Este artigo foi originalmente publicado na edição nº 154 da Edifícios e Energia (Julho/Agosto 2024).

O tempo já começou a contar. Descarbonizar os edifícios até 2050 e pôr a andar as ambições de Bruxelas não vai ser uma tarefa fácil. Temos pouco tempo e é preciso muito dinheiro! Todos os componentes, materiais de construção ou sistemas serão contabilizados nesta corrida às emissões nulas. A qualidade do ar interior ganha nova vida, mas as incertezas são muitas. Conheça o que está em causa com a nova directiva para os edifícios.

Depois de quase dois anos intensos de negociações, alterações aos textos originais e muitas dúvidas, a Directiva sobre o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD) é finalmente publicada e os Estados-Membros têm até 1 de Janeiro de 2026 para criar a legislação nacional adequada. Desta vez não chega ajustar ou actualizar metodologias com base em novas metas ou orientações. Esta EPBD traz muitas novidades e descarbonizar os edifícios num tão curto espaço de tempo vai ser uma missão muito difícil.

Nesta fase de alguma apreensão quanto à forma como serão conduzidos os trabalhos, importa olhar para o essencial. Os países da União Europeia (UE) terão de definir um plano de acção demasiado ambicioso para a renovação dos seus edifícios, o que exige pouco tempo, muito dinheiro e a intervenção do Estado. Uma impossibilidade é como alguns especialistas vêem as metas estabelecidas, porventura a maior fragilidade deste documento. Na dimensão ambiental da energia, a nova EPBD quer ser um farol para os países da UE em matéria de construção sustentável; e com ela vai começar, finalmente, uma nova forma de olhar e abordar o projecto, a construção e os materiais. Uma boa notícia. Esta revisão aponta para uma mudança de paradigma situando o foco na utilização real da energia, reconhecendo o papel preponderante dos utilizadores e da energia incorporada nos edifícios. Recorde-se que até 2009 estávamos centrados na eficiência do lado da utilização da energia e o objectivo era conhecer o melhor possível o consumo real dos edifícios. Com a revisão da EPBD em 2010 e a transposição em 2013, o foco passou para a classificação energética e a principal crítica está justamente na perda de importância da utilização real da energia, que deixou de interferir na obtenção da classe energética.

Incluir os edifícios na estratégia de descarbonização da economia era uma medida esperada e necessária. A questão está em saber quais vão ser as metodologias, as ferramentas ou a partilha de informação para lá chegar. A falta de conhecimento sobre os produtos e materiais de construção quanto às suas características (pegada carbónica) ou a necessária criação de um sistema uniforme europeu podem ser uma tarefa herculana, que pode comprometer os prazos e as metas de Bruxelas.

Qualquer processo de transposição de uma directiva implica um trabalho técnico de fundo, como sabemos; nomeadamente o envolvimento do sector e dos especialistas, a que se junta uma reflexão sobre o trabalho anteriormente feito, um balanço e muitos outros aspectos indispensáveis à elaboração de um documento que, no caso dos edifícios e da EPBD, irá regular uma enorme fatia da nossa economia e causar um impacto muito significativo na saúde, no bem-estar dos cidadãos e no combate à pobreza energética.

Desta vez, as variáveis são muitas e o processo é muito mais complexo do que uma mera actualização de requisitos e metodologias de cálculo para a promoção das renováveis, do desempenho energético dos edifícios ou do conforto térmico. Esta directiva vai mais longe. Uma das suas características é a amplitude em termos de integração de conhecimento e especialidades, o que implica o envolvimento das empresas e da indústria dos sectores da construção e do ambiente. Este alargamento para fora das fronteiras da engenharia, da arquitectura e da gestão dos edifícios nos seus vários domínios (como os conhecemos hoje) cria um mercado mais diversificado, mas também uma maior responsabilidade na comunicação e nas regras que vão ser definidas.

