Lisboa, Porto e Guimarães ficaram a saber, na semana passada, que são as três cidades portuguesas escolhidas para integrar a Missão Cidades Inteligentes e com Impacto Neutro no Clima, da Comissão Europeia, e isso é uma oportunidade para os sectores dos edifícios e de AVAC. O desafio foi lançado, esta manhã, por Paulo Ferrão, professor catedrático do Instituto Superior Técnico e membro do quadro desta Missão europeia, durante o CIAR 2022. O XVI Congresso Ibero-Americano de Ar Condicionado e Refrigeração (CIAR) arrancou ontem, em Lisboa, e decorre até amanhã no Centro de Congressos do LNEC – Laboratório Nacional de Engenharia Civil.
“Vão ter com os presidentes de câmara e com as cidades”, disse Paulo Ferrão, incentivando a audiência, composta por profissionais e estudantes dos sectores dos edifícios e de AVAC, a “apresentar soluções, fazer parcerias e trabalhar” com as cidades escolhidas para encontrar soluções com vista à neutralidade climática, no âmbito desta Missão, que conta com 360 milhões de euros de apoio financeiro do programa Horizonte Europa.
Tendo como objectivo ajudar 100 municípios europeus a tornarem-se mais inteligentes e a alcançarem a neutralidade climática até 2030, a iniciativa europeia propõe uma abordagem diferente à inovação, que tem por base contratos para o clima (Climate City Contracts). Estes contratos são desenvolvidos pelas cidades em conjunto com os seus cidadãos, organizações de investigação e sector privado, e deverão conter “um plano global para a neutralidade climática em todos os sectores, como a energia, os edifícios, a gestão dos resíduos e os transportes, bem como planos de investimento conexos”, refere a Comissão Europeia.
“Não fazer nada” nos edifícios não é opção
Tendo em mente o objectivo da transição climática, o trabalho feito pelo sector dos edifícios é, para Paulo Ferrão, “muito importante” e, por isso mesmo, “uma grande responsabilidade”. Sem uma mudança no parque edificado, não será possível alcançar as metas propostas até 2050, justifica o especialista, defendendo que, no que toca às emissões do sector, não basta um cenário “net zero” a nível das operações; é preciso, sim, olhar para o ciclo de vida dos edifícios, numa perspectiva de “economia circular” e alcançar um cenário “net zero embodied and operational”.
“Não é possível não fazer nada”, alertou, ilustrando com números os diferentes cenários: até 2050, se nada for feito, num cenário business-as-usual, os edifícios serão responsáveis por 667 GtCO2 de emissões; cumprindo os requisitos net-zero ao nível da operação, o valor desde para as 512 GtCO2; no entanto, só abordando o carbono incorporado em todo o ciclo de vida dos edifícios é que será possível alcançar a neutralidade carbónica a meio do século, estimando-se, até lá, um total de 340 GtCO2 de emissões.
“As soluções não passam só pelos edifícios” e estão, acima de tudo, numa visão de conjunto, à escala urbana, considera o especialista, fazendo a ponte com a oportunidade que agora surge com a escolha das três cidades portuguesas para a Missão Europeia. Paulo Ferrão partilhou ainda o modelo desenvolvido nesta matéria pelo MIT Portugal que, através de digital twins de áreas urbanas, permite simular a implementação de medidas de melhoria de eficiência energética e de integração de renováveis à escala do bairro, o UBEM – Urban Building Energy Modelling. Muito em breve, através da mesma ferramenta, deverá ser possível calcular o consumo agregado de energia numa área a 15 minutos de distância, o que será “muito útil” para as comunidades de energia renovável”, avança o docente. Em desenvolvimento pela mesma entidade, está também um indicador para a circularidade dos edifícios, cujo objectivo será ajudar cidades a implementar medidas de incentivo à construção sustentável e com menor impacto ecológico.
O CIAR 2022 acontece por estes dias em Lisboa e reúne técnicos, especialistas e estudantes de ar condicionado e refrigeração nacionais e internacionais para discutir as novidades e os desafios no sector. O evento é organizado pela EFRIARC – Associação Portuguesa dos Engenheiros de Frio Industrial e Ar Condicionado e pelo LNEC.
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