Em Espoo, na Área Metropolitana de Helsínquia, o Sello apresenta-se como “o centro comercial mais sustentável da Finlândia e um dos mais inteligentes da Europa”. Numa parceria com a Siemens, o edifício aposta na automação, inteligência e flexibilidade dos equipamentos e do sistema energético – 100 % renovável – como um todo, através de uma planta virtual de energia.

Todos os anos, mais de 21 milhões de pessoas visitam o centro comercial Sello, situado na Finlândia, um país com cerca de 5,5 milhões de habitantes. Este edifício, comummente tratado como um city center pelas suas diversas valências – incluindo no seu espaço, além de lojas e hipermercados, uma biblioteca, um auditório, um centro oftalmológico, uma escola de música, centros infantis, atracções de entretenimento –, foi o primeiro centro comercial da Europa a obter a certificação LEED EB Gold, em 2010.

Desde então, tem avançado para patamares mais ambiciosos no que diz respeito a esta certificação de liderança em energia e design ambiental para edifícios existentes. Em 2015, conseguiu cumprir os requisitos mais exigentes da certificação LEED EB Platina, graças a medidas de eficiência hídrica, de gestão de resíduos sólidos, de integração de várias opções de transporte alternativas (autocarros, comboios, e com uma nova ligação ao transporte colectivo sob construção), e, sobretudo, devido a soluções relacionadas com a eficiência energética e as energias renováveis, com a qualidade do ambiente interior e com a inovação na operação.

Com a certificação LEED EB Platina, entretanto renovada em Dezembro de 2020, o Sello, localizado em Espoo, na Área Metropolitana de Helsínquia, tornou-se o “primeiro centro comercial – e um dos apenas nove edifícios do género na Europa – a fazê-lo”. Quem o diz é a Siemens, parceira tecnológica deste centro comercial finlandês desde 2003, altura em que o edifício ainda estava em construção.

A parceria, que começou por incluir o fornecimento de um sistema de automação, foi evoluindo ao longo dos anos, passando por “serviços e tecnologia focados em dados” com o intuito de conseguir uma elevada eficiência energética, uma baixa pegada carbónica, um sistema de energia optimizado, com uma planta virtual de energia do próprio Sello, e uma participação activa no mercado da electricidade. Adicionalmente, no âmbito desta colaboração, está também em curso o desenvolvimento de um gémeo digital, ou digital twin, do edifício.

“Um activo vivo, com órgãos funcionais”

Com 102 000 m2 e 170 lojas, o centro comercial Sello apoia-se na colaboração com a Siemens para uma gestão mais inteligente da operação e da manutenção do edifício. Sublinhe-se, quanto a isto, que a multinacional alemã, com uma área dedicada a smart infrastructure, lançou, em Junho de 2022, uma plataforma digital aberta para digitalizar, descarbonizar e descentralizar os negócios dos clientes da Siemens – a Xcelerator –, na qual está inserida uma outra plataforma, a Building X, para promover a inteligência, eficiência e descarbonização de edifícios com base em tecnologia cloud e analítica.

Alavancando este conhecimento e esta experiência para o centro comercial Sello, a Siemens recolhe dados de mais de 1 500 data points de sistemas de AVAC e energia, de sensores de qualidade de ar e de temperatura, de taxas de ocupação e de dados meteorológicos para ter uma visão 360º do edifício.

Mas não só. Para haver uma melhor compreensão das necessidades do edifício, bem como das oportunidades de melhoria a nível de eficiência energética e financeira e de optimização do conforto, a Siemens leva a cabo uma abordagem analítica. Essa abordagem, refere a empresa, “inclui a análise de tendências a nível dos espaços e equipamentos, de um conjunto personalizado de parâmetros para o desempenho dos equipamentos e para as condições ambientais, bem como a detecção e o diagnóstico de falhas e avarias para garantir que quaisquer problemas são resolvidos de forma rápida e quantificável”.

À digitalização e automação, junta-se a inteligência. Entre as soluções de domótica adoptadas no Sello, inserem-se também a iluminação LED inteligente ou os sistemas de aquecimento preditivos, que, com base em dados de previsões atmosféricas (e de outros factores, como o preço de energia), derretem neve junto às entradas do edifício apenas quando necessário, evitando a acumulação de gelo e acidentes. Estas, a par de uma gestão inteligente do edifício, “reduzem o consumo de energia e melhoram a experiência dos ocupantes”.

“Se adicionar inteligência ao edifício, este passa a ser um activo vivo, com órgãos funcionais, e com algo para oferecer. Deixa de ser só um bem passivo”, destaca Harald Schnur, responsável pela Siemens Smart Infrastructure na Finlândia e nos Bálticos, durante uma apresentação do projecto aos jornalistas. O responsável diz ainda que aquilo que começou por ser um “edifício normal” alcança, agora, um Smart Readiness Indicator de 92 %. “É um [exemplo para o] benchmarking para toda a Europa”, argumenta.

