Continuamos envolvidos numa crise histórica que ainda decorre. Uma crise disruptora e evolutiva, cujos efeitos continuarão a fazer-se sentir de forma global e imprevista. Prevê-se que a economia mundial seja profundamente afetada e que a paralisação económica coloque muitas empresas em risco. Fala-se de uma segunda vaga e da adoção de medidas para travar uma nova escalada da Covid-19. A pandemia continua a alimentar as nossas incertezas e os nossos receios, embora a confiança nas instituições académicas, governamentais e privadas seja um dos nossos refúgios.
Após o desconfinamento, grande parte da população portuguesa regressou às suas rotinas não obstante algumas limitações. Voltou-se para os locais de trabalho físicos. Reabriram-se determinados estabelecimentos de comércio e de lazer. A oferta de transportes públicos foi diminuída e, com isto, aumentou o receio de contágio nos passageiros. As dúvidas dos proprietários e dos clientes dos edifícios, relativamente à segurança dos estabelecimentos quanto à transmissão do novo coronavírus SARS-CoV-2 através do ar condicionado, instalaram-se. Provavelmente porque ainda se lembram de um estudo divulgado por um investigador chinês do Centro de Controlo e Prevenção de Doenças de Guangzhou que apontou o ar condicionado como o causador da transmissão do SARS-CoV-2 no seio de três famílias depois de estas terem jantado no mesmo restaurante. É sabido que esta pesquisa tem limitações porque, por exemplo, não existiu qualquer estudo experimental simulando a rota de transmissão área e não foram efetuados estudos aos membros das famílias para aferir o risco de infeção.
Face a esta publicação alarmante e outras, a EFRIARC, assim como outras associações do setor, consideraram ser muito importante informar as autoridades de saúde públicas e privadas sobre o uso do ar condicionado em situação de pandemia. Deste modo, a EFRIARC elaborou o primeiro parecer técnico em abril e enviou-o às autoridades de saúde, à comunicação social, aos seus associados e ao público em geral. Da mesma forma que, em agosto, se disponibilizou, junto dos ministérios da Educação e do Ensino Superior e direções regionais de Educação, para fornecer orientações e esclarecimentos para a abertura do próximo ano letivo, no que concerne à operação e adaptação dos sistemas de climatização e ventilação. É uma forma de apoiar e garantir futuro trabalho no setor quando autoridades governamentais e privadas têm conhecimento de que os sistemas de ar condicionado devem ser acompanhados e mantidos por uma equipa técnica especializada. E que o risco de transmissão do novo coronavírus é muito reduzido quando as decisões sobre os sistemas de ar condicionado envolvem todas as partes intervenientes (utilizadores, entidade gestora do edifício, equipa de condução e manutenção, instaladores e projetista).
Neste seguimento, o último parecer técnico elaborado pela Comissão Técnica da EFRIARC, em julho, é, na minha opinião, um dos documentos técnicos mais completos que foram enviados ao setor, pois emite recomendações distintas para edifícios sem sistemas de ventilação mecânica e para edifícios dotados de sistemas centralizados de ventilação e/ou ar condicionado. Este documento técnico da EFRIARC foca orientações sobre sistemas e equipamentos de uma forma mais aprofundada. Por isso, penso que apresentá-lo neste artigo é primordial para acrescentar mais conhecimento aos técnicos e profissionais do ar condicionado neste momento crítico de contenção da pandemia.
O parecer técnico elaborado pela Comissão Técnica da EFRIARC em julho é um dos documentos técnicos mais completos que foram enviados ao setor, pois emite recomendações distintas para edifícios sem sistemas de ventilação mecânica e para edifícios dotados de sistemas centralizados de ventilação e/ou ar condicionado. Este documento técnico da EFRIARC foca orientações sobre sistemas e equipamentos de uma forma mais aprofundada.
