Infelizmente, o ano 2020 será lembrado como o ano da pandemia global. Somos testemunhas de uma tragédia indescritível, mas, em contrapartida, os países e a sociedade perceberam a importância da Qualidade do Ar Interior (QAI).
Vimos reclamando desde há muito a importância da qualidade do ar tanto no interior dos espaços ocupados como no exterior dos edifícios. Após a integração, ocorrida em 2008 na legislação nacional, de conceitos e metodologias sobre certificação energética e QAI, muitos foram, a nível nacional, os céticos e muitos outros ativos opositores sobre a pertinência e eficácia dessa integração.
E o que temos hoje? Temos a evidência da importância da QAI. Como nas demais tragédias, face ao número de óbitos, as consciências agitaram-se!!! Mas, ainda assim, parece que nada se aprendeu com o passado!
Aprender com a experiência e o conhecimento de outros
Apesar do confinamento a que estivemos sujeitos, e oxalá não venhamos a estar novamente nessa situação, nada teria impedido que indivíduos e organizações comunicassem ativamente entre si. Nos nossos dias, procuramos estar todos ligados, mas, no final, acabamos muito poucos por estar conectados!
Vejamos por outro lado o que já se progrediu. Destaquemos, entre outras, as iniciativas mais relevantes a nível internacional e que são consideradas representativas do setor do AVAC, onde Portugal também se encontra representado. Os bons exemplos continuam a vir de fora!
A partir de 27/02/2020, a ASHRAE, através da sua página web (em permanente atualização), publicou vários documentos sob o título geral CORONAVIRUS (COVID-19) RESPONSE RESOURCES FROM ASHRAE AND OTHERS, que consideramos ser de consulta e leitura obrigatórias.
A ASHRAE deu a conhecer o esforço que tem estado a desenvolver, de modo a responder à atual pandemia global Covid-19 e passou de imediato a fornecer orientações sobre como garantir que os edifícios possam ficar preparados para futuras epidemias.
A ASHRAE Epidemic Task Force foi criada para ajudar a implantar os recursos técnicos da ASHRAE para enfrentar os desafios da pandemia atual e epidemias futuras, no que se refere aos efeitos dos sistemas de AVAC na transmissão de doenças em instalações de saúde, nos locais de trabalho, ambientes domésticos, públicos e recreativos. A Task Force também fornecerá recomendações para a instalação de hospitais de campanha temporários em centros de convenções, arenas e estádios cobertos interiores para lidar com os surtos. A Task Force é constituída pelos seguintes membros com direito a voto:
William Bahnfleth, Ph.D., P.E., chair, ASHRAE Epidemic Task Force; Max Sherman, Ph.D., ASHRAE Environmental Health Committee; Luke Leung, P.E., ASHRAE Environmental Health Committee; Stephanie Taylor, M.D., ASHRAE Environmental Health Committee; Jason DeGraw, Ph.D., ASHRAE Technical Committee 2.10, Resilience and Security; Traci Hanegan, P.E., ASHRAE Technical Committee 9.6, Healthcare Facilities; Steve Martin, Ph.D., P.E., National Institute for Occupational Safety and Health (NIOSH); Richard Hermans, P.E., ASHRAE Standing Standard Project Committee 170, Ventilation of Health Care Facilities; James Ridenhour, JR P.E. Retired.
E pelos seguintes membros correspondentes/sem direito a voto:
Walid Chakroun, Ph.D., ASHRAE Government Affairs Committee; Wade Conlan, P.E., ASHRAE Environmental Health Committee; Dennis Knight, P.E., ASHRAE Board of Directors; Jay Kohler, P.E., chair, ASHRAE Technical Activities Committee; Wayne Stoppelmoor, CEM, chair, ASHRAE Standards Committee.
A identificação e a caracterização das áreas de competência dos seus membros evidenciam a indispensável transparência. Deste modo, sabe-se quem é quem! Entre outras ações, a ASHRAE, avisadamente, publicou várias orientações para preparação/reabertura dos edifícios durante a pandemia Covid-19 (até Dezembro de 2020):
- 07/05/2020 | ASHRAE Offers COVID-19 Building Readiness/Reopening Guidance;
- 22/06/2020 | ASHRAE Introduces Updated Reopening Guide Schools and Universities;
- 18/08/2020 | ASHRAE Epidemic TF Releases Updated Building Readiness Guide;
- 20/08/2020 | Making Polling Places Safer.
Também a REHVA, através da sua Task Force, tem dedicado especial atenção e disponibilizado imensa documentação com orientações relativas a este tema, publicando na sua página web (também em permanente atualização) vários documentos sob o título geral REHVA COVID-19 GUIDANCE DIRECTORY, que consideramos igualmente de consulta e leitura obrigatórias.
[Em Portugal] É indispensável que exista um Grupo de Trabalho que seja constituído por profissionais reconhecidos, sem dúvida, médicos especialistas, mas também físicos, engenheiros, arquitetos e haja a colaboração estreita com instituições científicas das universidades e especialistas das ordens profissionais.
E no país, como estamos em tempo de pandemia?
O tema QAI, em tempos de pandemia, é um tema, por definição, integrador de vários saberes, pelo que não poderá ser fruto apenas da visão de médicos especialistas, epidemiologistas, virologistas, pneumologistas, médicos de saúde pública e outros mais que são indispensáveis para a saúde.
Como é sabido, os indivíduos não são uma ilha, nem vivem isolados, interagem permanentemente com o meio ambiente interior e exterior. E, por isso, é necessário pensar o ambiente e ao mesmo tempo conhecer a física dos espaços que o homem materializa!
É indispensável que exista um Grupo de Trabalho que seja constituído por profissionais reconhecidos, sem dúvida, médicos especialistas, mas também físicos, engenheiros, arquitetos e haja a colaboração estreita com instituições científicas das universidades e especialistas das ordens profissionais.
É um desejo e também ao mesmo tempo um imperativo! Não sugerimos Comissões, mas sim Grupos de Trabalho ativos!
Quem tem medo da QAI?
Desconhecemos qual a formação científica e técnica da extensa lista que integra a Task Force Covid-19 da DGS – Direção Geral da Saúde, mas aparentemente não é multidisciplinar. E se nos fosse dada uma informação transparente? É indispensável que a DGS a divulgue à sociedade para que esta conheça, além de nomes, também a formação científica e técnica e, se for o caso, o seu conhecimento prático dos problemas no terreno.
Onde estão os investigadores, engenheiros e demais profissionais correlacionados? Não são necessários? Adquiriram formação nestes temas e agora já não interessa a sua agregação ou mesmo a sua modesta contribuição?
Se conseguirmos fazer chegar, a nível governamental, o conceito de multidisciplinaridade, isso representará, no imediato, apenas um pequeno suspiro de alívio; no entanto, continuaremos de respiração suspensa até à sua concretização e operacionalização!
Aguardemos a publicação da legislação que aí vem, mas nada de bom se espera…. dado que, ao que parece, haverá mudança de tutela.
Artigo publicado originalmente na edição de Novembro/Dezembro de 2020 da Edifícios e Energia, como comentário ao artigo “Já não há volta a dar, a QAI tem de voltar!”.
As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Edifícios e Energia.