QUALIDADE DO AR INTERIOR

A saúde volta a saltar para a ribalta e a qualidade do ar interior e a do ambiente interior ganham uma abordagem diferente. Pela primeira vez, a EPBD define normas para a qualidade do ambiente interior e mandata os Estados-Membros para que as estabeleçam. Num recente manifesto promovido por várias associações europeias, entre as quais a Eurovent e a REHVA – Federação Europeia das Associações de Aquecimento, Ventilação e Ar Condicionado, é proposto garantir “que o acesso a ar de boa qualidade, incluindo o ar interior, se torne num direito humano básico, introduzindo as adaptações que forem necessárias nos Tratados Europeus e na Carta dos Direitos Fundamentais, se tal for preciso”. Os signatários do documento, intitulado A boa qualidade do ar interior deve tornar-se um direito humano básico, congratulam-se agora com a novidade das inspecções obrigatórias dos sistemas de ventilação.

Para a REHVA, as políticas da UE devem salvaguardar a melhoria da saúde nos edifícios. Para o efeito, esta associação aponta para a necessidade de um processo evolutivo em termos regulamentares que assegure uma transposição “tão ambiciosa quanto possível” da EPBD, em especial no que respeita à ventilação. Na prática, essas políticas devem assegurar uma melhor monitorização, visualização e regulação da qualidade do ar interior nos edifícios residenciais e o alargamento da inspecção dos sistemas de ventilação a todos os edifícios (ver página 18).

Segundo a EPBD, numa tentativa de definição, a qualidade do ar interior pode descrever-se como “o resultado de uma avaliação, realizada no interior de um edifício, das condições que influenciam a saúde e o bem-estar dos ocupantes desse edifício, com base em parâmetros como os relacionados com a temperatura, a humidade, a taxa de renovação do ar e a presença de contaminantes”. Neste sentido, a próxima legislação portuguesa vai ter obrigatoriamente de considerar, no seu Plano Nacional de Renovação de Edifícios, que “o estabelecimento de requisitos mínimos de desempenho energético deve ter em conta os níveis óptimos de qualidade do ambiente interior, a fim de evitar possíveis impactos negativos como uma ventilação inadequada, e as condições locais, a utilização a que se destina o edifício e a sua idade”.

ZERO CARBONO!

Alcançar a neutralidade carbónica até 2050 em todo o espaço europeu passa, necessariamente, por atacar os edifícios responsáveis por 40 % do consumo de energia final e 36 % das emissões de gases com efeito de estufa. O foco está nos edifícios com emissões nulas, o que significa que todos os seus componentes deverão ser avaliados. Estamos a falar de equipamentos, sistemas, mas também de materiais de construção. Ou seja, todo o ciclo de vida do edifício vai contar na contabilidade das emissões e é por isso que há quem defenda que o “primeiro traço” do edifício já não se vai poder fazer sem a engenharia. A concepção a quatro mãos poderá ser uma das consequências positivas e acelerar uma mais estreita colaboração entre a arquitectura e a engenharia.

Edifícios ‘carbono zero’ é a grande meta desta directiva e com ela surge uma nova abordagem aos edifícios. Já não chega pensar apenas na térmica e na operação dos edifícios. Descarbonizar o edificado significa alargar as intervenções dentro e também para fora, para as cidades, para os bairros e para todos os processos do lado da construção e da economia. “Os edifícios são um reservatório de materiais significativo, constituindo depósitos de recursos ao longo de muitas décadas, e as opções de concepção e a escolha de materiais influenciam de sobremaneira as emissões de todo o ciclo de vida dos edifícios novos e dos edifícios renovados”, lê-se na nova EPBD. E, por isso, os cálculos do desempenho energético dos edifícios vão passar a ter em conta novos parâmetros como a energia ou as emissões incorporadas nos materiais, por exemplo. Os próximos certificados energéticos vão passar a ter essa informação!

A utilização eficiente e circular dos recursos ou o efeito da ilha de calor urbana são factores que vão saltar para os estiradores de projecto muito rapidamente. É que “as medidas destinadas a melhorar o desempenho energético dos edifícios deverão ter em conta as condições climáticas, incluindo a adaptação às alterações climáticas, e as condições locais, bem como o ambiente interior e a relação custo-eficácia”.

Todo o ciclo de vida do edifício vai contar na contabilidade das emissões e é por isso que há quem defenda que o “primeiro traço” do edifício já não se vai poder fazer sem a engenharia.

É neste contexto que aparece e se define o PAG, o novo indicador referente ao potencial de aquecimento global de todo o ciclo de vida do edifício. “Este indicador agrega as emissões de gases com efeito de estufa incorporadas nos produtos utilizados na construção e as emissões directas e indirectas na fase de utilização.” A obrigatoriedade de cálculo do PAG amplia a preocupação do desempenho dos edifícios para todo o ciclo de vida e incorpora a dimensão da economia circular, neste caso, da reutilização de materiais e produtos. Os Estados-Membros deverão poder definir requisitos mínimos para o desempenho energético dos edifícios e também dos seus elementos construtivos. Uma dor de cabeça? Como vamos ser capazes de o fazer?

São muitas as perguntas que ainda não têm resposta. Esta visão para os edifícios “com necessidades residuais de energia, emissões nulas de carbono provenientes de combustíveis fósseis no local e emissões operacionais de gases com efeito de estufa nulas ou muito reduzidas” vem trazer novos desafios e muitas dificuldades. Os planos a desenvolver pelos Estados-Membros deverão considerar as diferentes realidades para se alcançar esta visão, bem como estratégias diferenciadas para os edifícios novos ou para as grandes renovações. Se, por um lado, já existe um conhecimento sobre aquilo que é necessário corrigir no Sistema de Certificação Energética ou nas metodologias associadas, por outro, a componente da construção é um mundo novo que se abre na vertente das emissões.

MUITA AMBIÇÃO

A publicação da directiva sai atrasada e com várias alterações em relação ao texto original. O excesso de ambição poderá vir acompanhado dum excesso de fragilidades, o que nos leva a questionar se seria possível construir um outro caminho. Como vamos atingir a neutralidade carbónica nos edifícios europeus até 2050 e nos novos já em 2030?

A Vaga de Renovação, criada em 2020 no âmbito do Pacto Ecológico Europeu, inclui “um plano de acção com medidas regulamentares e financeiras específicas, que visam, pelo menos, duplicar a taxa anual de renovação energética dos edifícios até 2030 e promover renovações profundas, o que conduzirá à renovação de 35 milhões de fracções autónomas até 2030 e à criação de postos de trabalho no sector da construção”. O objectivo, como sabemos, é alcançar a neutralidade climática em toda a economia até 2050 e reduzir as emissões em 55 % (em relação a níveis de 1990) até 2030.

O pacote legislativo Fit for 55, com esse objectivo, indica os caminhos na área da eficiência energética e direcciona para um conjunto de medidas enquadradas no plano REPowerEU, com vista ao desempenho energético dos edifícios, à promoção das energias renováveis e ao caminho da transição para a descarbonização dos edifícios. Ou seja, estes temas não são novos e faltava apenas a directiva que os enquadrasse quanto às linhas orientadoras e às metodologias para lá chegar.

Sucede que pelo caminho ficam aspectos muito importantes. As metas intermédias que existiam e que deveriam comprometer os Estados-Membros já não constam deste documento final. E, passados quatro anos, as acções já desencadeadas para a descarbonização dos edifícios europeus estão muito aquém do esperado: 75 % do parque imobiliário é ineficiente e a taxa anual de renovação energética tem-se mantido em 1 %. Ou seja, começamos quase do zero. “Ao ritmo actual, a descarbonização do sector dos edifícios demoraria vários séculos”, lê-se nesta nova directiva.

Sem uma vaga massiva que aposte na reabilitação energética e sem financiamento não chegamos lá!

Dificuldades relacionadas com a inviabilidade económica das propostas para a renovação do parque edificado europeu são apontadas como as causas do atraso de quase dois anos na publicação da EPBD. No entanto, a directiva está cá fora e com a mesma ambição. As metas são as mesmas, mas a forma de cumpri-las está agora nas mãos dos Estados-Membros.

