A propósito de uma notícia no jornal Público de 1 de agosto de 2023, na página 20 (Local | Operação imobiliária em curso), com o título Megaprojecto na antiga Feira Popular mudará a cara de Entrecampos, assinada por Samuel Alemão, com uma fotografia (©DR) que reproduzo.
Visualizando somente a imagem, e reajo tendo somente esta imagem em mente, destaca-se um conjunto de edifícios com vãos envidraçados de largas dimensões, com orientação Sul e Poente, e, portanto, sujeito a grandes níveis de radiação solar. Não sendo possível visualizar dispositivos de sombreamento externo, a consequência imediata é que serão edifícios com elevadas cargas térmicas, com elevadas necessidades energéticas de arrefecimento (ar condicionado), pelo menos, na situação de verão; não irei referir a situação do inverno, que obviamente necessita de cuidadosa análise térmica e energética. Serão, portanto, edifícios muito “consumidores de energia” para o conforto térmico, pouco “sustentáveis”, pouco “verdes”, e seguramente na direção errada dos NET ZERO ENERGY Buildings (NZEB) e muito menos dos Zero Emmission Buildings (ZEB).
É lamentável se tal for o que parece mostrar a imagem. Há, em Portugal, Engenharia e Arquitectura capaz de projetar edifícios que vão na “boa” direção, construindo edifícios de baixo consumo, amigos do ambiente não só NZEB, mas denominados Positive Energy District, [conceito que retrata] um quarteirão que produz a energia que vai consumir e ainda pode comercializar a restante.
E, depois, há um outro problema muito mais grave, e chama-se aquecimento global e sobreaquecimento das cidades. Lisboa já vive essa situação com as denominadas ondas de calor: em 2022, o mês de julho sofreu três ondas de calor, [sendo que] a segunda durou nove dias, com graves consequências na saúde pública.
Como é possível projetar vários quarteirões da cidade sem ter estes aspetos em consideração na projeção dos seus edifícios? Pergunto-me se a imagem corresponde mesmo ao projeto? Custa-me muito a crer. O ar condicionado não pode resolver tudo, e não deve. Todas as diretivas europeias, o PNEC2030 (Plano Nacional de Energia e Clima) e o RNC2050 (Roteiro da Neutralidade Carbónica) apontam outro caminho.
De referir que a câmara municipal de Lisboa e a Lisboa E-Nova, a Agência de Energia de Lisboa, desenvolveram um estudo, juntamente com o IGOT, muito aprofundado sobre as “Ondas de Calor em Lisboa” com dados muitos sérios, e com projeções futuras muito graves para a saúde e para o bem-estar dos seus cidadãos.
É urgente uma nova atitude das entidades licenciadoras, dos promotores e dos projetistas, uma nova perspetiva que tem de ser assumida no projeto dos novos edifícios, num mundo que já se encontra na era do Global Boiling.
As conclusões expressas são da responsabilidade do autor.