Autores: Márcio Gonçalves(1), Nuno Simões(1), Catarina Serra(1) e Inês Flores-Colen(2)

(1) Itecons, UC; (2) CERIS, DECivil, IST

Juntar sistemas ETICS aos painéis de vácuo pode trazer inúmeras vantagens, mas há desafios a considerar.

Enquadramento

A eficiência energética dos edifícios continua a ser um tema atual e de particular importância no que diz respeito à valorização dos recursos energéticos. Com o progressivo aumento dos requisitos de desempenho térmico, onde é objetivo alcançar edifícios com consumos energéticos nulos, a espessura da camada de isolamento térmico tem tendência a continuar a aumentar. Contudo, frequentemente existem constrangimentos técnicos e arquitetónicos que dificultam o uso de grandes espessuras de isolamento, como, por exemplo, devido a limitações de espaço ou a dificuldades de compatibilização com outros elementos da fachada.

Neste sentido, têm vindo a ser desenvolvidos produtos inovadores com elevados índices de isolamento térmico, dos quais se destacam os painéis de isolamento a vácuo – conhecidos na literatura por VIP (Vacuum Insulation Panel). A condutibilidade térmica do VIPs pode ser 5 a 10 vezes inferior à dos materiais de isolamento térmico convencionais, o que permite alcançar elevados níveis de desempenho térmico com reduzidas espessuras de material.

A incorporação deste tipo de super isolantes nas soluções construtivas que usualmente são empregues no parque edificado poderá ser uma mais-valia no reforço térmico da envolvente opaca. Por exemplo, aliar as vantagens dos sistemas ETICS (External Thermal Insulation Composite Systems) ao benefício da capacidade isolante dos VIPs pode constituir uma solução com grande potencial, especialmente em climas mais severos, onde é frequente a utilização de elevadas espessuras de isolamento. Com mais de 2 mil milhões de m2 aplicados em toda a Europa, os sistemas ETICS constituem uma solução com ampla aceitação no mercado, onde o poliestireno expandido moldado (82-83 %) e a lã mineral (11-12 %), são os produtos de isolamento térmico mais correntes.

Fig. 1: Painéis de isolamento a vácuo – VIPs.

No entanto, o painel de vácuo, pelas suas especificidades, apresenta ao setor da construção um conjunto de desafios que merece ser discutido. Por exemplo, surgem dificuldades na sua aplicação pela impossibilidade de perfurar/cortar os painéis; pela sua fragilidade e propensão dos mesmos a perderem o vácuo e as suas propriedades; pelo seu elevado custo comparativamente com soluções correntes; e até mesmo devido às dúvidas que ainda persistem acerca da durabilidade do desempenho dos painéis ao longo do seu ciclo de vida. Neste texto, são identificados e abordados os principais desafios da utilização de painéis de vácuo em sistemas ETICS, numa tentativa de contribuir positivamente para o desenvolvimento de novas soluções específicas para a aplicação pelo exterior.

Painéis de isolamento a vácuo – VIPs

O desenvolvimento dos VIPs começou na primeira metade do século XX, cuja primeira patente da tecnologia foi registada em 1930. As suas aplicações eram essencialmente em câmaras climáticas, caixas de transporte, e outro tipo de equipamentos com necessidade de controlar temperaturas interiores. Uma aplicação experimental numa fachada na Alemanha, em 1999, foi o ponto de partida para a aplicação deste tipo de produto no setor dos edifícios.

O painel de isolamento a vácuo consiste num material poroso com um invólucro constituído por filmes de reduzida espessura que permitem manter o vácuo no seu interior. A condutibilidade térmica de um VIP ronda os 4 mW/(m.°C) em estado inicial e os 8 mW/(m.°C) após 25 anos de envelhecimento. No caso de perfuração acidental do painel, a condutibilidade térmica aumenta para valores na ordem dos 22 mW/(m.°C), o que continua a ser um valor inferior a grande parte dos isolantes convencionais que rondam os 35 mW/(m.°C).

Este tipo de produto tem vindo a ser adaptado para a utilização em edifícios. Para garantir a proteção mecânica do painel e possibilitar a sua aplicação em paredes, os VIPs beneficiam da colocação de um material de proteção adicional. Por outras palavras, o painel de vácuo pode ser encapsulado num outro material isolante (de reduzida espessura), usualmente em poliestireno expandido moldado (EPS), Figura 2.