Portugal terá de criar as condições financeiras para a renovação dos seus edifícios e no prazo apresentado, ou seja, até 2050. Para os edifícios novos, temos menos tempo. As novas regras deverão estar a ser cumpridas já em 2030, daqui a seis anos. Se tivermos em conta que a transposição só será feita em 2026, restam-nos menos de três anos.

“Todos os novos edifícios devem ser neutros em termos climáticos a partir de 2030. Os edifícios ocupados pelo Estado ou sob sua propriedade terão de cumprir esta norma já em 2028.” Ou seja, o Estado terá de dar o exemplo – uma estratégia já ensaiada na primeira revisão da EPBD, em 2010, e que em Portugal não saiu da gaveta. O Programa de Eficiência de Recursos na Administração Pública (ECO.AP) regressou, depois, com um novo modelo em 2020 e com metas para 2030 que passam pela redução de 40 % dos consumos de energia primária, pela promoção do autoconsumo (10 %) ou pela contribuição para o alcance de 5 % de taxa de renovação energética e hídrica de edifícios do Estado (ver página 22). Agora, a ambição é completamente diferente e o tempo é escasso. Será que o Estado português consegue dar o exemplo?

DINHEIRO! É PRECISO MUITO DINHEIRO!

De acordo com a directiva, “os Estados-Membros devem apresentar uma descrição das medidas financeiras, bem como das necessidades de investimento e dos recursos administrativos, com vista à execução dos seus planos de renovação de edifícios nacionais”. Mas como fazê-lo? É que esse trabalho, para ser rigoroso, exige uma “fotografia” do parque edificado nacional. Será que sabemos o que temos de fazer? Os mais de 2,5 milhões de certificados energéticos têm muitas variáveis e informação, mas será que caracterizam o parque nacional de mais de seis milhões de habitações? Depois, temos a questão das medidas de melhoria identificadas pelos Peritos Qualificados. Será que podem ser todas executadas tecnicamente?

Seja como for, temos de apresentar um plano e uma estratégia de financiamento. E o financiamento poderá ser, porventura, o calcanhar de Aquiles desta estratégia europeia. É que para atingirmos estas metas não chega a ambição; é preciso muito dinheiro! As palavras-chave do documento procuram dar algumas respostas, mas serão suficientes? Apoiar, garantir o financiamento, incentivar ou promover são algumas delas.

Estes apoios devem ser agilizados e garantidos pelos Estados-Membros através de benefícios que estimulem o volume ou a profundidade das intervenções ao nível dos bairros, por exemplo, ou as soluções industriais que apontem para elementos pré-fabricados (outro exemplo). De acordo com a nova directiva, “a introdução de normas mínimas de desempenho energético deverá ser acompanhada de um quadro facilitador que inclua assistência técnica e medidas financeiras, nomeadamente para os agregados familiares vulneráveis”, e, para isso, é considerado que, em matéria de financiamento, “os Estados-Membros podem conceder auxílios estatais à renovação de edifícios para que estes cumpram as normas de desempenho energético ao nível da União, até que essas normas se tornem obrigatórias. Daí em diante, os Estados-Membros podem continuar a conceder auxílios estatais para a renovação de edifícios e fracções autónomas abrangidos pelas normas de desempenho energético a nível da União, desde que as obras de renovação de edifícios visem alcançar uma classe de desempenho energético superior”.

O acesso ao financiamento é um dado crucial e, para esse efeito, os mecanismos de Recuperação e Resiliência são muito importantes. Tudo indica que os instrumentos financeiros da UE “poderão desempenhar um papel importante no desenvolvimento de fundos, instrumentos e mecanismos de eficiência energética nacionais, regionais e locais, que ofereçam essas possibilidades de financiamento aos proprietários privados, às pequenas e médias empresas e às empresas de serviços energéticos”.

