Em Agosto, a legislação específica para a prevenção e controlo da doença dos Legionários passou a ser uma realidade. A Lei 52/2018 vai obrigar ao registo de equipamentos numa plataforma electrónica, à elaboração de planos de prevenção e controlo da bactéria Legionella e à realização de auditorias a cada três anos. Quem não cumprir arrisca coimas até 45 mil euros.
Os surtos de doença dos Legionários registados nos últimos anos em território nacional e as centenas de mortes que deles resultaram tornaram a existência de uma legislação específica para a sua prevenção mais urgente. A intenção de criar regras próprias para o controlo da bactéria Legionella foi anunciada no início deste ano pelo Governo e o diploma foi publicado a 20 de Agosto no Diário da República, contemplando os procedimentos relativos à utilização e manutenção de redes, sistemas e equipamentos propícios à proliferação e disseminação da Legionella.
Entre outras coisas, o diploma obriga ao registo dos equipamentos numa plataforma electrónica, à elaboração de planos de prevenção e controlo da bactéria e de manutenção ainda à realização de auditorias a cada três anos. A nova lei vem dar resposta a algumas das necessidades apontadas pelos especialistas do sector nos últimos tempos, começando pelo facto de ser, em si, uma legislação específica para o tema e desviando-se das habituais confusões sobre a origem do problema.
“A Legionella está associada à água e a preocupação no controlo e prevenção deve ser por via da água e posterior aerossolização”, lembrou a especialista do Instituto Ricardo Jorge Helena Rebelo, numa entrevista recente à Edifícios e Energia. Assim, as regras vão aplicar-se a “equipamentos de transferência de calor associados a sistemas de AVAC ou a UTAs, desde que possam gerar aerossóis de água: torres de arrefecimento, condensadores evaporativos, sistemas de arrefecimento de água de processo industrial, sistemas de arrefecimento de co-geração e humidificadores; a sistemas inseridos em espaços de acesso e utilização pública que utilizem águas para fins terapêuticos; redes prediais de água designadamente água quente sanitária; e sistemas de rega ou de arrefecimento por aspersão, fontes ornamentais e outros geradores de aerossóis de água com temperatura entre 20º C e 45º C”.
Salvo em casos de cluster ou surto, ficam excluídos os sistemas e redes localizados em edifícios e espaços que não sejam de acesso e utilização pública, e edifícios predominantemente habitacionais e de escritórios, excepto se instalados nas zonas comuns de conjuntos comerciais, zonas comuns de grandes superfícies comerciais ou fracções autónomas destinadas ao comércio a retalho que disponham de uma área de venda igual ou superior a 2000 m2.
Prevista está também a criação de uma plataforma electrónica, que deverá estar em funcionamento no prazo de seis meses e que servirá para o registo obrigatório das redes, sistemas e equipamentos. A gestão e operação da plataforma, cujo financiamento terá origem no Fundo Ambiental, cabem à Direcção-Geral de Saúde. Os equipamentos já existentes até data da entrada em funcionamento da plataforma terão seis meses para serem registados após o anúncio público do arranque da plataforma.
O principal alerta lançado pelos especialistas prende-se com a necessidade de actuar ao nível da prevenção. Nesse sentido, a nova lei prevê a obrigatoriedade de elaboração, execução, cumprimento e revisão de um plano de prevenção e controlo, no qual devem constar, entre outros, a identificação das competências e responsabilidades dos profissionais envolvidos, assim como dos pontos críticos de proliferação e disseminação de Legionella. Para além disso, são exigidos programas de manutenção e verificação de sinais de contaminação, de revisão, limpeza e desinfecção, de monitorização e tratamento (preventivo ou correctivo) da água. O diploma vai ainda mais além e introduz a necessidade de planos de vigilância da saúde dos trabalhadores com risco de exposição profissional à Legionella.
Todas as actividades de limpeza e desinfecção, manutenção, monitorização, tratamento e verificação de ocorrências, datas de auditorias e respectivos resultados e eventuais medidas adoptadas terão de ser indicadas num sistema de registo obrigatório – medida que foi, aliás, identificada por Helena Rebelo. “A monitorização não se resume apenas às análises”, referiu, explicando que esta “implica inspeccionar todos os sistemas e equipamentos, limpar, tratar, desinfectar. As análises constituem apenas a evidência de que o plano de manutenção está ou não adequado à situação em causa. Se os procedimentos de manutenção forem cumpridos, supostamente não irá haver condições propícias para o desenvolvimento da Legionella em concentração que possa vir a constituir um risco”.
No que se refere às auditorias, de acordo com as novas regras, estas deverão ser feitas a cada três anos e avaliarão o estado de conservação dos equipamentos, a identificação de não conformidades relativamente às regras construtivas, de instalação ou de localização, bem como uma avaliação da adequação do plano em vigor. Estas serão realizadas por entidades acreditadas pelo IPAC ou entidade homóloga signatária do acordo multilateral relevante da European co-operation for Accreditation.
Consoante o local onde se encontrem instalados os equipamentos, redes e sistemas ou as actividades a que estão afectos, a fiscalização do cumprimento das obrigações introduzidas pela nova lei vai ficar à responsabilidade das seguintes entidades: Autoridade de Segurança Alimentar e Económica; Autoridade para as Condições do Trabalho;
Entidade Reguladora da Saúde;
Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território; Inspecção-Geral das Actividades em Saúde. O incumprimento será punido com coimas que podem ir até aos 45 mil euros.
Apesar de a prevenção e controlo da Legionella contar agora com legislação específica, é importante não esquecer a importância dos procedimentos e regras logo no momento da concepção e projecto, quer nos novos edifícios, quer nas renovações. “Existem, por exemplo, problemas devido a redes sobredimensionadas, pontos mortos, instalações de água quente com mais de 30 anos com imensa corrosão”, esclarece Helena Rebelo. “Na prevenção, relativamente a novos edifícios, terá de se adequar a rede de distribuição de água quente e fria ao fim a que se destina. Nos edifícios já existentes, convém, talvez, fazer um levantamento do que existe”, recomenda.
Com a publicação da Lei 52/2018, passa também a alterar-se o DL 118/2013, referente ao Sistema de Certificação Energética dos Edifícios, o Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Habitação e o Regulamento de Desempenho Energético dos Edifícios de Comércio e Serviços. As alterações constam nos artigos 12º e 12º-A, que asseguram as competências das entidades responsáveis por esta nova legislação especial, assim como a sua aplicação no que se refere à avaliação de presença de colónias de Legionella, no contexto da qualidade do ar interior (QAI), prevista pelo DL 118/2013.