Fig. 2: Isolamento com a mesma resistência térmica: 17 cm de EPS (à esquerda) e 2 cm de VIP (à direita).

Recentemente foi publicado o Documento de Avaliação Europeu – EAD 0040011-00-1201 para VIPs com materiais de proteção aplicados em fábrica. Para além desse documento, encontra-se em fase de publicação a norma especificação do produto prEN 17140. Estes documentos normativos definem as características essenciais e os métodos de avaliação que os VIPs utilizados em edifícios terão que ser sujeitos. Estas recentes publicações comprovam o caráter inovador do produto e confirmam o interesse da indústria e do mercado na sua utilização em edifícios.

Desafios da utilização de VIPs em ETICS

Cientes do potencial dos painéis de vácuo, investigadores e fabricantes têm vindo a estudar a aplicação deste produto em edifícios, como isolamento de coberturas, pavimentos e fachadas. Atualmente, existem alguns edifícios com sistemas ETICS, onde o isolamento térmico tradicional é substituído pelos painéis de vácuo. Esta solução tem sido explorada essencialmente na Europa Central, onde o clima impõe a utilização de elevadas espessuras de isolamento térmico. Contudo, a utilização de VIPs como sistemas ETICS apresenta algumas limitações/desafios. Por um lado, existem dificuldades associadas à natureza do produto, por outro lado persistem dúvidas acerca do seu desempenho e durabilidade. As pontes térmicas lineares geradas no contorno dos painéis e o seu elevado custo são outros dos principais desafios da solução.

Manuseamento e aplicação

Contrariamente à grande maioria dos materiais de isolamento, os VIPs não podem ser adaptados no local. Assim, os painéis devem ser projetados e dimensionados para o edifício em questão, cujos desenhos de pormenor são essenciais para auxiliar a aplicação. Além disso, os painéis são sensíveis à perfuração (a perda do vácuo agrava significativamente o seu desempenho), pelo que os aplicadores devem ter cuidados especiais durante o transporte, manuseamento e aplicação dos painéis. Outra limitação prende-se com a compatibilidade técnica e arquitetónica da ligação com outros elementos da fachada, como por exemplo peitoris, caixilharias, entre outros. Em alguns casos terá de se recorrer à utilização de outros materiais isolantes para garantir a correta execução da obra.

O material da camada de proteção do VIP deve assegurar o seu manuseamento, planeza e adequada adesão das colas. Para além disso, deve permitir pequenos ajustes à dimensão nominal do painel, bem como permitir a fixação das cavilhas plásticas, que auxiliam a colagem e contribuem para a mitigação de eventuais deformações dos painéis.

Uma vez que as anomalias mais comuns em sistemas ETICS estão associadas ao revestimento delgado (fissuração, empolamento, entre outros), estes produtos de revestimento devem ser criteriosamente selecionados. As temperaturas superficiais de soluções do tipo ETICS apresentam elevadas amplitudes térmicas, chegando a atingir mais de 60°C em fachadas expostas à radiação solar. Com a substituição de um isolamento térmico convencional por um super isolante, é expectável o agravamento dessas solicitações externas, o que constitui um maior grau de exigência para os revestimentos que tipicamente apresentam uma reduzida espessura (Figura 3).

Fig. 3: Aplicação do barramento armado em solução de ETICS com painéis de vácuo encapsulados em EPS.

Durabilidade

Embora os VIPs possuam um elevado desempenho térmico, a sua durabilidade não pode ser negligenciada. Para materiais de isolamento é esperado um tempo de vida de, pelo menos, 30 anos. Estudos científicos apresentam uma durabilidade estimada entre 30 a 50 anos para os painéis de vácuo aplicados em edifícios. Contudo, o seu desempenho depende de vários fatores, como, por exemplo, das condições meteorológicas, da orientação, da dimensão, espessura, do tipo de materiais utilizados no núcleo, etc. A preservação de baixos níveis de humidade e de pressão no interior do painel é essencial para assegurar o seu elevado desempenho ao longo do tempo.

Pontes térmicas

As pontes térmicas nos VIPs podem ocorrer por três vias:

• Devido ao invólucro utilizado para manter o vácuo, que estabelecem uma ponte térmica entre o lado quente e frio da fachada;

• Devido às diferenças de condutibilidade térmica entre o material do núcleo do VIP e o material da camada de proteção;

• Devido à existência de espaços de ar entre painéis, ou da sua colmatação com argamassa ou outro material.