Sucede que é sobre os Estados-Membros que irá incidir o maior esforço na promoção de soluções junto das instituições financeiras – em conjunto, terão de funcionar como catalisadores do investimento necessário. As medidas deverão apontar para “o incentivo à concessão de empréstimos hipotecários para renovações que melhorem a eficiência energética de edifícios certificados, [e para] a promoção de investimentos dos organismos públicos num parque imobiliário eficiente em termos energéticos, por exemplo, através de parcerias público-privadas ou contratos de desempenho energético ou da redução do risco percepcionado dos investimentos”.

Outra novidade está relacionada com a necessária criação de “subvenções e subsídios específicos com vista a melhorar o desempenho energético dos edifícios para agregados familiares vulneráveis, bem como proprietários em zonas rurais e outros grupos com dificuldades no acesso ao financiamento”. Neste sentido, prevê-se que a Comissão adopte “um quadro voluntário destinado a ajudar as instituições financeiras a orientarem e aumentarem os volumes de empréstimos, em conformidade com a ambição de descarbonização da União e as metas energéticas pertinentes”.

De acordo com a nova directiva, ainda são possíveis incentivos financeiros para a instalação de sistemas híbridos de aquecimento com uma quota considerável de energias renováveis, tais como a combinação de uma caldeira com energia solar térmica ou com uma bomba de calor. Uma contradição?

A obrigatoriedade do balcão único como prestador de apoio é outra das respostas apontadas pela nova EPBD. O financiamento não é suficiente, considera Bruxelas, e, por isso, são necessárias outras acções. Para os agregados familiares social ou economicamente mais vulneráveis ou em pobreza energética, “os Estados-Membros deverão tomar medidas para evitarem acções de despejo associadas a renovações, tais como a imposição de limites aos aumentos das rendas”. Assim, “a renovação de edifícios pode retirar pessoas da pobreza energética, bem como evitar a pobreza energética, graças à redução dos montantes excessivos das facturas de energia. Por outro lado, a renovação de edifícios não é gratuita, pelo que é essencial manter sob controlo o impacto social dos custos de renovação dos edifícios, nomeadamente nos agregados familiares vulneráveis”, lê-se na directiva.

O FIM DOS FÓSSEIS

A promoção e o reforço das renováveis e da electrificação são um caminho que já conhecemos bem. “Todos os novos edifícios devem estar preparados para a energia solar”, lê-se no documento, ou seja, devem “ser concebidos de forma a optimizar o potencial de produção de energia solar com base na radiação solar do local, permitindo a instalação de tecnologias solares sem intervenções estruturais dispendiosas”.

Faltava proibir os equipamentos alimentados com energia fóssil. “O estímulo e o apoio à renovação de edifícios, incluindo a transição para sistemas de aquecimento sem emissões, constituem, por isso, um objectivo fundamental da presente directiva”, refere também o documento.

Assim, é estabelecida a eliminação progressiva das caldeiras a combustíveis fósseis, com o objectivo de as erradicar completamente até 2040. Sucede que a falta de clareza nesta matéria pode deixar várias portas abertas. Desde logo, porque ainda não existe uma definição daquilo que se considera uma caldeira a combustível fóssil. A partir de 1 de Janeiro de 2025 são proibidos os incentivos financeiros à instalação de caldeiras autónomas a combustíveis fósseis, com excepção dos subsídios previamente publicados. Contudo, de acordo com a nova directiva, ainda são possíveis incentivos financeiros para a instalação de sistemas híbridos de aquecimento com uma quota considerável de energias renováveis, tais como a combinação de uma caldeira com energia solar térmica ou com uma bomba de calor. Uma contradição? E como resolvê-la? É que a EPBD proíbe a utilização de combustíveis fósseis em caldeiras a partir de 2040, mas não proíbe directamente caldeiras ou sistemas híbridos.