O fornecimento destes serviços é feito tanto no próprio local, por um gestor de energia e por uma equipa de manutenção dos sistemas de automação do edifício, ou de forma remota. Esta última modalidade é possível através de uma conexão de todo o sistema ao Centro de Serviços e Navegação Digitais da Siemens, uma plataforma de energia e sustentabilidade baseada na cloud.

Aposta na flexibilidade energética

Integrado no centro comercial finlandês, há um sistema de energia que confere ao edifício maior autossuficiência e flexibilidade em termos energéticos e que é composto por um sistema de painéis solares com uma capacidade de 550 kW-pico, por 50 pontos de carregamento para veículos eléctricos, pelos vários equipamentos de AVAC e iluminação inteligente, por uma microrrede baseada na tecnologia do Sello e também por uma unidade de armazenamento eléctrico com capacidade de 2 MW.

Através desta unidade, além da produção e do consumo de energia totalmente proveniente de energias renováveis locais e da compra de energia à rede eléctrica apenas quando necessário, também há a possibilidade de armazenamento. Embora a energia produzida pelo sistema fotovoltaico seja, por norma, utilizada directamente, os acumuladores instalados no próprio centro são uma opção para as alturas em que o preço da electricidade está mais elevado ou para dar resposta a eventuais picos de consumo.

No fim de contas, o armazenamento eléctrico, que é normalmente carregado à noite aproveitando os preços spot mais baixos, permite gerar poupanças de energia equivalentes à electricidade necessária para aquecer 20 casas unifamiliares todos os dias durante o Inverno finlandês.

Em todo o processo, não há injecção de energia produzida pelo Sello na rede eléctrica nacional, refere a Siemens, que aponta para uma planta virtual de energia do centro comercial como a solução para estabilizar a frequência deste sistema e optimizá-lo.

Esta planta virtual de energia, concebida e mantida pela tecnológica alemã, tornou-se, segundo a mesma entidade, num exemplo de um modelo de operação para outros centros comerciais, ao demonstrar as vantagens da flexibilidade energética e da participação no mercado de reserva eléctrica, quer financeiras e ambientais para o Sello, quer para a rede eléctrica nacional (Fingrid) e para a rede de aquecimento urbano, uma vez que é possível atenuar eventuais sobrecargas por picos de procura de electricidade.

“Temos resultados”

“Temos resultados; não apenas conversa”, afirma Marjo Kankaanranta, managing director do centro comercial Sello desde 2021, na mesma conferência de imprensa. Os números avançados pela responsável apontam para poupanças anuais de quase 550 mil euros decorrentes das soluções adoptadas a nível de energia, manutenção, flexibilidade e investimento. A implementação de uma planta virtual de energia do Sello converteu-se ainda noutros benefícios de natureza financeira e ambiental: uma poupança de 2,4 milhões de euros desde 2019; um ganho anual de cerca de 350 mil euros no mercado flexível; e uma redução no consumo de electricidade e energia térmica de 40 % em relação ao ano de 2010.

Também em 2019, o Sello, com um consumo anual de electricidade e calor de 36 GWh, foi o primeiro centro comercial finlandês a atingir a neutralidade carbónica nas suas operações. “Na Finlândia, dizemos que há um tempo ‘antes’ do Sello [como ele é hoje conhecido] e um tempo ‘depois’ do Sello – 2019 foi um ano de viragem”, realça Harald Schnur.

De acordo com a empresa alemã, o “sucesso do projecto” tem que ver também com a parceria estabelecida: um acordo baseado num modelo EPC (Energy Performance Contracting) e no pré-financiamento do investimento necessário pela Siemens. Neste acordo, foram garantidas ao centro comercial poupanças anuais de pelo menos 1 250 000 kWh em electricidade, 1 300 000 kWh de energia térmica e 536 toneladas de CO2, correspondendo a uma redução de 133 mil euros por ano em custos energéticos, com uma parte da poupança financeira a ir para a recuperação do investimento e outra a ser dividida até ao final do contrato.

Perspectivando o futuro, e com o objectivo de posicionar o Sello como “o centro comercial mais verde na Europa”, a equipa da Siemens e a do centro comercial estão a apostar na contínua melhoria da gestão do edifício, que irá também, como diz Marjo Kankaanranta, expandir-se em 10 000 m2, sendo logo integrado neste sistema de gestão inteligente. Neste caminho, está também já a ser desenvolvido e aperfeiçoado um gémeo digital do edifício, um instrumento tecnológico que, nas palavras de Thomas Kiessling, Chief Technology Officer da Siemens Smart Infrastructure, vai melhorar as funções de “planear, operar e manter” o edifício, facilitando actualizações ao mesmo tempo que reduz a probabilidade de erros com sincronização de dados.

*A jornalista viajou a convite da Siemens Portugal