Pesado o impacto ambiental do sector dos edifícios e das infraestruturas, torna-se evidente que a abordagem tem de se alinhar, cada vez mais, com a neutralidade carbónica. Segundo Carlos Elavai, Managing Director & Partner da BCG, consultora que publicou recentemente um estudo sobre o tema com foco na sustentabilidade do design e da construção, esta necessidade é também uma oportunidade. Em Portugal, o sector e os profissionais deparam-se com vários desafios, mas, na opinião do responsável, os obstáculos podem e devem ser ultrapassados olhando para a neutralidade carbónica “como uma alavanca de criação de valor para o sector”.
A BCG divulgou o estudo Scaling Low-Carbon Design and Construction with Concrete: Enabling the Path to Net-Zero for Buildings and Infrastructure, onde é abordado o impacto ambiental da modernização e construção de edifícios e a necessidade de se agir rapidamente. Portugal está sensibilizado para isto? Onde é que ainda estamos pior e onde temos espaço para melhorar rapidamente?
Nos últimos anos, globalmente, temos assistido a uma consciencialização crescente, mas é um caminho que ainda estamos a percorrer e estamos ainda longe do nível que será necessário atingir. O foco global nas alterações climáticas e na sustentabilidade tem contribuído para a pressão necessária para transformar o statu quo actual e reduzir as emissões de carbono no mundo da construção e das infraestruturas.
Em geral, os edifícios e as infraestruturas são ainda responsáveis por cerca de 40 % das emissões globais de carbono (aproximadamente 15 Gt por ano). Uma parte substancial destas emissões é efectuada ainda antes de qualquer activo ser utilizado. A produção de materiais é responsável por 15-20 % das emissões de edifícios e 50-60 % das emissões de infraestruturas, sendo o betão responsável por cerca de 30 % das emissões de materiais de construção e 7 % das emissões globais de carbono.
Portugal tem vindo a implementar medidas para melhorar a eficiência energética dos edifícios e a adoptar algumas práticas e alguns materiais de construção sustentáveis. É cada vez mais frequente essa ser uma preocupação-chave de quem produz, de quem constrói e de quem procura, o que por si só é já um excelente sinal da mudança para a qual queremos contribuir. No entanto, também é verdade que o nível de consciencialização e de adoção de práticas para chegar à neutralidade carbónica varia entre diferentes segmentos da sociedade e indústrias. Alguns profissionais, legisladores e organizações são mais informados e activamente envolvidos do que outros.
Olhando a futuro, os principais desafios incluem a melhoria da eficiência energética nos edifícios existentes e, de uma forma mais consistente, a actualização dos códigos e regulamentos de construção, a reabilitação de edifícios antigos, e a escolha de materiais de construção sustentáveis. Há oportunidades para melhorar através da integração de energia renovável, da adopção de práticas de construção e design sustentáveis, e de uma abordagem de economia circular, mas também da crescente consciencialização e educação do público.
O estudo apresenta uma estratégia dividida em sete partes para ajudar neste caminho da descarbonização. Como é que a indústria portuguesa pode e deve proceder e o que é que está ao alcance de cada um dos profissionais do sector?
A descarbonização em edifícios e infraestruturas é um processo urgente, mas que enfrenta, no entanto, uma série de obstáculos, nomeadamente a fragmentação do processo de design e de construção (diferentes partes do processo são feitas por empresas distintas), o facto de as técnicas e de os produtos com reduzido teor de carbono não estarem sempre alinhadas com as normas e standards do sector, e o facto de muitos clientes, públicos e privados, não priorizarem ainda a descarbonização, que, por vezes, pode aumentar o custo dos projectos. É um contexto complexo, mas onde a indústria portuguesa pode ter um impacto muito relevante, nomeadamente através de cinco alavancas concretas:
1. Definir metas explícitas de sustentabilidade e estabelecer protocolos para alcançá-las no curto, médio e longo-prazo;
2. Priorizar materiais de baixo carbono e eficiência energética nas práticas de construção;
3. Apostar na reabilitação de edifícios de construção mais antiga para assegurar os novos padrões de eficiência energética;
4. Adoptar uma abordagem de economia circular nos trabalhos de construção que potencie a reutilização e o aproveitamento máximo dos recursos;
5. Promover a partilha de conhecimento e a colaboração para disseminar as melhores práticas.
Além do papel enquanto empresas, os colaboradores que delas fazem parte têm também um papel preponderante, sendo essencial integrar de forma efectiva práticas ditas amigas do ambiente no seu trabalho e quotidiano. Os profissionais podem contribuir mantendo-se informados, adquirindo competências relevantes e defendendo soluções sustentáveis. Ademais, ao envolverem-se em associações da indústria, promoverem projectos de investigação e desenvolvimento e procurarem parcerias, podem ajudar a impulsionar acções colectivas e a acelerar o progresso.
Quais são as principais oportunidades que este caminho pode trazer ao sector?
Se é certo que são complexos os desafios que enfrentam nesta transição, são também claras as oportunidades que podem aproveitar. A neutralidade carbónica de edifícios e infraestruturas em Portugal deve ser entendida como uma alavanca de criação de valor para o sector. Isto, nomeadamente, através da diferenciação de mercado e aquisição de vantagens competitivas que atraiam mais clientes e investidores atentos e interessados na componente sustentável do sector, do aumento da eficiência operacional e consequente poupança de custos – alavancando para tal os avanços tecnológicos e as ideias inovadoras na área de equipamentos e processos –, da criação de novos empregos de elevada especialização e conhecimento técnico, das novas oportunidades de negócio em áreas como design sustentável e instalação e manutenção de sistemas de energia renovável, da melhoria da reputação junto de stakeholders-chave, da conformidade regulatória – potencialmente economizando em custos futuros relacionados ao seu cumprimento –, e até da capacidade de resiliência aos impactos das alterações climáticas.
“Abraçar” a sustentabilidade pode, assim, atrair clientes e investidores com preocupações climáticas, estimular o crescimento económico, fomentar a inovação, contribuir para mitigar as alterações climáticas e melhorar o bem-estar geral nas empresas e da população. Globalmente, as decisões tomadas pelo sector e pelos respectivos stakeholders poderão ter um impacto estrutural na redução das emissões de carbono e Portugal deve acompanhar e liderar esse esforço. Pelo impacto no sector, estas acções deverão ser tomadas com elevada brevidade e seriedade.