Falar de estatísticas, mostrar números ou encarar a realidade é um exercício que nos custa a todos. Fugimos deste confronto sistematicamente. É esta genericamente a nossa natureza. Já todos sabemos que as metas e as estratégias na área da energia não vão ser cumpridas. A maioria dos Estados-Membro da UE não está nem sequer perto dos objectivos traçados para 2020. E são duas as razões fundamentais. As dificuldades financeiras que todos conhecemos em primeiro lugar, mas também um desinvestimento evidente na área da eficiência energética, seguido por vários países, incluindo o nosso. Confundem-se conceitos deliberadamente e aproveita-se a quebra dos consumos por motivos económicos para justificar uma evolução na eficiência energética que não é real. É uma mentira. Neste contexto, houve espaço para tudo. Para desvirtuar as regras de Bruxelas, entrar em incumprimento, perder por esta via os financiamentos destinados a esta área e deixar tudo por fazer. O Estado, em primeiro lugar. De seguida e por contágio, todo o mercado. O Estado não fez, nem fez os outros cumprir. No relatório de Março do Tribunal de Contas sobre a eficiência energética nos edifícios da Administração Pública, confirmamos isso mesmo. Nada se fez! O ECO.AP, lançado em 2011, continua na gaveta. Foram apenas celebrados três contratos e por parte de municípios; Portugal não adoptou a “abordagem padrão” e depois a “alternativa” que consistia na renovação em cada ano de 3 % do seu parque edificado e não foi sequer calculado o montante necessário para estas medidas. Estes são apenas alguns exemplos. Resumidamente, o Estado não cumpriu praticamente nada do que devia. Em contrapartida, não são conhecidas quaisquer contra ordenações no âmbito do SCE. Parece que não há certificados afixados nos edifícios do Estado, como a Lei exige. O que mais nos impressiona não são as dificuldades. É a falta de vontade e a apatia. Bruxelas deu-nos um ralhete e um castigo. Retirou-nos as verbas e, ainda assim, as poucas que existiam não se gastaram. Agora que emendámos a mão no papel, continuamos à deriva. É que vem aí a próxima directiva e, para além do SCE, com todas as dificuldades que conhecemos, tudo o resto está praticamente por fazer. Este relatório é público e é um escândalo. Só não vê quem não quer.
Confundem-se conceitos deliberadamente e aproveita-se a quebra dos consumos por motivos económicos para justificar uma evolução na eficiência energética que não é real. É uma mentira. Neste contexto, houve espaço para tudo. Para desvirtuar as regras de Bruxelas, entrar em incumprimento, perder por esta via os financiamentos destinados a esta área e deixar tudo por fazer.
Esta é uma realidade, mas há outra que não nos pode passar ao lado, caso os nossos governantes e gestores de energia retomem a vontade de olhar com seriedade e com sentido de dever público para estes temas. O maior potencial de poupança ou de desempenho energético nos edifícios está na reabilitação. Não se deixem ofuscar pelo boom do turismo e pelas reabilitações bonitas e de que todos gostamos. A nossa realidade é outra e que não acompanhou esta euforia. Uma euforia boa, mas que não nos pode desviar daquilo que é o essencial. De acordo com o INE, cerca de 18 % das pessoas estão em risco de pobreza e vivem com rendimentos de 450 euros/mês. Aqui, e não só, a pobreza energética é inevitável. Desligam-se as luzes ou não há aquecimento. Hoje e em termos anuais médios, as despesas das famílias em habitação, transportes e alimentação estão exactamente aos níveis de 2010, altura da crise económica. Há uma classe que viu os seus rendimentos aumentarem, mas, em contrapartida, temos famílias mais pobres e com mais dificuldades.
Continuar sem qualquer estratégia séria ou fechar os olhos e não relacionar a eficiência energética com estes temas sociais é um caminho do qual ninguém quer fazer parte.
As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores.