“Tomar as decisões certas e agir agora” é, para Wolfgang Feist, a única forma de se conseguir “ainda” impedir uma crise climática. Numa conferência de imprensa internacional, o fundador da norma alemã Passivhaus reforçou a importância de aumentar o número de edifícios de elevado desempenho energético nesta matéria e antecipou “mudanças significativas” nas áreas da mobilidade e energia.

Wolfgang Feist ©Peter Cook

Business as usual não é uma opção”, afirmou o investigador, que, em finais dos anos 1980, desenvolveu a norma construtiva Passivhaus e fundou o instituto com o mesmo nome. Numa sessão on-line com jornalistas de todo o mundo, Feist sublinhou a inevitabilidade das alterações climáticas, justificando que “o CO2 que vai levar ao aumento de temperaturas nas próximas décadas já foi emitido há décadas”. Num paralelismo com a actual crise sanitária, o académico comparou a questão climática com a covid-19, cujos sintomas só aparecem após algum tempo, mas sublinhou uma diferença: enquanto o novo coronavírus afecta gravemente 4-5 % da população, a crise climática vai impactar mais de 60 % e “colocar toda a civilização humana em risco”.

Tendo isto em mente, Feist apelou à tomada de decisões e à acção imediata. Para tal, a melhoria da eficiência energética e o aumento do uso de fontes de energia renovável nos edifícios são medidas incontornáveis. “Se os edifícios consumirem muito pouca energia, então estas necessidades baixas podem facilmente ser colmatadas com energia renovável”, explicou. Os sectores do aquecimento de edifícios e dos transportes são aqueles que representam o maior uso de energia, pelo que, para o responsável do Passive House Institute, “passar dos motores de combustão para a tracção eléctrica e ter edifícios eficientes é uma parte crucial das soluções para uma maior protecção climática”.

Desde a sua fundação, a norma Passivhaus tem-se posicionado como uma das propostas para alcançar edifícios de elevado desempenho energético, não apenas na Europa Central, mas em todo o mundo. Inclusivamente, o conceito é apontado como uma das soluções para cumprir o requisito da Directiva Europeia para o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD) referente aos edifícios com necessidades energéticas quase nulas – nearly zero energy buildings (nZEB) – e não só em edifícios novos. Através da certificação EnerPHit, a norma pode dar também resposta às necessidades de reabilitação do parque edificado existente na Europa.

Cinco princípios fazem uma casa passiva   

Mas o que diferencia, então, uma passivhaus? Muitas vezes chamado como “casa super isolada”, a aplicação da norma Passivhaus tem como base cinco princípios construtivos: isolamento elevado, janelas de alta qualidade, estanquicidade da envolvente, evitando pontes térmicas, e um sistema de ventilação com recuperação de calor. O adjectivo “passivas” deve-se ao facto de estes edifícios compensarem uma grande parte das suas necessidades energéticas para aquecimento através de medidas passivas, como a radiação solar ou o próprio calor emitido pelos ocupantes ou pelos aparelhos electrónicos existentes nas divisões.

No actual contexto pandémico, são muitas as questões que têm surgido relativamente aos sistemas de ventilação. Durante a sessão com os jornalistas, Feist fez questão de reforçar os benefícios da aplicação para evitar a propagação do vírus, uma vez que o sistema traz ar fresco e higienicamente limpo para o interior. Para além disso, os sistemas de ventilação com recuperação de calor com certificado Passivhaus (isto é, aptos para a aplicação da norma) dispõem, normalmente, de um filtro de partículas de elevada eficiência. “Isso mantém afastados muitos mais germes do que uma máscara facial convencional. Os edifícios Passivhaus são também bons para a saúde”, exclamou.

O primeiro edifício construído à luz desta norma foi erguido em 1991, em Darmstadt, na Alemanha. Passados mais de 25 anos, a monitorização do edifício piloto mostra que este consome menos 87 % de energia do que um edifício convencional, registando uma procura anual de energia para fins de aquecimento de 8,4 kW/m2. Há quatro anos, o edifício sofreu pequenas renovações, nomeadamente a instalação de uma bomba de calor mini split para aquecimento e arrefecimento e de um sistema fotovoltaico, o que, em termos de balanço, o tornou num edifício positivo (gerando mais energia do que aquela que consome). Para além dos resultados em termos energéticos, as conclusões do projecto levado a cabo por Wolfgang Feist apontam também para a durabilidade dos materiais utilizados.

Entre as várias dúvidas que surgem relativamente ao conceito, uma das mais comuns refere-se à sua aplicabilidade em climas amenos. Na verdade, desde a fundação do Passive House Institute, o trabalho desenvolvido por Feist tem visado levar a norma para outros países com climas diferentes da Europa Central, adaptando os requisitos às condições de cada região. Face a isto, hoje, é possível encontrar projectos com este selo em países como a China, Espanha, Estados Unidos da América ou Indonésia. Em Portugal, existem três edifícios certificados e seis em processo de certificação. A divulgação do conceito ganhou ímpeto em 2012 com a criação da Associação Passivhaus Portugal, que é hoje uma das entidades nacionais mais activas na defesa e promoção da eficiência energética nos edifícios.