A influência das pontes térmicas no desempenho global da fachada pode ser considerável. Uma das formas mais efetivas de reduzir o seu impacto consiste na redução da condutibilidade térmica do material de proteção, assim como evitar a existência de espaços de ar entre painéis. A sobreposição de camadas de painéis de vácuo também permite mitigar o efeito das pontes térmicas, embora aumente a espessura da parede e o seu custo.

Condensações e crescimento biológico

O crescimento biológico em fachadas com ETICS é uma anomalia bastante comum. Este fenómeno é potenciado pelo alto teor de humidade na superfície dos revestimentos. Trabalhos de investigação demonstram que paredes com ETICS apresentam um maior risco de condensações e, consequentemente, de crescimento biológico, quando comparadas com fachadas tradicionais com maior inércia térmica. A aplicação de VIPs em ETICS poderá agravar o problema. Medições in-situ indicam um maior risco de condensação em soluções ETICS com VIPs comparativamente com ETICS convencionais. Este problema pode ser minimizado com a seleção de revestimentos que mitiguem o desenvolvimento biológico.

Além das condensações superficiais, é importante evitar condensações que ocorram na superfície do VIP (risco de deterioração). Para mitigar este fenómeno é recomendável que o material de proteção do VIP seja um bom isolante, permitindo aumentar a temperatura à superfície do VIP e minimizar o teor de humidade em contacto com o painel. Outra opção poderá passar por utilizar uma barreira para-vapor na solução construtiva.

Viabilidade económica

Devido ao seu elevado custo quando comparado com outros isolamentos térmicos, a comercialização em larga escala de VIPs para edifícios ainda não atingiu todo o seu potencial. Em 2014, apenas 10 % do total da produção de VIPs foi destinada a edifícios. O elevado custo da solução resulta, não só do custo do material, mas também da necessidade de projeto e cuidados adicionais durante a sua aplicação. Sabendo que a rentabilidade do investimento em medidas de eficiência energética é fortemente dependente do preço do material, a redução de custos é um dos principais desafios para a indústria do vácuo. Com o objetivo de melhorar a competitividade económica das soluções, investigadores têm-se centrado na alteração dos materiais que compõem o produto, na tentativa de manter o elevado desempenho e reduzir os custos de fabrico.

A substituição de um isolamento convencional por um VIP permite uma significativa redução da espessura das paredes e, consequentemente, um aumento da área útil. Este benefício económico da poupança de espaço pode contribuir para contrabalançar os custos elevados na solução, numa perspetiva de análise de rentabilidade económica a longo prazo.

Alguns estudos demonstram que o preço do VIP deve ser reduzido para se tornar uma opção economicamente viável. Por sua vez, outros investigadores demonstram que o investimento neste tipo de produto pode ser uma alternativa rentável se forem incluídos os benefícios da economia de espaço, especialmente onde a área de construção é limitada e onde o clima impõe necessidades energéticas elevadas. Assim, a utilização deste produto em edifícios, não só contribui para a redução dos consumos energéticos, como também para a maximização do espaço útil para os utilizadores.

Considerações finais

A utilização dos painéis de vácuo em edifícios irá contribuir para a melhoria da eficiência energética do parque edificado, tanto para construção de novos edifícios, como também para a reabilitação dos existentes. Uma vez que existem poucas aplicações em sistemas ETICS, considera-se nesta fase essencial utilizar o conhecimento gerado por fabricantes, investigadores e laboratórios para desenvolver, caracterizar e otimizar soluções com esta tecnologia. A validação experimental e o desempenho em situações reais promoverão a confiança dos agentes de mercado, tais como construtores, projetistas, arquitetos e donos de obra. Os painéis de vácuo poderão ser particularmente relevantes em situações de restrição de espaço, onde a relação espessura-desempenho pode ser determinante, especialmente em climas mais frios, em centros urbanos onde o preço por m2 é elevado e onde o fator custo vs resistência térmica pode ser relevante.

O presente documento foi baseado no artigo “A review of the challenges posed by the use of vacuum panels in external insulation finishing systems” publicado na Applied Energy 257 (2020) 114028 (https://doi.org/10.1016/j.apenergy.2019.114028).

Agradecimentos

Este trabalho foi elaborado no âmbito do projeto europeu INNOVIP (subvenção nº 723441), financiado pelo programa de investigação e inovação do Horizonte 2020 da União Europeia.

As conclusões expressas são da responsabilidade dos autores.