Manuela Almeida, docente e investigadora da Universidade do Minho, fala-nos da importância do cálculo dos “níveis óptimos de rentabilidade” nos edifícios e da necessidade de actualização periódica destes requisitos. Portugal tem, até ao final do ano, para apresentar à Comissão Europeia o relatório sobre a avaliação que fez sobre esta matéria.

 

A Comissão Europeia (CE) relembrou Portugal, no final de Outubro, da necessidade de ser apresentado o segundo relatório sobre os níveis óptimos de rentabilidade dos requisitos mínimos de desempenho energético.

Essa exigência de Bruxelas decorre da lei e vem na sequência da Directiva Europeia para o Desempenho Energético dos Edifícios (EPBD), de 2010, que prevê que os Estados-Membros apresentem estudos sobre os níveis óptimos de rentabilidade e que devem ser revistos a cada cinco anos.

A vantagem em fazer estes estudos periodicamente é a possibilidade de irmos avaliando e corrigindo as medidas?

É a oportunidade de irmos actualizando as soluções que, numa determinada altura, são rentáveis. As soluções de custo-óptimo são aquelas que, numa análise de ciclo de vida, se verifica serem as mais rentáveis, tendo em conta os custos globais e a energia primária (ou emissões) associados a um edifício. Os custos globais incluem os custos de investimento, os custos de manutenção e os custos da energia associados a um determinado período que, de acordo com o Regulamento Delegado n.º 244 associado à EPBD de 2010, está estipulado em 30 anos, no caso de uma reabilitação, ou 50 anos no caso de um edifício novo (no caso de edifícios residenciais). Dependendo as soluções de custo-óptimo do custo das diferentes soluções e do custo da energia, estes têm de ser actualizados regularmente.

A metodologia de cálculo do custo-óptimo introduzida pela Directiva obrigou a avaliar a rentabilidade das soluções implementadas de forma diferente. Tradicionalmente, fazia-se uma análise simplificada de custo-benefício tendo apenas em consideração os custos de investimento e as poupanças conseguidas com a implementação das medidas. Agora, a Directiva obriga a fazer análises de ciclo de vida do edifício, considerando a sua vida útil ou o período para o qual uma renovação está a ser planeada, tendo em conta os custos do investimento, os custos de manutenção (que eram normalmente esquecidos) e os custos da energia para o período em causa, de acordo com o que foi estabelecido e conforme a tipologia dos edifícios. A partir desta altura, introduziu-se outra forma de fazer as contas, para avaliar a rentabilidade das soluções tendo em conta os custos da energia e os custos das soluções (construtivas, equipamento, renováveis) para um determinado período de tempo. E estes valores têm de ser atualizados ao longo do tempo.

Em Maio de 2010, e no âmbito da EPBD, procurou-se criar uma visão mais alargada sobre o investimento e o impacto do projecto na performance do edifício. Nessa altura, procurou-se desenvolver a melhor estratégia de forma a combinar o investimento e a poupança, ou seja, alcançar ‘níveis óptimos de rentabilidade’. A promoção de soluções renováveis foi outra das estratégias para eficiência energética que veio associada ao conceito dos NZEB (Nearly Zero Energy Buildings).

Esse custo-óptimo está calculado com base em edifícios de referência?

Sim, a primeira coisa que se fez foi definir esses edifícios de referência para que fossem representativos de um vasto parque construído. Os edifícios de referência foram definidos tanto para edifícios residenciais como para edifícios não residenciais, tendo em conta épocas representativas e diferentes tipologias. O maior problema colocou-se nos edifícios não residenciais dada a grande diversidade multiplicidade de tipologias.

Os custos vão mudando?

Exactamente, e repare que, quando fazemos uma avaliação, temos de perceber qual a solução mais rentável, em função da solução construtiva implementada e, também, em função dos sistemas ou equipamentos aplicados e que têm um peso muito grande. Lembro-me de que uma das coisas que tem evoluído muito é o preço do solar fotovoltaico, por exemplo. A evolução que se verifica na tecnologia, nos materiais, nos preços, etc., faz com que exista a obrigatoriedade da actualização dos valores e um refazer de contas, e, por isso, são solicitados estudos e apresentação de relatórios periódicos de forma a actualizar todas estas questões. Até porque há também inovação e soluções novas que vão aparecendo todos os dias.

O objectivo, segundo a CE, é encontrar o ponto óptimo, para que não haja nem investimento a mais, nem a menos, que salvaguarde a eficiência energética e as potencialidades das energias renováveis?

Sim, trata-se de assegurar esse equilíbrio. Pretende-se uma visão mais alargada que vá para além do imediato, tendo em conta o período de vida dos edifícios. Na altura, procurou-se, com esta estratégia, mudar mentalidades, porque as pessoas estavam muito focadas no investimento imediato. Claro que a disponibilidade financeira no imediato é importante e decisiva, mas procurou-se mostrar o impacto que essas decisões têm nos consumos energéticos ao longo do período de vida do edifício e, também, na obtenção de conforto. Já sabemos que, no residencial, é muito difícil falar em consumos energéticos. Mas, para este sector, mais importante do que o impacto nos consumos energéticos, é o impacto no conforto e na redução das patologias. 

Aliás, aumentar o conforto e reduzir as patologias é uma preocupação manifestada na última versão da EPBD (2018) traduzida na recomendação de se desenvolverem medidas de combate ou mitigação da pobreza energética, que é um dos grandes problemas que temos hoje. Mas isso será objecto de outra conversa…