Recomendações ao setor AVAC&R no contexto da Covid-19 apresentadas no parecer técnico da EFRIARC de 19 de julho 2020:
1- Edifícios sem sistemas de ventilação mecânica
a) Sempre que as condições atmosféricas o permitirem, promover a ventilação natural dos espaços através da abertura de janelas e portas;
b) Se existir necessidade de arrefecimento ou aquecimento dos espaços, os equipamentos individuais de ar condicionado devem estar ligados;
c) Deve ser considerada a instalação de unidades portáteis de purificação do ar, por recirculação e filtragem de alta eficiência do ar, especialmente em espaços com ocupação elevada;
d) Pode ser considerada a aplicação de sistemas de desinfeção do ar por radiação ultravioleta (UV), especialmente em espaços com ocupação elevada. Neste caso, deve ser acautelada a proteção dos ocupantes relativamente à incidência direta da radiação ultravioleta.
2 – Edifícios dotados de sistemas centralizados de ventilação e/ou ar condicionado
a) Se possível, aumentar o caudal de ar novo (através da alteração da relação de transmissão do ventilador, da programação do variador de frequência, do ajuste da posição de registos de balanceamento, etc.);
b) Sempre que possível, operar os sistemas de ar condicionado com 100 % de ar novo;
c) Em sistemas com recirculação nos quais não seja possível aplicar a recomendação anterior, melhorar a eficiência de filtragem na unidade de tratamento de ar. Neste caso, aplicar filtros com eficiência mínima de classe F7 (ePM1 50 %);
d) Garantir a correta instalação dos filtros nas UTAs, limitando as fugas por bypass;
e) Prolongar o tempo de operação dos sistemas de ventilação para além do período de ocupação do edifício. Se possível, mantê-los em funcionamento contínuo;
f) Estratégias de redução do consumo de energia aplicadas às taxas de ventilação dos espaços, como Demand Controlled Ventilation (DCV) devem ser desativadas;
g) Desativar os sistemas de recuperação de calor que não garantam estanquidade, por exemplo, rodas térmicas;
h) Utilização dos sistemas de humidificação, caso existam, nos seus valores normais de referência (40 % ≤ HR ≤ 60 %);
i) Deve ser considerada a instalação de unidades portáteis de purificação do ar, por recirculação e filtragem de alta eficiência do ar, especialmente em espaços com ocupação elevada;
j) Pode ser considerada a aplicação de sistemas de desinfeção do ar por radiação ultravioleta (UV), especialmente em espaços com ocupação elevada. Neste caso, deve ser acautelada a proteção dos ocupantes relativamente à incidência direta da radiação ultravioleta;
k) A utilização de sistemas de desinfeção do ar por ozono ou que tenham ozono como subproduto pode ser considerada apenas em espaços desocupados. É totalmente desaconselhada a sua utilização em espaços com ocupação humana;
l) A utilização de sistemas de desinfeção do ar por ionização deve ser cuidadosamente analisada, pois os estudos sobre o desempenho dos mesmos são escassos e não conclusivos relativamente à sua eficácia;
m) As alterações de layout decorrentes de obras de remodelação de espaços interiores têm de ter em conta a satisfação dos requisitos mínimos de ventilação e garantir a correta distribuição do ar novo;
n) Assegurar que todos os sifões da rede de esgotos estão sifonados, i.e., cheios com água;
o) Não existe a necessidade de antecipar tarefas programadas de substituição dos filtros de ar; estes devem ser substituídos sempre que o seu estado de colmatação conduzir a uma redução significativa de caudal;
p) Se possível, adiar as operações de limpeza de condutas;
q) Caso seja indispensável a realização, neste período mais crítico, das operações de manutenção referidas nos pontos anteriores, utilizar equipamentos de proteção individual (EPI) pela equipa de manutenção (máscara, óculos e luvas descartáveis), especialmente no manuseamento dos filtros de ar, e fazer a lavagem eficaz das mãos com sabão ou soluções alcoólicas após a conclusão das operações.
As opiniões expressas são da responsabilidade dos autores e não reflectem necessariamente as ideias da revista Edifícios e Energia.