Depois de, em 2024, a área da energia em Portugal ter alcançado recordes, a associação ZERO explicou à Edifícios e Energia quais devem ser as prioridades para potenciar a produção de energia renovável em edifícios neste novo ano.
Em 2024, Portugal conseguiu alcançar a maior produção de electricidade renovável e as menores emissões de dióxido de carbono de sempre na produção total de energia elétrica, segundo dados da REN. A este propósito, a associação ZERO divulgou um comunicado no qual deixou um conjunto de alertas. Nomeadamente a carência de “políticas fortes e eficazes” para a eficiência e redução do consumo energético e a necessidade de aumentar o peso da produção descentralizada de energia renovável com origem em comunidades e cooperativas de energia através da criação de políticas públicas direccionadas para o efeito.
A associação considera ainda que as metas estipuladas para as energias renováveis no actual Plano Nacional de Energia e Clima (PNEC 2030) são “extremamente exigentes e estão já aí” – a partir de 2026, uma das ambições do documento é que 80 % da energia produzida em Portugal seja renovável. Para a ZERO, é preciso “dar corda aos sapatos” e não esquecer a “transparência nas decisões” e alcançar “maior articulação dos projectos de solar e eólico com as populações locais e a preservação dos ecossistemas”.
Com o início de um novo ano, Islene Façanha e Bárbara Maurício, ambas analistas de políticas de energia na ZERO, explicaram à Edifícios e Energia quais devem ser as medidas prioritárias em matéria de eficiência energética e produção descentralizada de energia para 2025.
Eficiência energética: educar, informar, potenciar
Islene começou por referir a necessidade de incentivos à renovação energética de edifícios. Como? “Apoiar a população, especialmente os grupos mais vulneráveis, na realização de obras que melhorem a eficiência energética, como a aplicação de isolamento térmico, a instalação de janelas eficientes ou a substituição de sistemas de aquecimento e arrefecimento pouco eficientes”. Islene Façanha acrescenta que a comunicação dos programas de apoio existentes deve ser melhorada, “uma vez que muitas pessoas desconhecem a sua existência”.
Outro ponto levantado pela analista é a promoção da adopção de sistemas de energia renovável e autoconsumo, tais como painéis solares fotovoltaicos, em combinação com opções que permitam armazenar a energia que for produzida.
Incentivar a aquisição de electrodomésticos e equipamentos de elevada eficiência energética, assegurando que os consumidores têm acesso a soluções económicas e sustentáveis, e promover campanhas de sensibilização para os benefícios da poupança energética são outras políticas mencionadas.
“Os programas de apoio à eficiência energética dos edifícios, em particular aqueles direccionados para os grupos vulneráveis, ficaram muito aquém dos resultados esperados”, admite Islene Façanha, que defende que as políticas e programas devem ser “bem direccionados, de forma a garantir a execução eficaz das medidas e o alcance dos objectivos definidos nos planos e estratégias nacionais”.
Para que estas medidas sejam bem-sucedidas, “é fundamental uma coordenação eficaz entre o governo, o sector privado, a sociedade civil e os consumidores. Além disso, torna-se imprescindível monitorizar continuamente os impactos destas medidas através de indicadores claros e metas concretas, ajustando a implementação sempre que necessário”, salienta.

Democratizar e desburocratizar a produção de energia
Relativamente à produção descentralizada de energia, esta é vista como um passo importante na diminuição das despesas dos portugueses. Bárbara Maurício conta à Edifícios e Energia que, “perante os desafios enfrentados pelos cidadãos no mercado energético, começa a ser necessário pensar em novos caminhos. Um desses caminhos é a produção de energia eléctrica para autoconsumo, que acontece de uma maneira mais democrática e é independente das grandes centrais”.
E deixa críticas às metas pouco ambiciosas para este modo de produção de energia: “A meta de energia solar descentralizada no Plano Nacional de Energia e Clima, cuja revisão foi recentemente aprovada no passado mês de Dezembro, é muito baixa, 5,7 GW de capacidade instalada de solar descentralizado, num total de 20,8 GW de solar fotovoltaico em 2030. Um estudo recente do Laboratório Nacional de Energia e Geologia (LNEG) aponta que a produção a partir de solar descentralizado em Portugal pode crescer até aos 23 GW, mas, apenas considerando a sua evolução histórica, é realista que o país atinja os 9 GW a 10 GW de instalações solares fotovoltaicas descentralizadas em 2030”. Perante os dados, a analista da ZERO defende que Portugal tem capacidade para abastecer, “com viabilidade técnica e económica, cerca de 50% do seu consumo de electricidade com base em solar fotovoltaico instalado em telhados”.
Havendo este potencial, de que forma pode ele ser aproveitado? Em primeiro lugar, Bárbara menciona que o enquadramento legal para autoconsumo individual funciona, no entanto, o mesmo não acontece quando se fala em Unidades de Produção para Autoconsumo colectivas. “O processo de licenciamento é difícil e, ao nível da Direcção-Geral de Energia e Geologia (DGEG), há uma falta de capacidade de analisar os processos”, refere. Assim, a desburocratização de todo o processo seria uma medida vista com bons olhos pela associação ZERO.
Ainda relativamente ao autoconsumo, é defendida a formação dos profissionais responsáveis pela instalação de unidades colectivas de autoconsumo, sendo que “o processo geralmente ainda não é linear e tão rápido” quando comparado com o autoconsumo individual.
No que diz respeito aos incentivos por parte do governo, “é importante ter linhas de financiamento para produção descentralizada para reduzir o tempo de retorno do investimento para as famílias. O investimento é maior à partida para as famílias porque o tempo de retorno é mais longo do que nos serviços e indústrias, isto porque as casas geralmente estão desocupadas durante o dia e não consomem a energia produzida”.
Por último, a analista de políticas energéticas sugere o recurso a normas urbanísticas que tornem obrigatória a instalação de solar fotovoltaico nas novas construções e incentiva a criação de condomínios industriais de energia e de consórcios “que possam tirar partido de economias de escala na produção de energia descentralizada”.
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