energia. As componentes dos aspectos construtivos e das soluções passivas andaram entre os pingos da chuva durante muito tempo, sem lhes darmos a devida atenção. Interessava a operação, a classe energética, e os equipamentos iam resolvendo tudo, sobretudo nos edifícios de serviços e grandes edifícios. No sector residencial, o caminho foi mais pacífico.

Agora, tudo vai ser diferente com a introdução desta nova EPBD e com a sua transposição para a regulamentação nacional. Não há como fugir. Tudo passa a entrar na contabilidade para o desempenho energético dos edifícios e o drive são as emissões de CO2 na operação, nos equipamentos ou nos materiais. A energia incorporada num tijolo, numa tinta ou em todos os componentes de um chiller, por exemplo, vão estar em cima da mesa na fase de projecto e, nessa fase, arquitectos e engenheiros terão de trabalhar em conjunto. Depois, prevê-se que a construção entre com força e com estrondo: a sustentabilidade energética e ambiental que se ambiciona vai depender ainda mais deste sector. É curto olhar apenas para uma parte da sustentabilidade na área dos edifícios. A operação, a utilização, a eficiência energética ou a produção própria via renováveis são peças importantes, determinantes, mas faltava alargar a abordagem. Faltava olhar para toda a cadeia, desde a origem dos materiais e componentes, até ao ciclo de vida de todo o edifício.

Energia incorporada, circularidade, edifícios de emissões nulas e eficiência energética são as palavras-chave desta nova abordagem. Entendidos o conceito e a ambição, importam agora muitas outras coisas, nomeadamente, o que está, de facto, em causa, o impacto que a nova EPBD vai ter nos vários sectores de actividade, como poderão ser definidas as metodologias e saber se estamos preparados.

Na edição Nº156 da revista, tentamos responder a algumas destas questões. Percebemos que as Declarações Ambientais de Produto vão ser peças importantes da engrenagem e vão passar a integrar todas as informações relevantes sobre os materiais de construção. O passaporte digital dos produtos vai ser essencial neste processo. E o sector da construção está preparado para dar resposta a estas ambições, como nos refere Manuel Reis Campos, presidente da CPCI – Confederação Portuguesa da Construção e do Imobiliário – e da AICCOPN – Associação dos Industriais da Construção Civil e Obras Públicas na entrevista de fundo. Percebemos que o sector da construção vai ter de investir, de se adaptar e modernizar. O risco está nas pequenas e médias empresas (PME), que poderão ficar de fora. A indústria parece estar alinhada e o crivo da diferenciação poderá ser cruel para os pequenos fabricantes.

Esta é uma parte do problema, outra está na estratégia que será adoptada do lado da engenharia, da arquitectura e da partilha da informação. É importante saber como se vão fazer as contas, quais as metodologias de cálculo, a harmonização das várias peças, que tipo de fiscalização vai existir ou como vai ser sistematizada toda a informação necessária para todos estes processos. Numa recente edição da nossa revista, identificámos as duas maiores fragilidades para a execução desta directiva: o dinheiro que é necessário e as metas, porventura irrealistas, que nos são apresentadas.

Estamos todos de acordo, “esta nova EPBD é bem-vinda”, como nos explica Eduardo Maldonado em mais um texto de opinião magistral. A bondade da EPBD não está em causa. O que está em causa é a forma como a vamos implementar. Um salto desta dimensão pressupõe enormes dificuldades ou mesmo impossibilidades. Segundo a ELPRE – Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios, vão ser precisos 143 mil milhões de euros para reabilitar energeticamente 100 % do nosso parque edificado (residencial, não residencial, público e privado) até 2050. A prioridade estará nos edifícios com pior desempenho e no combate à pobreza energética. Conseguem imaginar a aventura?