No dia 1 de Junho, a sede nacional da Ordem dos Engenheiros acolheu Alfredo Oliveira, responsável pela área de refrigeração do ASHRAE Portugal Chapter, para abordar, numa sessão técnica, o tema da refrigeração e da regulamentação. Com a nova directiva para o desempenho dos edifício em vista, a Edifícios e Energia quis perceber que cenário é possível perspectivar para os gases refrigerantes e o engenheiro mecânico, ligado também aos Grupos de trabalho da CTE 224 – Cidades e Comunidades Sustentáveis e às ISO/TC 268 e CEN/TC 465 “Sustainable cities and communities”, deixou claro que, em grande parte, nos refrigerantes naturais, “a questão que se coloca é segurança vs. consumos vs. pegada ecológica”.
Perspectivando a nova directiva para o desempenho dos edifícios, que balanço faz dos gases refrigerantes que estão ou vão ser utilizados?
Teremos vários cenários alinhados com a variada tipologia de equipamento utilizado na atualidade. Em suma, se falarmos de AVAC, a aposta, nos últimos anos, tem sido no HFC-410, mas este é uma PFAS [substância perfluoroalquiada, um composto sintéctico associado, por exemplo, à contaminação da água e do solo por não se degradar e que deverá ser banida na União Europeia]. Além disso, tal como vai acontecer em 2025 nos Estados Unidos, e em paralelo com o novo regulamento F-gas, deverá tornar-se proibido potenciais de aquecimento global (GWP) acima de 150, permitindo-se até 750 caso as medidas de segurança não sejam cumpridas.
Isto quer dizer que o HFC-410 [com um GWP superior a 2 000] vai deixar de ser uma alternativa viável e vai ser sequencialmente eliminado em todo o equipamento de refrigeração e aquecimento, como bombas de calor e afins ondem tem sido amplamente usado. Iremos ter, seguramente, o fortalecimento do gás R-32, um gás sintético inflamável da família dos HFC que tem um GWP abaixo dos 750.
Tenho reparado em alternativas – o R-513A (GWP de 573), o R-454X (GWP de 148) e o R-455A (GWP de 146) –, mas são fluidos com problemas de flamabilidade equivalentes aos do R-32 e, em paralelo, por terem na sua composição componentes PFAS ou TFAS, se as intenções da Agência Europeia dos Produtos Químicos se concretizarem, terão problemas de continuidade.
Mudar por mudar fica em vantagem o R-32, já maduro no mercado. Aquilo de que todos estão convictos é que teremos a continuidade dos problemas de flamabilidade e de cargas máximas.
Embora seja prematuro, há quem esteja a desenvolver bombas de calor que utilizam R-290 (propano), argumentando que as bombas de calor, por exemplo, serão mais competitivas e terão um melhor desempenho (eficiência energética). Pessoalmente, sou céptico em relação ao R-290, essencialmente devido ao facto de os constrangimentos em termos de segurança (flamabilidade) não estarem definidos em normas de segurança específicas do sector, estando somente na norma EN 378, que é muito genérica e que foi muito adoptada para o frio industrial e não vocacionada para sistemas multi-split, que compõem uma grande parte da climatização.
Também há quem esteja a trabalhar em CO2 como alternativa, mas, com o nível de segurança que têm actualmente, ainda é um pouco prematuro. Têm que ser definidas as condições de segurança. Por outro lado, apesar de se dizer que o CO2 é mais eficiente em termos de consumo energético do que um HFC normal, a verdade é que este é fluido, por não condensar acima de 32 ºC, requer medidas paralelas para poder arrefecer em países com condições climatéricas médias de 30 ºC numa grande parte do ano, logo, será mais custoso em termos de investimento e de consumo. No total, com todos os acessórios e componentes para facilitar a condensação e baixar as pressões de serviço, que são muito altas, os consumos vão ser muito mais elevados do que os dos sistemas actuais ainda estão em vigor.
Vai haver alternativas entre os naturais, orgânicos e inorgânicos. A questão que se coloca é segurança vs. consumos vs. pegada ecológica.
Quais são os principais desafios que o sector enfrenta nos próximos anos?
Essencialmente, ter equipamento preparado para os novos fluidos, que não existe na actualidade, ainda que, por exemplo, fabricantes de bombas de calor já tenham começado a trabalhar nalgumas equivalências.
O outro grande desafio, como referido, é o da segurança. A única coisa que está regulamentada diz respeito às seguranças-base que estão na parte do Decreto Lei n.º 145/2017 relativamente a gases fluorados. Quanto às condições de segurança nos edifícios, não há nada a falar de fluidos, porque até à data usavam-se HFC e no caso do R-32 as condições de segurança, com a carga máxima de fluido, vêm já garantidas do fabricante.
É preciso definir bem os máximos admissíveis do fluido para garantir que não se ultrapassa o limite de flamabilidade, por exemplo, na questão dos fluidos com alta flamabilidade, como o propano. E, no caso dos fluidos, que têm o problema da pressão, como o CO2, é preciso garantir que as condutas de todo o equipamento e que os equipamentos de segurança formam um sistema comutável, que resolva qualquer problema que surja se houver excesso de pressão. Isto não está escrito em lado nenhum. Não há nada – nenhum regulamento, nenhuma lei de fiscalização – a assegurar que isso está a ser feito. A única coisa que temos é a fiscalização das instalações para garantir, por exemplo, que a pressão cumpre determinados limites da pressão do serviço, da pressão do ensaio, que podem ser atestadas pelos laboratórios que estão habilitados para isto.
Portanto, temos o problema não legislado da Segurança para Ambientes ATEX [equipamentos em ambientes explosivos], nas áreas do frio residencial, comercial e industrial, porque estes estão somente regulamentados na EN378 e/ou na ISO 5149. Sabemos, no entanto, que a ISO 5149 quer reactivar o termo Pessoa Competente, um tema muito antigo – e que daí advenha categoria profissional, tal como existe hoje o TRM [Técnico responsável pela instalação e manutenção de sistemas técnicos] (Antigo TIM III) –, por forma a garantir o cumprimento das seguranças ou pela 378 ou pela 5149. Sabemos que, em termos deste tipo de saberes, mais ou menos 10 % dos técnicos que trabalham com HFC é que estão familiarizados com este tipo de situações e formados a este nível.
Isto está muito prematuro, ou seja, está tudo um pouco no conceito. É preciso passar para a prática estas questões, mas primeiro tem de aparecer um regulamento, depois ser publicado no jornal da União Europeia e só depois irá haver pressão para ser legislado.
Como é que isto se interliga com as cidades sustentáveis? O que é que está em causa?
Hoje em dia, estão a ser definidos os parâmetros de sustentabilidade das sociedades de modo a que estas sejam autossustentáveis em termos de consumo e que tenham controlada ou minimizada a sua pegada ecológica. O que são cidades sustentáveis? O que são edifícios sustentáveis? [Para responder, é preciso saber] Onde estão correlacionadas estas questões com problemas ocultos de toxicidade, explosividade e flamabilidade dos gases naturais orgânicos ou inorgânicos, que serão solução imediata aos problemas ecológicos actuais. Se queremos atingir a neutralidade carbónica em 2050, o caminho será este ou será outro consoante os problemas que aparecerem. Uma coisa sabemos: o regulamento vai ficar alinhado na União Europeia até ao final de 2023 e entrará em 1 de Janeiro de 2024.