O Programa do XXII Governo Constitucional foi aprovado, no passado sábado, em Conselho de Ministros, e começa esta semana a ser debatido na Assembleia da República. O documento propõe-se a responder, durante esta legislatura, a quatro desafios estratégicos: combater as alterações climáticas, responder ao desafio demográfico, construir a sociedade digital e reduzir as desigualdades.

O documento de 191 páginas inclui medidas e propostas para o período de 2019 até 2023 e o sector energético faz parte dos desafios mais relevantes para esta legislatura. No capítulo “Alterações Climáticas – Enfrentar as alterações climáticas garantindo uma transição justa”, o documento começa por lembrar que Portugal foi o primeiro país a assumir, em 2016, o objectivo da neutralidade carbónica em 2050 e, mais recentemente, a aprovar um Roteiro para esse efeito. Assim, o novo Governo traça um rumo para alcançar a neutralidade carbónica e a transição energética, que inclui duplicar a capacidade instalada de produção renovável, de modo a atingir o patamar de 80% de renováveis na produção de eletricidade. Referindo que, até 2030, “Portugal deverá alcançar uma meta de 47% de energia de fonte renovável no consumo final bruto de energia e uma meta de 20% de energia renovável nos transportes”, o documento refere os contributos da electrificação generalizada das actividades económicas, bem como da incorporação de calor de origem renovável, de biomassa e de biocombustíveis sustentáveis para alcançar esses objectivos.

Para tal, o Governo propõe-se a preparar o fim da produção de energia eléctrica a partir de carvão, aumentar a capacidade de produção de energia solar em 2 gigawatts (GW) nos próximos dois anos (referindo que vai dar continuidade aos leilões de capacidade para novas centrais solares fotovoltaicas, com programa plurianual), reforçar as interligações eléctricas, assim como a capacidade de produção eléctrica dos parques eólicos existentes, fomentar os sistemas híbridos, de forma a aproveitar a capacidade disponível na rede de transporte de energia, e promover o desenvolvimento de comunidades de energia, no âmbito de um quadro regulatório aberto à produção descentralizada, como foco no combate à pobreza energética.

Outras medidas passam fomentar a digitalização do sistema energético através do desenvolvimento de redes eléctricas inteligentes, “bem como contadores de última geração, com capacidade de sensorização e comunicação, que suportem a evolução da produção descentralizada, da microprodução, dos dispositivos de armazenamento de energia e do carregamento de veículos elétricos”. É também proposta a criação de um “Superfundo para a Transição Energética, agregando os actuais fundos da área da energia e outros mecanismos de financiamento”.

No que toca à aposta na eficiência energética, o documento refere diversas medidas, como lançar “um programa de abate de electrodomésticos e outros equipamentos electrónicos com classificação energética igual ou inferior a B, com incentivos à sua substituição por modelos mais eficientes; […] desenvolver uma estratégia de longo prazo para a renovação de edifícios e para os edifícios de zero emissões; prosseguir com o princípio ‘reabilitar como regra’, elevando os parâmetros de eficiência do edificado e reforçando a óptica da sustentabilidade assente na eficiência de recursos (eficiência hídrica, energética e de materiais), designadamente por via da utilização de certos materiais, das soluções térmicas e de isolamento adoptadas e da instalação de equipamentos de poupança e/ou produção eficiente de energia”.

Ainda no âmbito da eficiência energética, é também proposto o desenvolvimento do “Programa Solar em Edifícios, visando aproveitar o espaço disponível em coberturas com boa exposição solar para autoconsumo e produção descentralizada de energia, incluindo em edifícios públicos”, assim como o incentivo à “instalação de fachadas e coberturas verdes como forma de promoção de eficiência energética, gestão de água, e qualidade do ar em estruturas/edifícios”, além de “apostar na reconversão da iluminação pública para soluções mais eficientes (por ex., LED) e, se possível, que permitam a instalação de outros serviços (por ex., carregamento de veículos), em parceria com os municípios”.

A descarbonização da indústria é outro ponto focado neste programa, que considera esta acção “fundamental para garantir a sua competitividade e o seu posicionamento estratégico nas exportações”. Como tal, propõe-se a “fomentar a adopção de fontes renováveis na indústria, designadamente através da instalação de centros electroprodutores renováveis em espaços industriais; criar um sistema de incentivos para a eficiência energética, baseado no desempenho e que não promova o uso de combustíveis fósseis” e “assegurar uma exploração sustentável das reservas de lítio existentes no nosso país, desenvolvendo um cluster em torno deste recurso, que permita dar passos relevantes na escala de transformação, ultrapassando a mera extração e investindo em atividades de maior valor acrescentado no âmbito da indústria de baterias”, entre outras medidas.

O Governo propõe-se também a adoptar uma “fiscalidade verde, com neutralidade em termos de receita, isto é, sem implicar um aumento global do esforço fiscal”. Nesse âmbito, pretende continuar a eliminar o que chama de “subsídios prejudiciais ao ambiente”, como as isenções e benefícios fiscais associados aos combustíveis fósseis. É também proposto o estabelecimento de incentivos para a eficiência energética, em particular nos edifícios de habitação.

No que toca à mobilidade eléctrica, mantêm-se as medidas já tomadas, com os benefícios fiscais para os veículos eléctricos, assim como um reforço e expansão da sua rede pública de carregamento. Na mobilidade urbana, pretende-se que seja mais eficiente, sustentável e integrada, com uma “aposta no transporte público e na sua intermodalidade com a bicicleta”.

Este Programa do Governo deverá ser debatido durante esta semana e não está prevista nenhuma votação contra o documento por parte dos partidos com assento parlamentar.

 

© Foto: Tiago Petinga/Lusa