Um novo relatório da Agência Internacional de Energia (AIE) sublinha que quanto mais célere for a transição energética, mais rentável será para os governos, empresas e famílias e propõe medidas para tornar as tecnologias limpas mais acessíveis.
“Há ainda um importante debate a realizar sobre a acessibilidade e a equidade nas transições para energias limpas”, começa por dizer Fatih Birol, director executivo da AIE, no preâmbulo do relatório, “nomeadamente em termos da forma como os custos e os benefícios serão partilhados – e por isso quisemos fornecer uma base de dados e conselhos accionáveis para os decisores políticos, à medida que estes consideram as suas estratégias para o futuro”.
E alerta para um dos principais riscos da transição para uma economia de energia limpa: a possibilidade de famílias, comunidades e países mais pobres serem excluídos pelo facto de não conseguirem suportar as despesas iniciais que a mudança para um sistema energético mais seguro e sustentável exige.
Perante este risco, o relatório “Estratégias para Transições para Energias Limpas Acessíveis e Justas” destaca que a principal tarefa dos governos é tornar as tecnologias energéticas limpas mais acessíveis a todas as pessoas, em especial àqueles que se encontram em situações de maior vulnerabilidade. Fatih Birol acrescenta que “colocar o mundo na via para atingir emissões líquidas nulas até 2050 exige investimentos adicionais, mas também reduz os custos operacionais do sistema energético global em mais de metade na próxima década, em comparação com uma trajectória baseada nas actuais configurações políticas, como mostra este relatório”.
Energias limpas: serão competitivas?
Segundo o relatório, em muitos casos, as tecnologias de energia limpa já conseguem ser mais competitivas em termos de custos ao longo do seu ciclo de vida do que aquelas que são dependentes de combustíveis fósseis. Os módulos solares são exemplo disso – o documento indica que o seu preço diminuiu 30% em 2023, criando uma maior abertura até para sistemas solares domésticos, com o seu valor a ser reforçado por baterias mais baratas. Também as bombas de calor são mencionadas. Embora possam ser mais caras do que as caldeiras a gás apenas para aquecimento (dependendo dos preços relativos da electricidade em relação ao gás), são normalmente competitivas quando se considera tanto o arrefecimento como o aquecimento.
“A concretização dos benefícios trazidos pela transição para energias limpas depende do desbloqueamento necessário de níveis mais elevados de investimento inicial”, salienta a AIE, especialmente no caso das economias emergentes e em desenvolvimento, que enfrentam custos maiores.
O relatório indica ainda que existem distorções no actual sistema energético global que acabam por favorecer os combustíveis existentes. Assim, os investimentos na transição energética tornam-se mais difíceis. Em 2023, a nível global, os governos gastaram cerca de 620 mil milhões de dólares em subsídios para o uso de combustíveis fósseis. Já nesse mesmo ano, o valor gasto em apoios aos consumidores para investimentos em energias limpas ronda os 70 mil milhões de dólares.
Como garantir energia livre de combustíveis fósseis para todos?
Soluções existem, assegura o documento, ao apresentar uma série de medidas com base em políticas implementadas em vários países no sentido de incluir os mais vulneráveis. São elas:
– Implementação de programas de reabilitação da eficiência energética, de modo a torná-los mais acessíveis às famílias com rendimentos mais baixos: “países como a França, a Irlanda e o Reino Unido centraram estes programas nos agregados familiares com rendimentos mais baixos, que são frequentemente inquilinos e não proprietários, e que têm mais probabilidades de viver em casas com um desempenho energético relativamente fraco”;
– Uso de instrumentos políticos para aliviar as despesas iniciais dos agregados mais pobres, obrigando, por exemplo, os fornecedores de energia a financiar sistemas de aquecimento ou arrefecimento mais eficientes;
– Tornar os aparelhos de elevada eficiência mais acessíveis através de normas mínimas de desempenho energético e financiamento complementar por parte dos governos;
– Substituição de subsídios aos combustíveis fósseis por apoios direccionados aos mais vulneráveis;
– Utilização das receitas associadas aos regimes de tarifação de carbono, quando existam, para resolver aspectos sociais das transições energéticas – o relatório apresenta como exemplo o Fundo Social para o Clima da União Europeia.
Assim, de acordo com a AIE, a intervenção política desempenha um papel fundamental na resolução das desigualdades que existem, assegurando que as energias livres de combustíveis fósseis não continuem fora do alcance de muitos lares.
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