RENOVAÇÕES PROFUNDAS

As renovações profundas, cuja definição já é explicitada pela Comissão, têm como finalidade um conjunto de intervenções que transformem os edifícios em edifícios de emissões nulas, um dos pressupostos centrais desta directiva. Para o efeito, as renovações profundas podem ser efectuadas por etapas e a introdução dos passaportes de renovação dos edifícios vêm ajudar na orientação e na concretização das várias intervenções necessárias. Ainda assim, “caso não seja técnica ou economicamente viável transformar um edifício num edifício com emissões nulas, considera-se que uma renovação que resulte numa redução de, pelo menos, 60 % da utilização de energia primária é uma renovação profunda”. Outra porta aberta? E o que se pode considerar em termos de inviabilidade? É que os edifícios com pior desempenho deverão ser os primeiros a atacar. “Os Estados-Membros incentivam, mediante a prestação de maior apoio financeiro, orçamental, administrativo e técnico, em função do nível de desempenho alcançado, programas de dimensão significativa que visem um elevado número de edifícios, em especial os edifícios com pior desempenho, nomeadamente através de programas integrados de renovação urbana, e que conduzam a uma redução global de, pelo menos, 30 % da utilização de energia primária.”

O QUE NOS TRAZ A NOVA EPBD?

  • Actualização dos requisitos mínimos aplicáveis aos edifícios e revisão das metodologias de cálculo para o desempenho energético dos mesmos.
  • Introdução de uma metodologia para o cálculo do potencial de aquecimento global dos edifícios, incentivando uma análise de ciclo de vida do edifício.
  • Definição de requisitos com vista à instalação de sistemas solares em edifícios novos, renovados ou existentes, criando oportunidades para tornar os edifícios solar-ready.
  • Introdução do passaporte de renovação como instrumento que, em articulação com o certificado energético, permitirá um foco na implementação de medidas de melhoria, passo-a-passo, dedicadas a cada edifício em particular.
  • Reforço da infraestrutura de mobilidade sustentável, com revisão dos requisitos relativos ao carregamento de veículos eléctricos e a espaços de estacionamento para bicicletas e veículos de categoria L.
  • Reforço dos “edifícios inteligentes” com a introdução do indicador de aptidão para tecnologias inteligentes e de outras disposições em matérias de automação e controlo dos edifícios.
  • Reconhecimento da importância dos sistemas de controlo independente, dos certificados de desempenho energético, dos passaportes de renovação, dos indicadores de aptidão para tecnologias inteligentes e dos relatórios de inspecção.
  • Revisão da importância da inspecção regular dos sistemas de aquecimento, de ventilação e de ar condicionado nos edifícios.
  • Realce da importância do desempenho da qualidade do ambiente interior dos edifícios.
  • Introdução de um novo standard de desempenho do edifício, definido como edifício de emissões nulas, representado como edifício de classe A na futura escala de desempenho nos certificados energéticos.
  • Introdução de normas mínimas de desempenho energético para edifícios não residenciais, estabelecendo limiares mínimos de desempenho energético ao longo do tempo com vista à sua transformação em edifícios de ‘emissão zero’ até 2050.
  • Introdução da definição de uma trajectória de desempenho energético mínimo do stock de edifícios residenciais, com vista à sua transformação em edifícios de ‘emissão zero’ até 2050.
  • Reforço da importância do financiamento e incentivo à renovação dos edifícios, com especial foco no aumento da taxa de renovação profunda destes e na salvaguarda dos ocupantes vulneráveis ou em pobreza energética.
  • Introdução de um novo Plano Nacional de Renovação de Edifícios, que substituirá a actual Estratégia de Longo Prazo para a Renovação dos Edifícios, com o objectivo de transformar edifícios existentes em edifícios com emissões nulas.
  • Actualização do layout dos certificados energéticos e indicadores nestes incluídos, segundo um template específico, com a harmonização das classes de desempenho em toda a UE, de A a G, e com a introdução facultativa de uma classe A+, representativa de um edifício positivo de elevado desempenho.
  • Implementação de balcões únicos para o desempenho energético dos edifícios, destinados a todos os envolvidos na renovação de edifícios, nomeadamente proprietários de habitações e agentes administrativos, financeiros e económicos, tais como as pequenas e médias empresas, incluindo as microempresas.

Fonte: ADENE – Agência para a Energia

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